Uma das necessidades básicas que o ser humano precisa de satisfazer é a alimentação. Todo o ser humano precisa de comer para se manter vivo. Se o pão faltar é a vida que corre perigo.
Talvez por isso, o instinto de comer se tenha convertido na melhor expressão de toda a ganância humana: a criança começa por experimentar a realidade do mundo exterior levando à boca as coisas que consegue apanhar; no jardim em que foi colocado por Deus, o homem pode comer do fruto de todas as árvores, menos de uma: da árvore do conhecimento do bem e do mal (Gn 2,15-17). O que aconteceu foi que, a ambição de comer tudo, o levou à transgressão da ordem de Deus. O ser humano precisa de comer mas, quando se relaciona com a criação pensando que pode apropriar-se de tudo, comendo, causa a desordem e todo o tipo de desequilíbrios. Sem comer, não sobrevive; mas, nem só de pão vive o homem (Mt 4,4).
- Palavra e pão
– Ainda no Domingo passado observámos como Jesus tem compaixão da multidão que O seguia porque “eram como ovelhas sem pastor”. Nessa ocasião, Jesus congrega aqueles que acorriam a Ele ensinando-os demoradamente…
– Hoje, deparamos com Jesus a olhar para a numerosa multidão que O seguia e a preocupar-se com ela porque precisa de ser alimentada e interroga-se sobre os recursos de que dispõe: apenas cinco pães e dois peixes…
– A palavra e o alimento juntam as pessoas e podem contribuir para serem mais solidárias: pode haver pouco alimento mas, bem distribuído, pode dar para todos…
- “Lógica económica” e “lógica solidária”
– Vendo a multidão que O seguia, Jesus pergunta: “onde havemos de comprar pão para lhes dar de comer?” A sua preocupação é que as pessoas continuem juntas e não tenham necessidade de se dispersar para procurar o alimento…
– Filipe dá uma resposta de carácter económico, baseada nos cálculos, nas contas: “duzentos denários de pão não chegam para dar um bocadinho a cada um”… Já no tempo de Eliseu (2ª leitura) o servo também fez contas considerando que o que existia era pouco para cem pessoas… No mesmo sentido vai a resposta de André: “Está aqui um rapazito que tem cinco pães de cevada e dois peixes. Mas, que é isto para tanta gente?”…
– As questões levantadas partem do princípio que é necessário “ter muito” para repartir, e só quem tem muito é que pode repartir… O pouco que existe parece não dar resposta para tantas necessidades… Esta forma de pensar assenta na chamada “lógica económica”: é necessário ter muito para dar para todos; de outra forma, os problemas não se resolvem…
– A suposta resolução dos problemas da alimentação por esta via é a que mantém as assimetrias, colocando de um lado quem tem e pode dar e os outros que não têm e estão sempre prontos para receber…
– A lógica de Jesus é diferente: pega no pouco que existe, dá graças, quer dizer, coloca o alimento na órbita de Deus porque tudo o que existe é dádiva d’Ele, e depois distribui por todos…
– A lógica do Evangelho não é repartir o muito que alguém tem, mas partilhar o que existe… Em termos da Doutrina Social da Igreja, é passar da “propriedade individual, privada”, para o “destino universal dos bens”…
– Repartir o muito que uma pessoa ou um grupo de pessoas tem, nunca chega para todos, enquanto a partilha, ainda que seja a partir do pouco, vai dando para todos… A lógica económica destrói, a partilha edifica…
- “Lógica do serviço”
– No Evangelho de João é o próprio Jesus que distribui o pão por toda a gente (nos sinópticos são os discípulos) … Jesus dá o exemplo, como demonstra o gesto do lava-pés na última ceia, acrescentando: “assim como eu fiz, fazei-o vós também”…
– Não há ninguém maior do que o outro… Todos temos que estar aos pés uns dos outros… O egoísmo e a ganância de comer, de satisfazer os apetites pessoais, não resolvem nenhum problema; só criam mais…
– O Evangelho diz que quando Jesus percebeu que a multidão o queria aclamar rei, se retirou sozinho para o monte… Jesus não quer o protagonismo de uma liderança individualista porque esse caminho não compromete as pessoas e limita-se a formar um grupo de seguidores passivos, sempre à espera que outros resolvam os seus problemas… Jesus não quer servos ou vassalos, mas amigos (Jo 15,14-15) que participem com Ele na construção do Reino, que actuem como Ele, indo ao encontro das necessidades dos outros…