Ouvimos dizer que os Estados são tanto mais evoluídos quanto têm leis claras e adequadas às diferentes situações. Às vezes, os governantes queixam-se que não avançam mais nas reformas porque as leis não permitem e seria necessário rever muitas normas do corpo legislativo porque as que existem são impeditivas do crescimento.
De facto, um País precisa de ter leis. Mas, também é verdade que a proliferação de leis gera confusão e leva, muitas vezes, a concentrar-se no secundário e a esquecer-se do essencial. A preocupação por legislar conduz a um labirinto que só alguns são capazes de percorrer, porque têm formação ou habilidade para isso, deixando os outros à deriva ou à mercê dos oportunistas.
Ao tempo de Jesus vivia-se uma situação deste género: as grandes referências eram os homens da lei (fariseus, escribas, doutores da lei, anciãos, sacerdotes,… Todos estavam ligados, de uma forma ou de outra, aos códigos legislativos, e procuravam cumprir o que estava determinado…). As pessoas até tinham consideração por estas elites porque eram as grandes referências religiosas e sociais numa sociedade onde o poder político dominante (império romano) era seriamente questionado. O estilo de vida religioso e social dos judeus marcava a diferença e era preciso ter orientações bem definidas para o identificar nos seus aspectos diferenciadores. Numa palavra: o povo orgulhava-se da sua Lei.
- O essencial da Lei
– Mas, de facto, a Lei fundamental do povo tinha dado origem a uma série de preceitos (há quem contabilize 613 no Talmud), que regulavam toda a vida das pessoas (nada podia ficar de fora!) ao ponto de se perder o essencial expresso na oração diária: “Escuta, Isael, o Senhor nosso Deus é o único Senhor. Amarás o Senhor, teu Deus, com todo o teu coração, com toda a tua alma, com toda a tua mente e com todas as tuas forças” (Dt 6,4). Jesus acrescentará a este mandamento um outro do livro do Levítico: “Amarás o teu próximo como a ti mesmo” (Lv 19,18). Nestes dois mandamentos se resumem toda a Lei e os profetas.
– Para Jesus (e para os cristãos), o amor a Deus e o amor aos outros (ao próximo), não podem separar-se. A junção destes dois mandamentos é a grande novidade de Jesus. Amar a Deus? Sim, sempre que vemos o próximo à nossa frente e o amamos com obras e em verdade. Amar o próximo? Sim, porque Deus está nele e sempre que fazemos o bem e cuidamos dele é a Deus que nos dirigimos…
– Mais ainda: o amor só tem uma medida que é a de Jesus (Jo 13,34; 15,12), “amar como Ele amou” e Ele amou-nos até ao fim, ao esgotamento total da sua vida…
– O Deus de Jesus Cristo não tem nada de misterioso: está sempre ao virar de cada esquina, no próximo… E este próximo está sempre diante de nós, cruzamo-nos constantemente com ele… Não podemos amar a Deus à margem da nossa vida com os demais…
– Se amamos a Deus, vamos identificando o nosso projecto com o d´Ele que é o bem de todos os seus filhos, a quem Ele ama sem condições (1ª leit: “não maltrates o teu irmão porque eu escuto o seu clamor e sou misericordioso”).
- Amar como a si mesmo
– É amar como queremos ser amados, colocando-nos no lugar do outro… Se queremos o melhor para nós, é o que devemos procurar para o outro…
– Esta atitude cria novas relações… E, sobretudo, a relação do serviço incondicional…
– Na comunidade cristã, a motivação pode ser este mandamento formulado por Jesus na resposta ao homem da lei: “Amarás o teu próximo como a ti mesmo”. Mas, a maior motivação é a vida e o exemplo de Jesus… Até porque pode haver gente que “não está bem consigo mesmo, não gosta de si!…” e, então a motivação torna-se mais frágil… Nós temos o exemplo maior: “amar como Jesus amou”…
– Para os cristãos, o mais decisivo é: viver o amor ao próximo em cada momento como resposta à opção que fizemos de colocar o amor de Deus em primeiro lugar…