Mistagogia da Palavra

A palavra deste domingo, como simbolismo da videira, fala da comunhão de vida com Cristo e com os irmãos por meio da fé e do amor. São duas as ideias básicas: permanecer em Cristo e dar fruto. Para dar fruto precisamos da seiva da videira, que é Cristo. Sem Ele nada podemos fazer, porque sem a seiva secam os ramos. Somente no contacto com Jesus temos vida e forma interior, capacidade e fortaleza para transformar a dura realidade e vencer o mal dentro e fora de nós. Porque é que há tantos cristãos ineficazes, mesquinhos e tristes, se afirmamos possuir a fonte da vida e da alegria que é a fé e a esperança no Deus e Pai de nosso Senhor Jesus Cristo?
A 1ª leitura é dos Actos dos Apóstolos. Três anos depois da sua conversão a Cristo, Paulo decide fazer uma viagem a Jerusalém. Quer encontrar-se com Pedro e conhecer a comunidade que antes tinha perseguido tão ferozmente. É apresentado por Barnabé, um discípulo estimado por todos pela sua generosidade e dedicação à causa do Evangelho. Depois deste primeiro contacto com os irmãos, surgem os conflitos com os antigos correligionários, que querem dar-lhe a morte. Por isso, os irmãos levam-no para Tarso.
A 2ª leitura é da Primeira Epístola de S. João. Para dar fruto temos de colaborar com Deus manifestando a sua vida em nós, conjugando duas atitudes básicas e tão inseparáveis que São João as une num só mandamento: acreditar e amar. Síntese feliz em que a fé e o amor se interligam, são fecundos, fundindo a dimensão vertical e horizontal de ambas.
O Evangelho é segundo São João. Jesus apresenta-Se como a cepa ou videira, cujos ramos são os seus discípulos. Para estes terem vida e darem frutos precisam de estar vitalmente unidos à cepa. Assim os cristãos para darem frutos agradáveis ao Pai é necessário que continuem unidos a Cristo, porque Ele mesmo diz: “Sem Mim nada podeis fazer”. Para a videira dar fruto precisa de ser cuidada. Também cristãos precisam de ser limpos da infidelidade ao Evangelho, das fraquezas dos pequenos e grandes pecados que há em cada um dos discípulos.


A Palavra do Evangelho

Diante da Palavra

Vem Espírito Santo, mantém a minha vida, o meu coração e a minha vontade vinculados à vida de Jesus.

Evangelho    Jo 15, 1-8
Naquele tempo, disse Jesus aos seus discípulos: «Eu sou a verdadeira vide e meu Pai é o agricultor. Ele corta todo o ramo que está em Mim e não dá fruto e limpa todo aquele que dá fruto, para que dê ainda mais fruto. Vós já estais limpos, por causa da palavra que vos anunciei. Permanecei em Mim e Eu permanecerei em vós. Como o ramo não pode dar fruto por si mesmo, se não permanecer na videira, assim também vós, se não permanecerdes em Mim. Eu sou a videira, vós sois os ramos. Se alguém permanece em Mim e Eu nele, esse dá muito fruto, porque sem Mim nada podeis fazer. Se alguém não permanece em Mim, será lançado fora, como o ramo, e secará. Esses ramos, apanham-nos, lançam-nos ao fogo e eles ardem. Se permanecerdes em Mim e as minhas palavras permanecerem em vós, pedireis o que quiserdes e ser-vos-á concedido. A glória de meu Pai é que deis muito fruto. Então vos tornareis meus discípulos».

Caros amigos e amigas, o Evangelho narra com as palavras simples da vinha a relação de Deus com a humanidade, esposa amada e cercada de mil cuidados na esperança que dê frutos saborosos. 

Interpelações da Palavra

 “Eu sou a videira vide; vós sois os ramos”
São precisos tantos sacrifícios, dedicação, paciência para se plantar uma vinha: ter uma terra boa, tirar as pedras, regar, escolher as videiras, podá-las, retirar os “ladrões”, etc… Após tudo isto, o agricultor deve apenas esperar que a vinha responda com o seu fruto de cachos saborosos e doce vinho, sinal de alegria e festa.
É na vinha da humanidade que Deus investe mais amor e poesia, paciência e inteligência, paixão e preocupação. No meio do mundo, Deus plantou a verdadeira videira, o seu Filho, na esperança que os seus ramos, ainda que pequeninos, possam revestir-se de cachos amadurecidos pelo sol e de bagos de mel.
É Jesus que nos permite esta admirável relação de intimidade e força vital entre Deus e nós. Ele é a verdadeira videira capaz de fazer circular a fonte de vida e alimentar a esperança.

“Permanecei em Mim e Eu permanecerei em vós”
Recordo as vinhas da minha aldeia que, após a poda do inverno, “choravam” em cada ramo cortado. Mas aquela lágrima vertida continha um segredo e uma anunciação: era uma antecipação do milagre da vida! Os agricultores diziam: “a videira está a caminhar para o amor”! De facto, aquela gota era sinal que o ramo estava vivo, que dentro dele havia uma torrente que corria em vida, à procura de mais vida.
Permanecer em Cristo é nunca parar este caudal de vida interior, é ter a certeza de mais vida, de receber e dar amor. Se o ramo se desligar da videira secará e não dará fruto. Mas permanecer em Cristo é saber que Ele é o sangue das nossas veias, a alma do nosso coração, a vida que nos alimenta, a certeza que a lágrima vertida caminha para o amor!
Podar – ainda que fale de diminuição e feridas, de tesouras e de inverno – é o verbo dos artistas que retiram o supérfluo para revelar a beleza do essencial. Permanecer na verdadeira videira é a certeza de deixar lugar para mais vida, brilho e sabor, alimentando a todos.

“A glória de meu Pai é que deis muito fruto”
A glória de Deus está em dar muito fruto, como se a nossa vocação fosse a fecundidade. A Deus não interessam os montes de ramos cortados, mas sim os cabazes de alegria e de brilho, os açafates de pão partilhado e de lágrimas enxugadas, os cestos de palavras e de gestos que alimentam de doce sabor a vida!
O sonho de Deus não é a poda ou o desbaste, mas é o fruto abundante e multiplicado, a dilatação de mais vida, a participação na seiva vital divina, deixando circular nas nossas veias a linfa da vida de Cristo. Dar fruto é sentir, no nosso coração, o pulsar do amor de Deus, até podermos dizer: “já não sou eu que vivo, mas é Cristo que vive em mim” (S. Paulo). Assim, caros amigos e amigas, se vive o Evangelho.

Rezar a Palavra e contemplar o Mistério

Senhor, pão vivo descido do céu, vinho novo do banquete do Reino,
Tu és a safra da minha alegria, a fonte do meu contínuo renascer.
Tu me convidas a viver em união contigo como o ramo que, para viver e dar fruto,
tem de estar unido à videira. Tu, divino Agricultor, solidifica o meu vínculo
de compromisso contigo e com a tua Igreja. Mantém em mim a coragem
para suportar todas as podas que me purificam e me garantem a fecundidade.

Viver a Palavra 

Vou frequentar os sacramentos com a consciência de que Jesus me une à sua vida ressuscitada.