Que a tua luz em mim não tenha ocaso
O imaginário dos magos traz-nos suspensos desde a infância. Fabricámos sonhos, realizámos filmes, fizemos teatros, representámos figuras, mas precisamos entrar no essencial da narração de Mateus. Três homens, guiados por uma luz, empreenderam uma aventura que os levou até Belém ao encontro de Jesus para o adorar.
“Viemos adorá-lo”, disseram eles aos sábios de Jerusalém que não se comoveram com o seu heroísmo, antes ficaram sentados na sua sabedoria, nas certezas nunca verificadas das escrituras que acreditavam ser promessa divina.
Aqueles homens, chamados magos, não se deixaram convencer pela sabedoria dos homens e seguiram a luz que traziam no coração e, por isso, encontraram o menino, prostraram-se de rosto por terra e adoraram-no. Entregaram-lhe presentes e, nele, encontraram um novo caminho.
LEITURA I Is 60, 1-6
Levanta-te e resplandece, Jerusalém, porque chegou a tua luz e brilha sobre ti a glória do Senhor. Vê como a noite cobre a terra, e a escuridão os povos. Mas sobre ti levanta-Se o Senhor, e a sua glória te ilumina. As nações caminharão à tua luz, e os reis ao esplendor da tua aurora. Olha ao redor e vê: todos se reúnem e vêm ao teu encontro; os teus filhos vão chegar de longe, e as tuas filhas são trazidas nos braços. Quando o vires ficarás radiante, palpitará e dilatar-se-á o teu coração, pois a ti afluirão os tesouros do mar, a ti virão ter as riquezas das nações. Invadir-te-á uma multidão de camelos, de dromedários de Madiã e Efá. Virão todos os de Sabá, trazendo ouro e incenso e proclamando as glórias do Senhor.
Isaías anuncia a chegada da luz a Jerusalém. Esta luz é o Messias e o Messias é Jesus. Quando esta luz chegar, Jerusalém exultará de alegria, “ficarás radiante, palpitará e dilatar-se-á o teu coração”. Esta luz fará regressar os filhos e filhas de Jerusalém dispersos pela noite do mundo. E os povos, virão de todas as partes, invadirão Jerusalém com camelos e dromedários carregados de riquezas. O profeta convida Jerusalém a exultar de alegria desde já, porque esta promessa vai cumprir-se.
Salmo responsorial Sl 71 (72), 2.7-8.10-11.12-13(R. cf. 11)
O salmo 72 aponta para o governo de Deus sobre o seu povo. Os reis podem desejar-se justos ou mesmo governar com justiça, mas no final, o único que realmente governa com justiça é Deus. Ninguém como ele julga com justiça; ninguém cuida do pobre, do miserável, do fraco como o Senhor; ninguém defende a vida dos oprimidos como Deus; ninguém nos dá a paz verdadeira senão o Senhor. Por causa dessa justiça é que “virão adorar-Vos, Senhor, todos os povos da terra”.
LEITURA II Ef 3, 2-3a.5-6
Irmãos: Certamente já ouvistes falar da graça que Deus me confiou a vosso favor: por uma revelação, foi-me dado a conhecer o mistério de Cristo. Nas gerações passadas, ele não foi dado a conhecer aos filhos dos homens como agora foi revelado pelo Espírito Santo aos seus santos apóstolos e profetas: os gentios recebem a mesma herança que os judeus, pertencem ao mesmo corpo e participam da mesma promessa, em Cristo Jesus, por meio do Evangelho.
Paulo esclarece que a revelação de Deus não é exclusiva de alguns. Assim, a graça que ele recebeu e que o levou ao conhecimento de Cristo não é só para seu benefício, mas para usar em favor dos outros. Do mesmo modo o conhecimento de Jesus não é um benefício exclusivo dos judeus, destina-se também aos gentios que podem “receber a mesma herança que os judeus, pertencer ao mesmo corpo e participar da mesma promessa”.
EVANGELHO Mt 2, 1-12
Tinha Jesus nascido em Belém da Judeia, nos dias do rei Herodes, quando chegaram a Jerusalém uns Magos vindos do Oriente. «Onde está – perguntaram eles – o rei dos judeus que acaba de nascer? Nós vimos a sua estrela no Oriente e viemos adorá-l’O». Ao ouvir tal notícia, o rei Herodes ficou perturbado, e, com ele, toda a cidade de Jerusalém. Reuniu todos os príncipes dos sacerdotes e escribas do povo e perguntou-lhes onde devia nascer o Messias. Eles responderam: «Em Belém da Judeia, porque assim está escrito pelo Profeta: ‘Tu, Belém, terra de Judá, não és de modo nenhum a menor entre as principais cidades de Judá, pois de ti sairá um chefe, que será o Pastor de Israel, meu povo’». Então Herodes mandou chamar secretamente os Magos e pediu-lhes informações precisas sobre o tempo em que lhes tinha aparecido a estrela. Depois enviou-os a Belém e disse-lhes: «Ide informar-vos cuidadosamente acerca do Menino; e, quando O encontrardes, avisai-me, para que também eu vá adorá-l’O». Ouvido o rei, puseram-se a caminho. E eis que a estrela que tinham visto no Oriente seguia à sua frente e parou sobre o lugar onde estava o Menino. Ao ver a estrela, sentiram grande alegria. Entraram na casa, viram o Menino com Maria, sua Mãe, e, prostrando-se diante d’Ele, adoraram-n’O. Depois, abrindo os seus tesouros, ofereceram-Lhe presentes: ouro, incenso e mirra. E, avisados em sonhos para não voltarem à presença de Herodes, regressaram à sua terra por outro caminho.
Mateus descreve a ida dos magos a Belém com sinais muitos interessantes. Segundo ele, chegaram a Jerusalém uns magos à procura do rei que tinha nascido. Vêm para o adorar. A cidade ficou em alvoroço porque não tinha conhecimento de tal facto e Herodes também fica perturbado. Eles falam de um rei, mas Herodes sabe que está em causa o Messias. Chama os sábios os príncipes dos sacerdotes e os escribas, inimigos de Jesus ao longo da sua vida, e estes, que conhecem as escrituras, dizem que o Messias deve nascer em Belém. Os magos vão e encontram o Menino, adoram-no, oferecem-lhe presentes e seguem por outro caminho.
Reflexão da Palavra
O Deus de Isaías manifesta-se como a luz que brilha nas trevas da humanidade. Os povos estão mergulhados na escuridão, mas há uma luz que vem de longe. Uma luz que Jerusalém já pode ver. O povo do Senhor pode já alegrar-se e refletir essa luz sobre toda a terra atraindo todas as nações. Se a luz de Deus resplandecer em Jerusalém, então, “todas as caminharão à sua luz”. Esta luz, a luz de Deus, é aurora, início de um dia novo que não tem fim, é um dia sem ocaso. A esta luz são atraídos, em primeiro lugar, os filhos dispersos e logo todos os povos da terra. Isaías fala de uma promessa que já está a cumprir-se e que será concretizada plenamente em Jesus, quando este nascer em Belém. Ali, “virão adorar-vos, Senhor, todos os povos da terra”.
A luz brilha nas trevas, mas os que estão mergulhados na escuridão podem não querer ir ao seu encontro. Os magos do Evangelho, narrado por Mateus, deixam o seu comodismo. Habituados a olhar o céu e a meditar sobre os porquês pretendem uma resposta para aquela luz que se ergue nos céus. E deixam tudo para cruzar os caminhos da vida até encontrar aquele que pode responder a todas as perguntas. Pelo caminho encontram homens sábios que leem as escrituras, conhecem as profecias e sabem explicar os desígnios de Deus mas preferem continuar na escuridão da sua importância. Os Magos, porém, não se deixam seduzir apenas pelo conhecimento dos sábios de Jerusalém, querem chegar à raiz, à fonte, à verdadeira luz e, encontrando um menino recém-nascido, sem medo adoram-no.
Paulo reconhece que conhecer Jesus é uma graça que vem de Deus e não dos homens. A revelação de Deus, no mistério de Cristo, não é privilégios de alguns, mas dom que está disponível a todos os que, judeus ou gentios, queiram como os magos reconhecer na pequenez do menino nascido em Belém a grandeza do Deus que nos faz filhos e herdeiros da mesma promessa.
Meditação da Palavra
O anúncio da promessa é como a estrela que guia os magos, gera a alegria como se os olhos já vissem a sua realização. Jerusalém ainda está envolta na escuridão. Ainda chora e lamenta o luto da desgraça, mas o anúncio da chegada de Jesus é já razão para tirar o véu do luto e enxugar as lágrimas porque uma luz já brilha na esperança de quantos ouvem a promessa. Esta certeza da esperança é razão suficiente para transformar a noite em dia, as lágrimas em alegria e o luto em festa. Para os magos foi razão suficiente para deixar tudo e seguir a estrela.
A história dos magos deixa-nos suspensos como crianças a contemplar. Com o tempo a narração evangélica foi coberta por muitos pormenores nem sempre verídicos, desde logo o convencimento de que são reis quando o texto fala de magos e nem sequer indica que são três. Na verdade, três são os presentes, mas os magos podem ser apenas dois ou mais do que três. O importante é perceber que os magos são homens habituados à reflexão. Homens de olhar penetrante que procuram o sentido das coisas e não apenas as coisas, o sentido da vida e não apenas a vida, a riqueza última e não as riquezas. São homens que olham o céu à procura daquele que o coração deseja adorar. Arriscam a vida toda para o encontrar. O importante é perceber que eles assumiram a missão da procura e o caminho a fazer como algo deles e que não pode ser dado a outros em seu lugar. O importante é aprender com eles a fazer o caminho, seguir a luz e descobrir o mistério.
No final do caminho eles encontram um menino, mas os olhos veem Deus. Adoram-no de coração prostrado em terra e entregam-lhe tudo. Cada um deles entrega três presentes. Entregam ouro para dizer que não são reis, o rei é Jesus e eles apenas súbditos prontos para o servir. Entregam incenso para dizer que não esperam ser incensados, mas incensar Jesus, pois só ele é Deus. Entregam a mirra que é esta vida limitada, onde o pecado acontece e as fragilidades se manifestam continuamente, reconhecendo que, se não for Jesus, a vida é um caminho para a morte. Como os magos também nós entregamos ouro, incenso e mirra a Jesus.
Muitas vezes fechados na nossa mentalidade, como os sábios de Jerusalém, não fazemos o caminho e não deixamos que outros o façam excluindo-os da fé como se Cristo fosse um património só nosso e mais ninguém pudesse beneficiar da graça de Deus revelada em Cristo. Ou então, colocamos tantas exigências para reconhecer os outros como seguidores de Cristo que eles acabam por nunca se identificar connosco de pleno direito. Afinal, Paulo fala de gentios. Os gentios são todos os que não são judeus. Ora, nós não somos judeus, por isso, somos também nós gentios. Apesar disso recebemos a fé, temos acesso a Cristo. Porque excluímos os outros se nós também recebemos de graça o dom do conhecimento do mistério de Cristo?
O nascimento de Cristo contemplado pelos magos é o início daquele dia sem ocaso que já começou e à sua luz somos convidados a caminhar e a arrastar todos os que queiram ir connosco por um novo caminho nos leve de regresso a casa.
Rezar a Palavra
Senhor, quantas vezes me vejo mergulhado na noite, sem sentido, sem caminho, sem futuro? A tua palavra pronunciada pelo profeta faz nascer em mim uma luz. Tu és a minha luz, Senhor. Brilha sobre mim, porque sou gentio descendente de gentios. Se não for por essa graça que deste a Paulo nunca chegarei ao mistério que salva, ao Menino das palhinhas. Como os magos quero ir a Belém. Quero fazer da minha vida um caminho arriscado na busca do mistério que se esconde para lá dos céus. Como eles quero cair de rosto por terra e entregar-te todas as riquezas, porque a minha riqueza é servir-te. Quero entregar-te toda a fama e prestígio porque a minha alegria é adorar-te. Quero entregar-te as minhas fragilidades porque só tu és a minha vida e eu vido de ti.
Compromisso semanal
Quero viver como mago que segue uma pequena luz no desejo de encontrar o mistério escondido por detrás das coisas deste mundo.