Mistagogia da Palavra

Como os Hebreus e os Muçulmanos, nós proclamamos que o nosso Deus é o único: nós acreditamos num único Deus. Contudo, nós os cristãos sabemos que este Deus único não é um ser solitário, perdido nos espaços, mas um deus comunitário; é uma Família divina; é uma comunidade de vida e de amor.
Com a sua presença no mundo e com as suas palavras, Jesus Cristo descobriu-nos as surpreendentes riquezas de Deus. Falou-nos do Pai, que nos ama e quer a nossa salvação; apresentou-Se a Si mesmo como Filho, o Enviado, o caminho, a verdade e a vida; anunciou-nos a vida do Espírito Santo como hóspede das nossas almas.
Todo o Ano Litúrgico nos orienta para a Santíssima Trindade. Ao consagrar, de modo especial, um Domingo do ano à Santíssima Trindade, a Igreja quer levar-nos a prolongar e completar a nossa “descoberta” de Deus, a fim de que a nossa vida seja um sinal do amor de Deus para os nossos irmãos.
A 1ª leitura é do Livro do Deuteronómio. A imagem de Deus que nos é dada não é a de um deus longínquo, como eram e ainda são hoje os deuses pagãos, mas a de Alguém que acompanha de perto os acontecimentos da vida do seu povo, de Alguém que Se interessa pelos seus problemas e intervém em seu favor. Esta revelação de Deus amigo e protector dos homens é motivo de alegria, de paz e serenidade para aqueles que acreditam n’Ele.
A 2ª leitura é da Epístola de São Paulo aos Romanos. O Apóstolo diz, com palavras comoventes, qual é a nossa condição de baptizados. Não somos já simples criaturas, não somos escravos que servem um patrão na esperança de ter um prémio ou no temor de receber um castigo. Somos filhos que receberam d’Ele a sua mesma vida. O Espírito que nos foi comunicado leva-nos a gritar a Deus, cheios de confiança e alegria: “Querido Pai” (Abá). Jesus falou-nos, para nos dizer que o nosso destino é sermos filhos do Pai, irmãos de Cristo e sermos transformados pela força do seu Espírito.
O Evangelho é segundo São Mateus. O Ressuscitado apresenta-Se aos onze Apóstolos dizendo que Lhe fora dado todo o poder no céu e na terra. Mas Ele não conserva para Si este poder, mas comunica-o aos seus discípulos. Estes são o seu prolongamento no mundo e recebem d’Ele o encargo de realizar a sua obra levando a todos a sua salvação, pelo anúncio da mensagem evangélica e pelo Baptismo. Este é um germe de vida, é uma semente que é preciso deixar crescer e produzir fruto.


A Palavra do Evangelho

Diante da Palavra

Vem Espírito Santo, sopro de vida a germinar em cada manhã, encoraja o meu partir em comunhão.

Evangelho    Mt 28, 16-20
Naquele tempo, os Onze discípulos partiram para a Galileia, em direcção ao monte que Jesus lhes indicara. Quando O viram, adoraram-n’O; mas alguns ainda duvidaram. Jesus aproximou-Se e disse-lhes: «Todo o poder Me foi dado no Céu e na terra. Ide e ensinai todas as nações, baptizando-as em nome do Pai e do Filho e do Espírito Santo, ensinando-as a cumprir tudo o que vos mandei. Eu estou sempre convosco até ao fim dos tempos».

Caros amigos e amigas, nós que fomos batizados em nome do Pai, do Filho e do Espírito Santo, somos convidados neste domingo a contemplar o Santíssima Trindade, mistério de comunhão e de amor, certeza de um Deus que se comunica e se faz presente até ao fim.

Interpelações da Palavra

Viram… adoraram-n’O 

A notícia da ressurreição tinha “explodido” junto ao túmulo. Das dúvidas, envoltas em medo, permanece o imperativo de ir para a Galileia, onde veriam o Ressuscitado (Mt 28, 1-10): “Lá me vereis!”. A promessa foi cumprida. Feito o caminho, subido o monte que lhes tinha sido indicado pelo mestre, viram-n’O. Reconheceram Jesus. “Quando O viram”, mesmo duvidando, “adoraram-n’O”… Já não é aquele menino de Belém, envolto pelo luar da noite nos braços de Maria, adorado pelos pastores solitários e pelos (bem)aventurados Magos. Ali, na Galileia, onde O escutaram falar de Deus, onde presenciaram os milagres às multidões, onde foi aliviado o sofrimento e se ofereceu o perdão e a paz, Jesus manifesta-se de novo como Filho muito amado de Deus, o todo poderoso. Os discípulos, tal como os Magos, adoram… Regressados ao berço da missão, encontra-se a fé e a dúvida, a coragem e o medo. Assim é a nossa relação com Jesus: revela-nos sinais de ressurreição, mas ainda duvidamos. O cinzento do Inverno, que ainda trazemos, enevoa as cores da primavera. A adoração sem sorriso não é oração. Deus Trindade é sempre uma boa e alegre notícia.

Ensinai batizando 

Ele sabe das nossas balanças e dos nossos cálculos, dos nossos cepticismos cinzelados pelas experiências da vida, por isso, aproxima-se. Enquanto os discípulos adoram e duvidam, Jesus toma a iniciativa e vai, mais uma vez, ao seu encontro. Eles fizeram o caminho, mas é Jesus Quem se revela e dá a conhecer. Deus é sempre próximo. E da adoração do mistério nasce a missão. Adorar e servir andam sempre de mãos dadas. Jesus indica-lhes com clareza qual deve ser agora a sua missão: ensinar e baptizar, fazer discípulos. Esta é também a nossa missão: fazer seguidores de Jesus que conheçam a sua Palavra, comunguem do seu projecto de amor, aprendam a viver como Ele e sejam testemunhas de Deus no mundo de hoje. A força do ressuscitado ampara estas comunidades sempre nascentes, porque renascem do baptismo e do Espírito Santo. Em nome do Pai, do Filho e do Espírito Santo, somos batizados e enviados como discípulos missionários.

Convosco até ao fim 

Precisamos recordar a força do Credo para saborear a presença de Deus que nos embala e acolhe, ensina e envia. Cremos em Deus Pai porque não estamos sós, Ele é a origem e a meta da nossa vida. Criou-nos por amor e a todos deseja abraçar com coração infinitamente misericordioso. Cremos em Deus Filho, Jesus Cristo, seu único filho, o grande presente que Deus deu ao mundo. Ele ensinou-nos como Deus é Pai. Jesus anima-nos a construir uma vida mais feliz na entrega e serviço aos outros, sempre escutando e cumprindo a vontade do Pai. Cremos em Deus Espírito, que dá a vida, comunhão do Pai e do Filho. Força e sabedoria de Deus, luz e guia de cada passo da nossa história, perfume sem tempo e sem espaço porque abraça a história e habita cada íntimo. O amor de Deus não se fica em si mesmo, comunica-se gratuitamente. Deus dá-se continuamente a cada um de nós. Ele continua vivo, connosco, curando, perdoando e salvando, em cada gesto que fazemos por Ele, com Ele e n’Ele. Deixemo-nos abraçar pela Trindade e continuará presente o Evangelho.

Rezar a Palavra e contemplar o Mistério

Creio em Ti, ó Pai, colo fecundo de misericórdia e ternura, onde as minhas raízes bebem o ser,
quero construir-me em Ti, para que o teu amor seja obra em mim.
Creio em Ti, Jesus, Filho Amado e Amante, coração cuja amplitude me dilata o ser,
quero partir de Ti, para que a tua Palavra seja mensagem e profecia em mim.
Creio em Ti, Espírito Santo, liberdade que até aos cumes da beleza me educa o ser
quero focar a minha vida para ti, para que o teu fogo e o teu vento sejam atmosfera em mim.

Viver a Palavra

Vou viver cada um dos meus dias em nome do Pai, do Filho e do Espírito Santo.