Mistagogia da Palavra
Perante os males do nosso tempo, é fácil cairmos no pessimismo. Contudo, o cristão não pode perder a esperança. Ele sabe que Deus nunca abandona o homem. Deus está presente na história e continua actualmente a realizar a sua obra de salvação na Igreja e no mundo.
Na 1ª leitura, do Livro do Profeta Isaías, Deus dá a conhecer, por sinais simbólicos, que a libertação do povo de Israel do cativeiro de Babilónia está para breve. Assim também o cristão “atento aos sinais dos tempos” mantém o coração aberto à acção de Deus, em fidelidade ao Senhor e à Igreja, unindo na fé o passado com o presente na expectativa da obra que Deus levará a cabo: a nossa libertação final.
A 2ª leitura é da Epístola de S. Paulo aos Filipenses. Adquirir o “conhecimento” de Cristo é entrar em relação pessoal com Ele, é estabelecer uma união vital com Aquele que passou da morte à vida da graça, pela sua mesma força de Ressuscitado, que Ele nos comunica.
A 3ª leitura, de S. João, é o perdão de Jesus à mulher pecadora. O pecado é uma dolorosa realidade no mundo. É uma desordem que altera profundamente os planos de Deus e nos fere no mais íntimo do nosso ser, com repercussões na vida dos nossos irmãos. Jesus denuncia o pecado onde quer que ele se encontre, mas perante o pecador a sua atitude não é de condenação, mas de salvação.
A Palavra do Evangelho
Diante da Palavra
Vem, Espírito Santo, enche o nosso coração do teu amor misericordioso e dá-nos o dom da reconciliação.
Evangelho Jo 8, 1-11
Naquele tempo, Jesus foi para o monte das Oliveiras. Mas de manhã cedo, apareceu outra vez no templo e todo o povo se aproximou d’Ele. Então sentou-Se e começou a ensinar. Os escribas e os fariseus apresentaram a Jesus uma mulher surpreendida em adultério, colocaram-na no meio dos presentes e disseram a Jesus: «Mestre, esta mulher foi surpreendida em flagrante adultério. Na Lei, Moisés mandou-nos apedrejar tais mulheres. Tu que dizes?». Falavam assim para Lhe armarem uma cilada e terem pretexto para O acusar. Mas Jesus inclinou-Se e começou a escrever com o dedo no chão. Como persistiam em interrogá-l’O, ergueu-Se e disse-lhes: «Quem de entre vós estiver sem pecado atire a primeira pedra». Inclinou-Se novamente e continuou a escrever no chão. Eles, porém, quando ouviram tais palavras, foram saindo um após outro, a começar pelos mais velhos, e ficou só Jesus e a mulher, que estava no meio. Jesus ergueu-Se e disse-lhe: «Mulher, onde estão eles? Ninguém te condenou?». Ela respondeu: «Ninguém, Senhor». Disse então Jesus: «Nem Eu te condeno. Vai e não tornes a pecar».
Caros amigos e amigas, o Evangelho de hoje convida-nos a abandonar os nossos corações endurecidos e autossuficientes e a deixar-nos interpelar pelo coração bondoso do Pai, manifestado em Jesus.
Interpelações da Palavra
“Jesus foi para o monte das oliveiras… sentou-Se e começou a ensinar.”
O monte está na memória de todos nós cristãos como lugar de oração, lugar de intimidade profunda com o Pai. S. João recorda que Jesus sofreu não só pelos nossos pecados, mas por todos os pecados, inclusivamente o de adultério. Jesus senta-se para ensinar e as pessoas maravilhadas com as Suas palavras de sabedoria e pelas suas obras aproximam-se para escutá-Lo. Que pessoas aparecem e porque se aproximam de Jesus?
“Mestre, esta mulher foi surpreendida em flagrante adultério.”
Os escribas e os fariseus, autoridades religiosas judias e especialistas na Lei de Moisés, apresentam a Jesus uma mulher surpreendida em adultério. Os fariseus não querem abrir o seu coração, não têm interesse pelo que ensina Jesus, nem dão atenção aos seus sinais, apenas procuram um motivo para acusá-Lo. Estes especialistas da lei procuram acusar Jesus e pedem-Lhe que tome uma posição para com a adúltera, colocando-O assim num beco sem saída: se absolve a mulher, está contra a Lei; se a condena põe-se contra os seus próprios princípios de perdão e misericórdia. Como resolve Jesus esta situação?
“Mulher, onde estão eles? Ninguém te condenou?”
Os judeus sabem que todo o homem é pecador e os fariseus não podiam pretender diante da multidão estar sem pecado: preferem abandonar o lugar. Jesus silencia, não julga os seus opositores nem dita nenhuma sentença contra a mulher. À pergunta de Jesus a mulher responde “ninguém, Senhor”. Jesus veio para perdoar a todos, também aos fariseus que cometeram, com os seus planos homicidas, um pecado pior que o da mulher. No entanto, persistem na sua dureza de coração e fecham-se à salvação.
“Nem Eu te condeno. Vai e não tornes a pecar.”
A mulher reconhece que foi libertada de uma morte cruel. Jesus reconhece o seu pecado e, com grande amor e ternura, pede-lhe que não volte a pecar. Não pecar e viver na verdade são dois passos para viver em liberdade. Jesus apresenta o perdão como um dom, e dons não se vendem, não têm limites; ao contrário, são oferecidos por completo e sem custo, não pela metade. Jesus convida a não só entender o que é o perdão, mas a vivê-lo. A força da lei é o amor e a força do amor é o perdão. O perdão é sempre criativo porque aberto ao futuro, aberto a novas possibilidades. «No coração de Deus, eu, tu, cada um de nós vem em primeiro lugar; vem antes dos erros, das normas, dos juízos e das nossas quedas.» (Papa Francisco)
Rezar a Palavra
No silêncio do meu coração e longe dos afazeres da vida
Sento-me ao teu lado, Senhor e Mestre, para escutar-Te.
Vejo a ternura do teu olhar bondoso e terno,
Escuto as tuas palavras de sabedoria, que me aquecem o coração,
Observo o teu gesto compassivo para com os mais frágeis…
Que o toque delicado da tua presença me envolva,
Penetre no mais íntimo do meu ser e transforme a minha vida.
Viver a Palavra
Maria, nossa Mãe, ajuda-me a despertar nesta Quaresma e a deixar-me maravilhar por Deus,
abrindo-me a uma nova vida que nasce do perdão e da conversão.