Ao proclamar que hoje celebramos a Solenidade da Santíssima Trindade, somos imediatamente transportados para o campo da abstracção e do mistério, porque assim nos foi transmitido desde os primeiros anos da formação cristã. Foi-nos dito que o mistério de Deus era isto mesmo: um mistério difícil de explicar porque Deus é um só Deus em três pessoas. Mas, os apóstolos, que foram os que nos transmitiram a fé, parece que entenderam, razoavelmente bem, que Jesus era o Salvador enviado pelo Pai; e, no dia de Pentecostes, experimentaram a acção do Espírito Santo, começando a dizer a todos que Deus era Pai, Filho e Espírito Santo porque foi assim que eles tiveram a experiência de Deus na sua vida. Deus não é abstracção; é proximidade: revelou-se antigamente ao seu povo como Deus vivo e libertador (1ª leitura); torna-se próximo do homem quando este é baptizado em nome do Pai, do Filho e do Espírito Santo e procura cumprir o que Cristo mandou (Evangelho); e Paulo sublinha a experiência da filiação adoptiva que nos faz exclamar “Abbá, Pai” (2ª leitura).

  1. Fragilidade dos conceitos

– Deus não se apresenta em conceitos abstractos, não é para ser pensado como aquele Ser que “está lá no alto”, como uma realidade em si mesma, independentemente da sua acção com os homens… Deus acompanha a vida dos homens e das mulheres de todos os tempos, está “do lado de cá”, no lugar onde se desenrola a vida da humanidade, e é assim que se pode compreender…
– Deus não está limitado pelos nossos conceitos nem se reduz à nossa capacidade de interpretação… “ Se compreendêssemos tudo de Deus Ele deixaria de ser Deus”… Mas sabemos, fundamentalmente, que Ele é amor total, graça, que dá a vida porque é Pai, Salvador no Filho e Amor que toca o coração como Espírito Santo…

  1. O modelo do amor

– Os textos da Liturgia apresentam-nos Deus como modelo de amor: Deus exprime-se com palavras como dar, acolher, transmitir vida e amor…
– O Deus que a Bíblia nos revela não é um ser isolado, uma entidade para ser estudado pela filosofia, mas uma família que inclui em si a paternidade, a filiação e a essência da família que é o amor, chamado, no seio da Trindade, Espírito Santo…
– Deus é comunidade de amor, comunidade perfeita, porque sendo pessoas distintas têm tudo em comum; é um amor que está dentro, vida que se partilha, que se dá e se acolhe…
– Compreendemos quem é Deus quando actualizamos a vida, o amor, a doação, o acolhimento e, sobretudo a experiência do amor gratuito e universal…
– Este Deus que Jesus nos deu a conhecer é o Deus Pai, em cujas mãos está a nossa vida, que se preocupa com cada um de nós, que vem ao nosso encontro de muitas maneiras, por muitos caminhos e, principalmente, por seu Filho Jesus.
– Este Jesus é nosso irmão e companheiro, a Palavra que estava desde o princípio junto de Deus e que se manifesta na sua vida…
– O Espírito Santo é este mesmo Deus derramado sobre cada um para nos dar força, habitar em nós e orientar as nossas vidas…

  1. Consequências da fé trinitária

– Podemos professar a fé no Deus Trinitário quando contribuímos para a construção de uma comunidade universal, baseada no amor e na fraternidade, tal como se manifestou na história da salvação e que os textos de hoje nos recordam:
Deus escolheu gratuitamente um povo e, por meio dele, a todos os povos (Deuteronómio);
Fez-nos filhos no Seu Filho (S. Paulo);
Garante-nos uma presença até ao fim dos tempos (Evangelho).
– Deus é assim: uno e trino; único e comunitário…
– Porque o nosso Deus é comunhão e não é um Deus solitário, então percebemos que só um amor partilhado é compatível com a nossa fé na Trindade…
– Celebramos um mistério que, mais do que mistério, é compromisso… Como dizia S. João Paulo II: “Em nome do Pai, haja paz; no nome do Filho, reine a justiça; no nome do Espírito Santo, impere a tolerância”…