Depois de, no Domingo passado termos ouvido Jesus a dizer que “o Filho do homem tem de sofrer, ser rejeitado e morto, e ressuscitar ao terceiro dia” e que, aquele que O segue, tem de renegar-se a si mesmo, tomar a sua cruz todos os dias, perder a vida para salvá-la, eis que o Evangelho afirma hoje que Ele “tomou a firme decisão de ir para Jerusalém”, precisamente o lugar em que estas coisas haviam de suceder.
Para fazer o caminho tem de passar pelo território da Samaria, o lugar dos samaritanos, que nunca estiveram de boas relações com os judeus (recorde-se também o episódio do encontro de Jesus com a samaritana em Jo 4,1-42). Ora, Jerusalém era a capital religiosa do judaísmo.
Nesta caminhada acontecerão muitas coisas e, logo no princípio, assistimos a esta tensão que os discípulos Tiago e João querem resolver à sua maneira: face à recusa de uma povoação em receber Jesus, imediatamente se dispõem a “mandar descer fogo do céu para que os destrua”.

  1. A vida é um caminho

– Muitas vezes se tem identificado a nossa vida como um caminho… E a vida cristã ainda mais porque “ser cristão” é “seguir Cristo”, é fazer um caminho com Ele… O convite permanente que nos é dirigido é: “segue-me”…
– Segui-Lo é uma decisão que cada um deve tomar… E não é fácil porque “as raposas têm as suas tocas e as aves do céu os seus ninhos, mas o Filho do Homem não tem onde reclinar a cabeça”… E não há possibilidades de adiamentos ou desculpas, por mais justificadas que sejam: o “deixa-me ir primeiro” fazer isto ou aquilo, não ajuda a tomar decisões…
– A resposta de Jesus é contundente: “deixa que os mortos sepultem os seus mortos… Quem tiver lançado as mãos ao arado e olhar para trás não serve para o Reino de Deus…” Significa que não podemos segui-Lo de modo irreflectido abdicando das nossas responsabilidades… Elias, na 1ª leitura, ainda permite que Eliseu se despeça da sua família… Mas a exigência do seguimento está igualmente presente: ninguém pode tomar esta decisão e ficar a chorar pelo que deixa para trás…
– Seguir a Cristo não é como ir fazer uma viagem de férias, para desfrutar um bocado durante algum tempo e depois voltar às anteriores ocupações… Não: o seguimento de Cristo implica uma missão futura, que é fruto da responsabilidade de escolher com total liberdade…

  1. Fidelidade no seguimento

– O Evangelho não refere o teor da reprimenda de Jesus àqueles dois discípulos nem a sua argumentação… Constata simplesmente a sua recusa da violência para anunciar e construir o Reino de Deus.
– Vivemos hoje numa sociedade que alguns chamam “líquida” que, entre outras definições, inclui também a ausência de valores e referências tradicionais que levavam as pessoas a dar um sentido à vida e a orientar-se por elas… Isso criava laços entre as pessoas, que compartilhavam os mesmos ideais e se sentiam solidárias na transformação do mundo…
– Hoje, estra forma de estar na vida está muito atenuada porque a superficialidade se sobrepõe ao compromisso com os outros…
– Proclama-se a liberdade individual e esquece-se que a liberdade supõe sempre um risco… E quando se trata de seguir Jesus implica a escolha entre várias opções e exige um compromisso pessoal que deve ser muito ponderado como o Evangelho de hoje deixa bem claro…
– Aqueles que seguem Jesus devem fazê-lo sempre com plena liberdade; devem ser livres e nunca sentir-se obrigados… Paulo diz isso na carta aos Gálatas, usando uma linguagem que lhe é própria: foi Cristo que nos libertou das dependências a que estávamos sujeitos…
– Jesus rejeita o radicalismo e a intolerância manifestada por Tiago e João, embora exija radicalidade no seu seguimento… Para O seguir, é preciso abandonar a superficialidade e aprofundar as circunstâncias da nossa vida e do mundo à nossa volta …
– O radicalismo leva à intolerância enquanto a radicalidade proposta por Jesus conduz a uma resposta decidida, sem reservas… Não se pode seguir Jesus dizendo sim e acrescentando logo um mas…
– Para seguir Jesus é necessário romper com o passado e assumir rupturas… Quem não assume a necessidade de mudar de vida não vai longe…
– Ficar ligado ao passado paralisa (o povo de Israel, no deserto, olhava para “as cebolas do Egipto” e isso impedia-o de caminhar e de acreditar no futuro…)
– Seguir Jesus exige olhar em frente e libertar-se do passado…

  1. Como seguimos Jesus?

– A viagem que Jesus nos propõe é para durar toda a vida… Hoje, tornou-se comum experimentar várias coisas para se decidir por alguma mais tarde… A verdade é que, no geral, há pessoas que nunca se decidem por coisa nenhuma: experimentam tudo e não tomam qualquer decisão… Com Cristo não pode ser assim…
– Quando às vezes se pede alguma colaboração a alguém também são frequentes as escusas (uns mortos, umas ideias preconcebidas, umas ligações que são muito fortes…) e, depois, acabam por ser sempre os que já estão envolvidos em muitas coisas que se sentem na obrigação de juntar mais algumas…
– Podemos perguntar se nos sentimos livres em seguir a Jesus ou se nos sentimos, de alguma forma, escravos… Há muita gente a olhar sistematicamente para o passado (“para trás”) e não é capaz de fazer o caminho para diante… Esses não são dignos de seguir Jesus…