As nossas sociedades caracterizam-se por estar divididas em estratos: há aqueles que mandam e os que obedecem; os que detêm a riqueza e os que lutam com dificuldades económicas; os que se consideram sábios e os que têm de aprender… Nas competições desportivas também há os que vão à frente e os que ficam para trás; os que ganham medalhas (de ouro, de prata, de bronze) ou uns diplomas de mérito e os que nunca conseguem alcançar esses patamares.
De facto, todas as pessoas têm aspirações. E, se por um lado isso é positivo porque as leva a esforçar-se por atingir objectivos, por outro, verifica-se que, muitas vezes, o que pretendem é ter prestígio, grandeza e poder. A ganância leva-as a passar por cima de tudo e todos sem atender a qualquer norma ética ou moral. Frente aos que procuram actuar com rectidão, honestidade e justiça, criam rivalidades e invejas, divisões entre as pessoas e conflitos de todo o género (1ª e 2ª leitura).
- As aspirações dos discípulos
– Os discípulos de Jesus também mostram que tinham aspirações e revelam muitas dificuldades em compreender as instruções de Jesus: eles discordam do modo como Jesus fala e se comporta… No seu entender, as coisas que Jesus propõe deveriam ser diferentes: mais de acordo com os seus interesses…
– Na sequência do Evangelho do Domingo passado (confissão de fé de Pedro e primeiro anúncio da paixão), os apóstolos continuam a pensar, erradamente, que o sucesso e a fama de Jesus lhes haveria de garantir também os lugares mais elevados para o exercício do poder…
– Parece que os discípulos de Jesus já se consideravam um grupo influente, capaz de se impor aos outros e reivindicar protagonismo (é assim que muitos funcionam na sociedade de hoje: até se inscrevem em determinados grupos e organizações para depois dar o salto para cima…)
– A preocupação de Jesus é, repetidamente, tirar isso da cabeça dos discípulos (de todos os tempos!) instruindo-os e dizendo-lhes que o que aproxima de Deus é o serviço aos mais pequenos, aos pobres, às crianças…
- Qual seria o maior?
– A situação dos que seguiam Jesus é a situação de todos os que, ao longo dos séculos, pretendem continuar a sua obra: existe a tentação de querer ser o maior, de se impor pelo poder e pelo domínio… A linguagem e a atitude do serviço, nas quais Jesus insiste várias vezes ao longo do Evangelho, não seduzem rapidamente e não parece ser um bom motivo de propaganda…
– Mas este é o único caminho que Jesus aponta: a primazia tem de ser dada sempre ao serviço: “se alguém quer ser o primeiro, será o último de todos e servidor de todos”.
– A imagem da criança que é abraçada por Jesus, numa época em que ninguém lhes prestava atenção pelo simples facto de ser ainda criança, ilustra bem o que Jesus pretende dizer: os mais pequenos, os humildes e desprezados pela sociedade, são graça e mediação de Deus…
- Serviço e acolhimento
– A confusão dos discípulos não resulta apenas das palavras que Jesus diz quando se refere à sua entrega nas mãos dos homens, à sua morte e ressurreição. Tem origem também na própria interpretação da pessoa de Jesus: ele não é, como muitos esperavam, e também os seus seguidores mais próximos, o Messias-Rei, triunfador e dominador… Ele é o servo que se entrega por todos, o que veio para servir e não para ser servido…
– A liderança, na escola de Jesus, nunca pode ser exercida pelo poder, mas pelo serviço e o dom de si mesmo…
– O nosso Deus, o Deus revelado por Jesus, não se mostra como o Todo-Poderoso, mas antes como pequeno e débil: “aquele que acolher uma destas crianças em meu nome, é a mim que acolhe; e aquele que me acolher, não me acolhe a mim, mas aquele que me enviou”.
– As palavras de Jesus não se dirigem apenas aos que têm responsabilidades na condução da comunidade mas, são para todos os cristãos: cada um é chamado a construir o Reino de Deus e a fazer parte da Igreja pela via da entrega e do serviço…
– É este o caminho da santidade e da catolicidade da Igreja, objecto da nossa fé no credo: a Igreja é chamada a ser “santa”, ainda que possa não ser perfeita, pelo caminho da humildade e do serviço… É chamada a ser católica na medida em que se abre a todos particularmente aos pobres e aos humildes, aos mais débeis e desprotegidos como as crianças…