Jesus continua a instruir os seus discípulos sobre as exigências do seguimento. Desta vez, em resposta às questões que lhe são levantadas pelos fariseus, centra-se na relação do homem com a mulher, uma relação de amor que fundamenta a dignidade tanto do homem como da mulher. O projecto inicial de Deus sobre a humanidade inclui esta a relação (1ª leitura); para o livro do Genesis a igualdade e a dignidade estão no mesmo plano; e para Jesus a fidelidade e a indissolubilidade do matrimónio são a concretização deste desígnio de Deus desde o princípio (Evangelho). Como em todos os estados de vida, também no matrimónio há venturas e desventuras, triunfo e humildade, tal como aconteceu com Cristo que “nos conduziu à glória perfeita pelo sofrimento” (2ª leitura).

  1. A linguagem da relação do homem com a mulher

– Os termos que usamos para nos referirmos à união do homem com a mulher não são indiferentes… A palavra Matrimónio está cada vez mais ausente do nosso vocabulário, e mesmo “a minha mulher” ou “o meu marido”… Agora é “ser namorado por largo tempo”, “viver em união”, e o outro é “o meu companheiro” e “a minha companheira”…
– Ao mesmo tempo, o divórcio e a separação são também linguagens e realidades comuns… Os escritórios dos advogados especializam-se para tratar destes assuntos e até já aparecem anúncios de festa de divórcios ou de “despedida de casados”…
– Não é necessário estar a debitar estatísticas (nem todas também são fiáveis e muitas são fabricadas para efeitos de propaganda…) mas, todos conhecemos casos bem próximos de nós e da nossa família em que “o matrimónio fracassou”…
– A situação não é totalmente nova pois, em tempos de Jesus, a mentalidade também era divorcista (se alguns pensam que é uma questão cultural de modernidade ou pós-modernidade, estão muito enganados porque, neste campo, estão a regredir!)… Os judeus podiam divorciar-se as vezes que quisessem, sempre por decisão do homem (a mulher não contava para este efeito!) e não se discutia a questão da validade… O que se discutia era a liceidade… Por isso, a pergunta feita a Jesus começa por: “É lícito a um homem…?”

  1. A orientação de Jesus

– Na resposta à pergunta dos fariseus, Jesus fá-los recordar o que ordenou Moisés, quer dizer, o que está determinado na Lei; mas, logo a seguir explica o motivo que levou àquela deliberação, referindo a conjuntura e remetendo imediatamente para o princípio que coloca o homem e a mulher no mesmo plano; Jesus corrige e esclarece os termos da lei: “No princípio Deus criou-os homem e mulher”. Há uma igualdade profunda, complementaridade e unidade plena: “o que Deus uniu não o separe o homem”…
– “Por causa da dureza do vosso coração, ele (Moisés) deixou-vos esta lei…” A “dureza do coração” é a expressão utilizada para caracterizar a rebeldia do povo no deserto, quando se volta para os seus ídolos, e pelos profetas para se referir à infidelidade do povo… A lei de Moisés é motivada pela rebeldia e infidelidade e não nega a validade do princípio original… O que Jesus faz é restituir dignidade à mulher e ao matrimónio…
– A fidelidade que Jesus proclama é uma Boa Nova, um caminho de felicidade na doação reciproca: é possível que um homem e uma mulher, iguais na natureza e na dignidade, mantenham uma relação de amor até à morte… Para quem acredita que o amor de Deus dura para sempre, a fidelidade é o reflexo desse amor que Deus tem para com toda a humanidade…

  1. O projecto de Deus

– O projecto de Deus é um projecto de amor e de ajuda mútua, que não admite a separação, mas a união e a fidelidade, uma união estável e permanente…
– E a Igreja interpretou este desígnio de Deus como um sacramento, sinal do grande amor de Deus pela humanidade e de Cristo pela sua Igreja: um amor fiel, incondicional, para sempre…
– Mais uma vez, os discípulos parecem ficar desconcertados e, ainda outra vez Jesus apresenta as crianças, que os discípulos tinham repreendido, como modelo de acolhimento, confiança e gratuidade… Com as crianças aprende-se que a fidelidade não é um fardo mas uma segurança libertadora: haja alegria ou tristeza, saúde ou doença, ânimo ou desilusão, o amor fiel garante que há sempre alguém que connosco partilha as diferentes situações da vida…