Mistagogia da Palavra

Em cada domingo reunimo-nos para a celebração da Eucaristia. Mas não podemos julgar da nossa bondade e santificação exclusivamente por esta presença comunitária na celebração do culto. A correspondência dos nossos actos às palavras será a justa medida da autenticidade da nossa fé, fraternidade e amor aos homens nossos irmãos. A liturgia da Palavra deste domingo afirma o perigo da riqueza, porque facilmente cria resistência à lei de Deus e surdez à sua palavra. Assim se fecha o coração do homem a Deus e ao próximo.
Na 1ª leitura o profeta Amós denuncia o comportamento do povo, que, vivendo alguns anos em paz e prosperidade, se entrega a uma vida dissoluta e longe do seu Deus. E não só. Também os pobres e abandonados foram deixados a si mesmos. Amós diz que uma vida assim vai acabar. Irão para o desterro sob o poder dos Assírios, o que sucederia cerca de trinta anos depois. 
A 2ª leitura é de S. Paulo a Timóteo. O Apóstolo recomenda a Timóteo que cultive a justiça, a piedade, a fé, a caridade, a perseverança e a mansidão para com todos. Este elenco de virtudes é proposto a cada cristão, para que possa reflectir sobre a sua situação espiritual. É sobretudo quem preside a uma comunidade que deve meditar nelas.
A 3ª leitura é do Evangelho segundo S. Lucas. É a conhecida parábola do rico avarento e do pobre Lázaro. A mensagem central desta parábola diz respeito ao juízo de Deus sobre a distribuição da riqueza no mundo. O destino da pessoa joga-se totalmente nesta nossa vida. Parece lógico e natural que haja ricos bons e ricos maus: Mantém-se assim a convicção de que podem continuar a existir neste mundo as desigualdades e que o super-rico pode conviver com o miserável, desde que não roube e dê esmola. É esta a convicção que Jesus quer destruir Ele fala de um rico que é condenado, não porque é mau, mas simplesmente porque é rico, isto é, porque se fechava no seu mundo e não aceitava a lógica da partilha de bens. O projecto de Deus é contra o mundo dividido em duas classes de pessoas: ricos e pobres. Os bens deste mundo foram dados para todos e quem tem mais deve p artilhar com quem tem menos ou não tem nada. Para se chegar lá só viver a palavra de Deus (Moisés e os Profetas).

A Palavra do Evangelho

Diante da Palavra
Vinde Espírito Santo e dai-nos a capacidade de ver o mundo com os olhos de Jesus!


Evangelho    Lc 16, 19-31
Naquele tempo, disse Jesus aos fariseus: «Havia um homem rico, que se vestia de púrpura e linho fino e se banqueteava esplendidamente todos os dias. Um pobre, chamado Lázaro, jazia junto do seu portão, coberto de chagas. Bem desejava saciar-se do que caía da mesa do rico, mas até os cães vinham lamber-lhe as chagas. Ora sucedeu que o pobre morreu e foi colocado pelos Anjos ao lado de Abraão. Morreu também o rico e foi sepultado. Na mansão dos mortos, estando em tormentos, levantou os olhos e viu Abraão com Lázaro a seu lado. Então ergueu a voz e disse: ‘Pai Abraão, tem compaixão de mim. Envia Lázaro, para que molhe em água a ponta do dedo e me refresque a língua, porque estou atormentado nestas chamas’. Abraão respondeu-lhe: ‘Filho, lembra-te que recebeste os teus bens em vida e Lázaro apenas os males. Por isso, agora ele encontra-se aqui consolado, enquanto tu és atormentado. Além disso, há entre nós e vós um grande abismo, de modo que se alguém quisesse passar daqui para junto de vós, ou daí para junto de nós, não poderia fazê-lo’. O rico insistiu: ‘Então peço-te, ó pai, que mandes Lázaro à minha casa paterna – pois tenho cinco irmãos – para que os previna, a fim de que não venham também para este lugar de tormento’. Disse-lhe Abraão: ‘Eles têm Moisés e os Profetas: que os oiçam’. Mas ele insistiu: ‘Não, pai Abraão. Se algum dos mortos for ter com eles, arrepender-se-ão’. Abraão respondeu-lhe: ‘Se não dão ouvidos a Moisés nem aos Profetas, também não se deixarão convencer, se alguém ressuscitar dos mortos’».


Caros Irmãos e irmãs, a parábola que Jesus nos narra este Domingo convida-nos a estar atentos aos necessitados que vivem perto de nós e a ter sempre presente a Palavra de Deus. 

Interpelações da Palavra

“…levantou os olhos e viu Abraão com Lázaro a seu lado.”    
Quantas vezes andamos preocupados com o nosso bem-estar material e nos esquecemos do nosso bem-estar espiritual! A parábola do rico avarento e do pobre Lázaro é uma chamada de atenção para trabalhar valores como a atenção ao próximo, a caridade, a fé na revelação de Deus e de Jesus Cristo, a esperança na vida eterna. A vida humana não se reduz ao plano material e presente, o homem tem como finalidade o eterno e a comunhão com Deus. Por conseguinte, a par com o trabalho para alcançar a comodidade material, devemos trabalhar para alcançar o Céu e para isso devemos ajudar os necessitados a ter uma vida digna. Este é o caminho para a comunhão com Deus!
 
“Um pobre, chamado Lázaro, jazia junto do seu portão…” 
O rico nem sequer vê o pobre Lázaro! O contrário do amor não consiste no ódio, mas sim na indiferença, para a qual o outro nem sequer existe. Estas duas personagens da parábola são construídas em contraste uma com a outra, enquanto o rico se veste com o melhor e se banqueteia sumptuosamente, Lázaro está coberto de chagas e deseja comer as migalhas que caem da mesa do rico. O rico é ainda colocado em contraponto com os cães. Enquanto um é absolutamente insensível às necessidades de Lázaro, os outros lambem-lhe as feridas.

“Eles têm Moisés e os Profetas: que os oiçam…” 
A parábola de Jesus ainda nos diz que a Palavra de Deus é central na nossa vida e que sem ela não nos podemos salvar. As Sagradas Escrituras, juntamente com o sofrimento dos pobres, são o melhor testemunho da Vontade de Deus para cada um de nós. Se nos fecharmos à Palavra corremos o perigo de desviar-nos do caminho da rectidão moral e da vontade divina, tal como aconteceu ao rico avarento e aos seus irmãos que se fizeram surdos a Moisés e aos profetas.

Rezar a Palavra e contemplar o Mistério
Queres honrar o Corpo de Cristo?
Depois de o teres honrado na igreja, não o desprezes 
quando está coberto de andrajos, no exterior da igreja.
Aquele que disse: «Isto é o meu corpo disse ainda: «Esta é a minha fome.» 
Que importa que a mesa do Senhor 
brilhe com cálices de ouro, enquanto Ele morre de fome?
Que sentido tem oferecer-lhe púrpura e ouro
Torna bela a casa do Senhor, mas não desprezes o mendigo,
porque o templo de carne deste irmão
é mais precioso do que o templo de pedras!            
João Crisóstomo

Viver a Palavra
Nesta semana, vou procurar estar atento à Palavra de Deus e aos pobres, para com quem sou indiferente.