Nosso Senhor Jesus Cristo, Rei do Universo
Em cada ano celebramos o último domingo do ano litúrgico com o título de Cristo Rei. Ocorre pensar qual o significado desta invocação: Cristo, Rei e Senhor do Universo! Não será um título absolutamente desfasado? Não será que o modelo de governo que ele evoca, a monarquia, é inadequado para apresentar e falar da pessoa de Jesus?
Certo é que os textos da Sagrada Escritura remetem, muitas vezes para a figura do rei, falam do reino de Deus e da sua soberania. Mas também falam do pastor (1ª leit de Ezequiel), daquele que reúne os que andam dispersos e assume tomar conta dos excluídos, dos deserdados, dos marginalizados, das vítimas dos poderes e das violências… O título de rei, com que termina o ciclo litúrgico, está enraizado numa cultura que considerava o rei como aquele que unia os cidadãos, reconciliava as partes desavindas e orientava para Deus no exercício da sua autoridade. O projecto de Jesus é o Reino de Deus; o seu senhorio, como rei do universo, exerce-se sobre aqueles que, à maneira de Jesus, constroem pontes e estabelecem ligações entre todos, sem excluir ninguém.
Quando S. Paulo (2ª leit) diz: “o fim será quando Cristo entregar o reino a Deus seu Pai… é necessário que Ele reine…” refere-se a este destino comum da humanidade que vê em Cristo morto e ressuscitado a força e o poder que vence a morte. Cristo, a vida, é quem tem de reinar sobre o último inimigo desta humanidade a ser aniquilado: a morte. Paulo fala, portanto, não de um sistema de governo, do exercício de um poder, mas da salvação da humanidade por Cristo.
- Ver a Deus
– O texto do Ev., com o relato do chamado “juízo final”, combina a imagem do rei (senta-se num trono glorioso), com a do pastor (“como o pastor separa as ovelhas dos cabritos”)… Uma das grandes questões do texto é a de “ver a Deus”: “quando é que nós te vimos…?”
– Grandes personagens bíblicos quiseram ver a Deus: Abraão, Jacob, Moisés, os profetas, os discípulos de Jesus (Filipe: “Senhor, mostra-nos o Pai e isso nos basta!” – Jo 14,8)… Porém, a questão não é tanto ver a Deus mas, como é que nós estamos a ver em cada momento da nossa vida!… Deus não é para ser visto (Moisés só o viu “por detrás”– Ex 33,20-23) porque “Deus passa” e é preciso saber é como é que nós olhamos, como é que nós nos aproximamos, o que é que nós vemos e o que é que sentimos?…
– A pergunta dos que são julgados, tanto dos que são colocados à direita como à esquerda, é: “quando é que te vimos com fome, com sede, peregrino,…?” E a sequência do texto interpela automáticamente: “para onde é que tu tens andado a olhar?” - Ver a Deus no outro
– Para ver a Deus, o primeiro passo é sair de si mesmo, descentrar-se,… A maior característica de Cristo-Rei é o amor… Um amor que se vive no quotidiano, nas coisas simples, no encontro e na ajuda aos outros. Muitos sábios e inteligentes não querem entender esta proposta de Jesus… No entanto, os simples e os humildes alcançam-na mais depressa…
– Quando deixamos de nos ver só a nós próprios, então tornamo-nos capazes de “ver o outro”, as suas necessidades, sentir compaixão (não tenhamos medo da palavra!), e iniciar o momento de encontro com o próximo… Um coração simples e livre para amar leva a fazer o bem de forma espontânea, sem procurar nada mais que o bem do outro… É isto que é ajudar…
– Tudo se joga na acção: dar de comer, dar de beber, hospedar, vestir, acompanhar o doente e visitar o preso… É este fazer que se transforma em ver: então sim, vemos a Deus: “Quando é que te vimos? – Quando fizestes…” A ajuda que agrada a Deus é aquela que se faz no quotidiano, com pessoas concretas, com aquelas que, de acordo com certos critérios, “não valeria a pena ajudar”…
– É Jesus que diz que encarna nessas pessoas, nas mais fragilizadas, naquelas em que muitos dizem que “não vale a pena apostar”…
– Mais do que uma cena de julgamento em que há salvos e condenados, o discurso de Jesus no Ev de hoje é um aviso a todos os seus seguidores sobre o modo como vêem a Deus: ou O identificam na pessoa do necessitado e assim entram no reino de Deus, ou se fecham em si mesmos e ficam de fora…