Quem não deseja crescer e ser o maior? Quem não gosta de ter poder e chegar aos primeiros lugares? O nosso contexto cultural favorece a ascensão a qualquer preço e apresenta como único objectivo de vida o sucesso. Talvez por isso as pessoas tenham cada vez mais dificuldade em lidar com o sofrimento e o fracasso. Ouve-se dizer que “estava tudo programado para dar certo” e, “se as coisas dão para o torto”, já não há capacidade para encaixar a situação ao ponto de as pessoas baixarem os braços e desistirem com facilidade.
Jesus aponta para outro caminho: para Ele, o poder é a capacidade de serviço aos outros; contra a corrente dominante propõe aos seus discípulos um espírito de serviço (Evangelho); apresenta-se como o servo que dá a sua vida em favor dos outros (1ª leitura), e um sumo sacerdote que conhece e partilha o sofrimento humano alcançando para nós a misericórdia de Deus (2ª leitura). Face ao desejo de poder manifestado pelos discípulos, Jesus orienta-os para o concreto: “podeis beber o cálice que eu vou beber?…”

  1. O desejo do poder

– Por três vezes Jesus falou aos seus discípulos sobre o que ia acontecer com Ele em Jerusalém: a sua entrega às mãos dos homens, a sua rejeição, condenação, morte e ressurreição… Sucessivamente os discípulos dão mostras de não compreender o que Jesus diz sobre o sofrimento e o serviço e não escondem as suas aspirações em triunfar…
– Não foram só Tiago e João a desejar os melhores lugares… Os outros discípulos indignaram-se porque nenhum deles queria ficar para trás e todos pensavam a mesma coisa… Certamente é o que acontece connosco hoje porque, dentro de cada um de nós, existe o desejo de conservar a posição quando ela é boa, assegurar a melhor classificação, subir ao mais alto possível, alcançar o topo…
– Jesus desmonta esta pretensão dizendo-lhes que “não sabem o que pedem” e desafia-os a “beber o mesmo cálice d’Ele”…
– E é curioso que eles aceitam “beber do cálice…” Parece que quem quer subir na vida se dispõe a tudo!… Mas, qual será o caminho e o resultado da proposta de Jesus?

  1. A proposta de Jesus

– O pensamento de Jesus vai no sentido contrário ao dos seus discípulos: eles ambicionam a glória, o futuro grandioso,… Ao passo que Jesus os convida a olhar para o presente a fim de aprender o caminho, que não é como o dos governantes deste mundo que exercem domínio e fazem sentir o seu poder: “não deve ser assim entre vós….”
– Nada de exercício de domínio mas reconhecimento de que todos são iguais… O binómio escravo-senhor é para ser erradicado… O serviço, a ajuda recíproca e a igualdade são as categorias que devem orientar a comunidade dos discípulos de Cristo…
– “Não deve ser assim entre vós… Quem quiser tornar-se grande será vosso servo; e quem quiser ser o primeiro será o escravo de todos…” Parece que a Igreja primitiva percebeu, ao menos em grande parte, estas palavras de Jesus: como ele se humilhou e tomou a condição de servo (ver Fl 2,7), assim devem comportar-se os seus seguidores…
– A lógica do poder assenta no domínio dos poderosos sobre os mais débeis e as leis económicas geram, por esta via, desigualdades e pobreza retirando a esperança às pessoas… Um dos sentimentos mais comuns, seja qual for o sistema governante, é a desilusão…
– O nosso modelo é o “Filho do Homem, que não veio para ser servido, mas para servir e dar a vida pela redenção de todos”… É Ele que aponta o caminho e abre sempre novas perspectivas.

  1. Consequências

– É preciso tirar consequências do nosso seguimento de Jesus tanto a nível individual como comunitário. Cada um deverá rever o modelo de vida e as categorias pelas quais se orienta: subir a qualquer preço ou descer servindo à maneira de Jesus? E se aceitamos que o serviço deve estar em primeiro lugar devemos considerar os diversos âmbitos da nossa actividade: na família, na educação, na escola, no trabalho, no lazer, na Igreja…
– Na nossa comunidade: que ambições temos e que caminho queremos percorrer? Como queremos viver a comunhão, a participação e a missão? (as três palavras que orientam o sínodo sobre a sinodalidade e em que todo o povo de Deus é convidado a participar…) Não há outro caminho senão o do serviço… A ilusão do poder, da imposição e do domínio, mesmo nas questões da fé, já deu resultados que não queremos que se repitam…
– A nossa marca é estar em todas as coisas numa atitude de serviço, por muito que nos custe e, à primeira vista pareça menos eficaz,… Só a opção pelo serviço é que nos pode proporcionar um trabalho conjunto, caminhar juntos, procurar entendimentos e definir objectivos. A procura do poder fecha as pessoas, isola e bloqueia oportunidades… Quem se dispõe a servir encontra o caminho aberto, tem muito menos frustrações e cultiva continuamente a esperança…