Para uma boa parte dos cristãos, quando se propõe o dogma da Santíssima Trindade, parece que se enfrentam com algo difícil de explicar, com um mistério cuja compreensão não está ao alcance de todos e que é melhor deixar para as discussões dos teólogos. No geral, as pessoas vão aceitando e repetindo a fórmula “em nome do Pai, do Filho e do Espírito Santo”, mas sem se questionar muito sobre a fé na Trindade, num Deus que é único em três pessoas: o Pai criador, o Filho salvador e o Espírito Santo que nos anima e sustenta.
Ora, cada vez que dizemos Pai, Filho e Espírito Santo, estamos a identificar-nos, a dizer que fazemos parte da família dos cristãos e que Deus não é um mistério oculto, mas que Ele próprio é família, comunhão e missão. É um Deus que saiu de si, que se manifestou na história e se deu a conhecer assim: como Pai misericordioso, como Filho, o Deus connosco, e como Espírito Santo que sempre nos acompanha.
- O universo fala de Deus
– Nós nunca poderemos abarcar o comportamento do nosso próprio Deus e a sua relação com o mundo na sua totalidade… O livro dos Provérbios apresenta-nos a obra criadora de Deus como um plano bem pensado e estruturado onde, acima de tudo, há amor e beleza, alegria e satisfação pela obra realizada…
– A sabedoria do nosso Deus é sempre salvífica, uma sabedoria que gera amor e alegria… Deus não é um ser caprichoso que joga com os dados da nossa vida; a sua sabedoria é amor e salvação, a tal ponto que a atitude do homem não pode ser outra senão a da contemplação e admiração como cantamos no Salmo: “que é o homem no meio da imensidão deste universo criado? Fizeste-lo um pouco inferior aos anjos; de honra e de glória o coroastes…” É o homem que há-de ser o espelho desta harmoniosa sabedoria de Deus…
- O homem, imagem de Deus
– É verdade que a imagem de Deus em nós é, muitas vezes, ofuscada… Mas sempre que fazemos o sinal da cruz, dizemos as palavras respectivas com a nossa boca, a nossa mente e o nosso coração, estamos a representar a nossa convicção profunda de que somos feitos à imagem da Trindade, de que o amor de Deus foi derramado nos nossos corações pelo Espírito Santo que nos foi dado (S. Paulo)…
– Um dos aspectos da nossa vida cristã menos assumido é esta presença de Deus em nós: podemos professar a fé, rezar, celebrar e procurar viver mas, tantas vezes, encaramos esta tarefa como acção nossa e não fruto do Espírito Santo em nós… As nossas preocupações são tantas que não nos damos conta nem fazemos transparecer o amor recebido… Ora, é este amor de Deus que é gerador de paz, da constância, da virtude sólida e da esperança (2ª leitura)…
– O mistério de Deus, a Trindade, não é tanto uma teoria que tenha de ser explicada, uma verdade em que se acredita, mas uma verdade que se pratica porque indica um caminho, um modo de estar e fazer que se vai aprendendo por contágio…
- Viver na comunhão de Deus
– Com frequência sublinhamos que a nossa fé é numa pessoa: Jesus Cristo. E é verdade. Mas, Jesus não é um enigma solitário: fundamentalmente, o que ele mostra é o amor misericordioso de Deus.
– Só se compreende a pessoa de Jesus no vínculo que o une ao Pai, no amor de ambos, testemunhado pelo Espírito… Os três estão unidos numa relação única; sendo diferentes, participam da mesma condição divina, reconhecida na comunhão mais sublime que pode existir: “O Espírito da verdade vos guiará para a verdade plena… Tudo o que o Pai tem é meu. Ele (o Espírito) receberá do que é meu e vo-lo anunciará” (Evangelho)…
– Desta comunhão do Pai, do Filho e do Espírito, brota todo o amor que os cristãos são chamados a testemunhar Não é um amor idílico: é concreto porque é manifestado por Jesus, e mais autêntico do que qualquer outro porque a sua fonte está em Deus…
– Não adianta especular… O mistério da Trindade, a fé em Deus que existe em três pessoas e que é referência de toda a vida cristã, mais do que ser explicada é para ser vivida… O nosso Deus não está “orgulhosamente só no seu trono de glória” mas é um Deus Pai que entra na nossa história, nos conhece e nos ama; é um Deus Filho que, ao encarnar percorreu os nossos caminhos entregando-se pela nossa salvação; é um Deus Espírito Santo que derrama sobre nós todo o seu amor…
– Nas nossas palavras e nas nossas obras, não nos deve preocupar tanto o modo como encontrar argumentos para explicar quem é Deus, porque quando a experiência é muito profunda também dizemos que não há palavras que a expliquem, mas o mais importante é mostrar como “a multidão se reúne na unidade do Pai, do Filho e do Espírito Santo” (LG 4) e como esta unidade orienta toda a nossa vida…