Mistagogia da Palavra

O pecado é recusa de comunhão com Deus e desagregação do povo que Deus convocou. É ofensa a Deus e, portanto, verdadeira e radical alienação do homem. O desígnio de Deus é comunicar-Se a Si mesmo em Jesus Cristo, com uma riqueza que transcende toda a compreensão e transpõe todo o obstáculo. A actuação deste desígnio de amor não se detém diante da falta dos homens. Por isso, o cristão, mesmo que atormentado pela necessidade e o dever de combater contra o pecado e suas consequências, é sustentado cada dia por uma esperança que não decepciona: ele participa, por meio do Espírito de Jesus, da própria vida de Deus.
A 1ª leitura é da Profecia de Ezequiel. Deus confia a Ezequiel a missão de ir ao encontro dos Israelitas aqui definidos com termos que indicam o absurdo das suas atitudes, embora sabendo que o Profeta não será ouvido. O fim pelo qual Deus o envia é um único: “saibam que há um profeta no meio deles”, isto é, saibam que Deus não os abandonou. Ele é um Deus fiel, por isso está presente.
A 2ª leitura é da Segunda Epístola de São Paulo aos Coríntios. Paulo sente-se continuamente incapaz no seu apostolado por causa de todas as dificuldades que nele encontra. Nesta situação, Deus faz-lhe compreender que não deve pedir a eliminação das dificuldades, mas só a graça de as superar. Se Paulo em sua fraqueza consegue vencer, ficará muito mais evidente a força salvífica de Deus.
O Evangelho é segundo São Marcos. É a visita de Jesus à sua cidade de Nazaré. Os seus conterrâneos não conseguem entender, não conseguem ir além das aparências, reconhecendo n’Ele o Messias e por isso não fizeram a experiência da sua salvação. Outros, ao longe, hão-de acreditar n’Ele e, por ELe, chegar ao Pai.


A Palavra do Evangelho

Diante da Palavra

Vem Espírito Santo, ensina-me a arte da simplicidade e a regenerar-me cada dia na inocência.

Evangelho    Mc 6, 1-6
Naquele tempo, Jesus dirigiu-Se à sua terra e os discípulos acompanharam-n’O. Quando chegou o sábado, começou a ensinar na sinagoga. Os numerosos ouvintes estavam admirados e diziam: «De onde Lhe vem tudo isto? Que sabedoria é esta que Lhe foi dada e os prodigiosos milagres feitos por suas mãos? Não é Ele o carpinteiro, filho de Maria, e irmão de Tiago, de José, de Judas e de Simão? E não estão as suas irmãs aqui entre nós?». E ficavam perplexos a seu respeito. Jesus disse-lhes: «Um profeta só é desprezado na sua terra, entre os seus parentes e em sua casa». E não podia ali fazer qualquer milagre; apenas curou alguns doentes, impondo-lhes as mãos. Estava admirado com a falta de fé daquela gente. E percorria as aldeias dos arredores, ensinando.

Caros amigos e amigas, a verdade do Evangelho foi semeada na terra frágil e fecunda dos pequeninos. Quem for pequeno deixa-se encontrar e abraçar por Deus, em cada momento, bendizendo!

Interpelações da Palavra

 “Eu te bendigo, ó Pai…”
É este o princípio fundamental, a ordem primordial, o coração da existência de Jesus: a bênção, o louvor, o agradecimento ao Pai! Jesus entoa um hino à vida e deixa maravilhar-se com a presença de Deus nos pequenos. Ele não cai na ratoeira do pessimismo e negativismo que só vê o mal, a escuridão, o erro. Mesmo assim, o momento não era para rir: o grupo de seguidores ficara reduzido a 12; a multidão cansara-se; alguns familiares duvidavam da sua saúde mental; os chefes religiosos pretendiam silenciá-lo… Todavia, o Mestre continuava a sorrir, a maravilhar-se, a cantar, a alegrar-se, a sorrir e a amar. A sua oração revela um estilo de vida: encantar-se e enamorar-se pelo pequeno, pelo frágil e pelo pobre.
Ainda hoje é possível viver em atitude de bênção que se torna oração, estilo de vida, modo de amar e se relacionar. Mesmo diante de uma situação de desilusão, desencorajamento ou aparente falhanço, o Pai continua a tecer em nós um projecto de amor. Ocorre deixar o coração entoar um canto de louvor, ocorre ousar o caminho da acção de graças, ocorre experimentar o Magnificat dos pequenos, ocorre atrever-se à fantasia das crianças…

“…porque revelaste estas verdades aos pequeninos”
Só os pequeninos não se escandalizam diante da humildade de Deus, diante da folia da sua pobreza! Os poderosos e sábios, cheios de si, inundados de certezas e coisas, nada têm a receber e a agradecer. Só o pobre ensina a viver, apenas e simplesmente, de amor! Deus não se conquista nem se compra. É essencialmente um dom! E os pequenos conhecem o alfabeto da beleza, a linguagem dos gestos de ternura, as palavras desarmantes e directas, a facilidade do perdão e da entrega. Sim, os gestos pequenos e as palavras simples salvarão o mundo.

“Vinde a mim, todos os que andais cansados e oprimidos”
Jesus é a casa de todos aqueles que se cansam de viver, estão feridos, oprimidos, cegos… É Ele o abrigo, o porto seguro, o abraço sempre humilde e aberto à nossa espera. A nós, que pensamos que é mais fácil lastimar-se do que agradecer, Jesus oferece o repouso do seu coração. Sim, é possível restaurar-se, demorar, permanecer no seu canto de louvor. Ele não suprime o cansaço, as lágrimas, mas ensina-nos, a nós sábios e inteligentes mas analfabetos do coração, a transfigurar a dureza da vida num motivo de bênção, porque Ele está connosco.
Se acolhermos os pequeninos, descobriremos que a vida é amor. Se deixarmos que o céu e as estrelas nos entrem no coração, desvendaremos que a luz é mais forte do que as trevas. Se hospedarmos as palavras dos irmãos, descobriremos que a vida é comunhão. Se nos deixarmos tocar pelas lágrimas descobriremos que a vida é compaixão. Se nos deixarmos encantar por aquilo que somos, descobriremos que Deus é Pai. E se como filhos vivermos – acolhendo e louvando – descobriremos, caros amigos e amigas, que a vida é sempre um Evangelho!

Rezar a Palavra e contemplar o Mistério

Senhor Jesus, Filho Amado do Pai Amante, eterno objecto da contemplação paterna
só Tu conheces o sabor filial da proximidade, a suave alegria da dependência,
envolve-me na mútua dádiva divina, no íntimo abraço selado pelos laços do Espírito.
Só Tu conheces a mais madura inocência, a mais nobre simplicidade, a mais digna pequenez,
despoja-me de ambições armadilhadas e admite-me à escola da humildade e da mansidão.
Só Tu conheces a leveza e a suavidade, só Tu passas pelo mundo, ascendendo ao céu,
Eis-me aqui, para aceitar a alegria da tua vontade que me encaminha para os bens eternos!

Viver a Palavra 

Vou deixar que a alegria de ser filho(a) de Deus tome conta do meu louvor.