Mistagogia da Palavra

A solenidade da Epifania (palavra grega que significa “manifestação”, aparição) é o complemento do Natal. A Epifania celebra a manifestação do Senhor como Deus e Rei universal, ao mesmo tempo que exalta a glória divina e a contempla brilhando no rosto da Igreja, sua Esposa, a nova Jerusalém, depositária dos tesouros imensos da graça, oferecidos a todos os povos, de que os Magos são as primícias.
Na 1ª leitura, o profeta Isaías apresenta-nos Jerusalém que, iluminada pelo nascimento de Jesus, atrai a si todos os povos, mergulhados na noite do pecado. Será, porém, na Igreja, a nova Jerusalém, que Deus reunirá todos os homens, para lhes dar a salvação.
Na 2º leitura, S. Paulo, aos Efésios, descrevendo o plano salvífico de Deus, proclama que todos os homens são chamados, igualmente a ser herdeiros da Promessa.
Na 3ª leitura, frente ao mistério do nascimento de Jesus, S. Mateus procura sobretudo contemplá-lo à luz do primeiro encontro do mundo pagão com o Salvador, de que os Magos são as primícias e os representantes. Não deixa também de impressionar, em contraste com o orgulho e a cegueira de Herodes e dos sábios de Israel, a boa vontade dos Magos, que se dispõem a correr a aventura da fé.

A Palavra do Evangelho

Diante da Palavra
Vem Espírito Santo, ensina-me a ir ao encontro de Deus para O conhecer e adorar.

Evangelho     Mt 2, 1-12
Tinha Jesus nascido em Belém da Judeia, nos dias do rei Herodes, quando chegaram a Jerusalém uns Magos vindos do Oriente. «Onde está – perguntaram eles – o rei dos judeus que acaba de nascer? Nós vimos a sua estrela no Oriente e viemos adorá-l’O». Ao ouvir tal notícia, o rei Herodes ficou perturbado e, com ele, toda a cidade de Jerusalém. Reuniu todos os príncipes dos sacerdotes e escribas do povo e perguntou-lhes onde devia nascer o Messias. Eles responderam: «Em Belém da Judeia, porque assim está escrito pelo Profeta: ‘Tu, Belém, terra de Judá, não és de modo nenhum a menor entre as principais cidades de Judá, pois de ti sairá um chefe, que será o Pastor de Israel, meu povo’». Então Herodes mandou chamar secretamente os Magos e pediu-lhes informações precisas sobre o tempo em que lhes tinha aparecido a estrela. Depois enviou-os a Belém e disse-lhes: «Ide informar-vos cuidadosamente acerca do Menino; e, quando O encontrardes, avisai-me, para que também eu vá adorá-l’O». Ouvido o rei, puseram-se a caminho. E eis que a estrela que tinham visto no Oriente seguia à sua frente e parou sobre o lugar onde estava o Menino. Ao ver a estrela, sentiram grande alegria. Entraram na casa, viram o Menino com Maria, sua Mãe, e, prostrando-se diante d’Ele, adoraram-n’O. Depois, abrindo os seus tesouros, ofereceram-Lhe presentes: ouro, incenso e mirra. E, avisados em sonhos para não voltarem à presença de Herodes, regressaram à sua terra por outro caminho.


Caros amigos e amigas, o evangelho da Solenidade da Epifania convida-nos a empreender a grande peregrinação da fé até Deus, a fim de melhor O conhecermos e O adorarmos.

Interpelações da Palavra
“O rei Herodes ficou perturbado”
Perante a notícia do nascimento do Salvador existem corações que se perturbam e corações que se alegram. Os detentores do poder, como Herodes, perturbam-se. Afinal, era ele que, desde a capital (a cabeça), tudo deveria saber e controlar; mas não, não foi ele nem os seus adivinhos, sacerdotes ou letrados (os sábios oficiais), que souberam perceber a aurora do tempo novo! Quem todo o saber e todo o poder detém, deseja controlar, até mesmo os insondáveis desígnios de Deus, e por isso se surpreende e se perturba porque Deus decide nascer fora da sua comarca (numa gruta) e manifestar-se a todos os povos (para fora das suas fronteiras)! Procurando retomar o controlo da situação — o que só aparentemente é possível — Herodes convocou os seus conselheiros que, relendo a Palavra, lhe confiaram que o Messias deveria nascer em Belém. Batia certo, e se o seu coração mais se atemorizou, logo procurou cativar os Magos a fim de, tomando-os como batedores, poder vir a apossar-se (apagar?) a Luz nascente. O medo tem estratégias de medo…

“Ao ver a estrela sentiram grande alegria”
Os Magos representam as primícias da humanidade que partindo em busca de Deus, O acolhem e adoram! Ao contrário de Herodes, eles são de fora (estrangeiros), e não são oficiais do saber oficial nem sacerdotes da religião oficial: eles eram peregrinos — não viviam do seu saber nem se erguiam sobre algum poder, mas auspiciavam conhecer o grande rei, que é o verdadeiro Deus. Por isso, porque despertos, avistaram a luz indicativa do Seu nascimento e não se assustaram. E vendo o aparecimento da Luz, partem à descoberta e ao encontro do Desejado; partem e peregrinam, desde longe, dos extremos para o centro de cena. E a luz da estrela e a busca da verdade jamais os assustou (por mais que o caminho da peregrinação seja longo!). A alegria tem estratégias de construção e de alergia…

“Regressaram […] por outro caminho”
Quem procura encontra. O centro da narrativa evangélica da Solenidade da Epifania é o encontro com o Salvador e a adoração. Os que peregrinando vieram de longe para O conhecer, ao chegar à gruta rendem-se e adoram-n’O, espontaneamente, porque O reconhecem como homem, como sacerdote e como Deus. E tendo-O encontrado no regaço da Mãe, adoraram-n’O, e depois regressam por outro caminho, porque quem se encontra com a Verdade não caminha depois pelos mesmos caminhos de antes; ou pelo menos, não caminha por eles da mesma maneira que antes caminhava – logo os velhos caminhos constituem-se como caminhos novos! Quem se encontra com a Luz é iluminado; e o iluminado não apenas não percorre os mesmos caminhos, como vai pelos caminhos anunciar a alegria de ter conhecido e adorado o Salvador.

Rezar a Palavra e contemplar o Mistério
Ontem, em leve centelha/ viu-te, Moisés, sobre o monte;
hoje não basta o horizonte / para conter a tua estrela.
Os Magos perguntam; e ela / de um Deus infante responde
quem em duras palhas jaz / mais nos faz
quanto mais fundo se esconde. 
Amen.(A. Mora)

Viver a Palavra
Levando a Palavra no coração, vou pôr um pouco de luz (e caminho) na vida de alguém.