Mistagogia da Palavra

Jesus propõe a todos aqueles que deram a resposta da fé, comprometendo-se a segui-l’O, um ideal de vida conforme ao d’Ele, na fidelidade à acção do Espírito Santo e na comunhão com todos os homens. Assim, o cristão encontrará a liberdade interior, a paz, a alegria, a verdadeira felicidade.
Na 1ª leitura, o profeta Jeremias conta a sua vocação. O senhor disse-lhe: “Quando Eu te formei no seio materno, já te conhecia; quando nasceste, já Eu te havia consagrado. E designei-te para seres profeta das nações pagãs. Hão-de fazer-te guerra, sem que possam vencer-te, porque Eu estou contigo, para te salvar”.
Na 2ª leitura, da Primeira Epístola aos Coríntios, S. Paulo, depois de ter desenvolvido a doutrina sobre os carismas, ensina um caminho de serviço comunitário, melhor do que os carismas – o amor fraterno. É um hino à caridade e uma das páginas mais sublimes do Cristianismo.
Na 3ª leitura, de S. Lucas, temos o desenlace do episódio da Sinagoga de Nazaré. Jesus apresentara-Se aos seus conterrâneos como Messias e dá-lhes as características da sua Messianidade: humilde, misericordioso e universal. Os conterrâneos de Jesus, que O conheciam desde pequeno, são incapazes de superar o escândalo da encarnação de Deus na raça humana. Será o Messias o filho de Maria e de José? Impossível! Por isso recusam-n’O e tentam desfazer-se d’Ele. É o prenúncio do que o povo judeu há-de fazer.

A Palavra do Evangelho

Diante da Palavra
Vinde, Espírito Santo e ensinai-nos a descobrir a presença de Deus no meio de nós. 


Evangelho    Lc 4, 21-30
Naquele tempo, Jesus começou a falar na sinagoga de Nazaré, dizendo: «Cumpriu-se hoje mesmo esta passagem da Escritura que acabais de ouvir». Todos davam testemunho em seu favor e se admiravam das palavras cheias de graça que saíam da sua boca. E perguntavam: «Não é este o filho de José?». Jesus disse-lhes: «Por certo Me citareis o ditado: ‘Médico, cura-te a ti mesmo’. Faz também aqui na tua terra o que ouvimos dizer que fizeste em Cafarnaum». E acrescentou: «Em verdade vos digo: Nenhum profeta é bem recebido na sua terra. Em verdade vos digo que havia em Israel muitas viúvas no tempo do profeta Elias, quando o céu se fechou durante três anos e seis meses e houve uma grande fome em toda a terra; contudo, Elias não foi enviado a nenhuma delas, mas a uma viúva de Sarepta, na região da Sidónia. Havia em Israel muitos leprosos no tempo do profeta Eliseu; contudo, nenhum deles foi curado, mas apenas o sírio Naamã». Ao ouvirem estas palavras, todos ficaram furiosos na sinagoga. Levantaram-se, expulsaram Jesus da cidade e levaram-n’O até ao cimo da colina sobre a qual a cidade estava edificada, a fim de O precipitarem dali abaixo. Mas Jesus, passando pelo meio deles, seguiu o seu caminho.


Amigos e amigas, a Palavra de Deus recorda-nos que, tal como os conterrâneos de Jesus, também nós podemos facilmente não reconhecer a presença do Senhor no meio de nós por prestarmos mais atenção ao supérfluo que ao essencial.

Interpelações da Palavra
Da admiração à revolta
O texto apresenta-nos uma mudança radical de ambiente. Tão depressa todos se admiram com as palavras de Jesus ao ponto de testemunharem a Seu favor como esse ambiente dá lugar a outro de descrédito e tensão. E evolui até ao ponto de desejarem deitar Jesus colina abaixo. E qual foi o motivo dessa súbita mudança? O simples facto de Jesus ser filho de José. Era assim então, é assim hoje. Interessam-nos os títulos académicos, o berço de onde se nasce, o dinheiro que se tem, a posição que se ocupa enquanto o conteúdo da mensagem e as obras de bondade e verdade interessam pouco. Até aquela voz que brota do mais profundo do coração, essa voz que nos quer guiar para a Verdade, para a Beleza e para o Bem, essa voz que levou os conterrâneos de Jesus a admiraram-se e a darem testemunho d’Ele, até ela é silenciada apenas porque Jesus é o filho de José. Era assim então, é assim hoje. Será assim amanhã se não aprendermos a colocar a nossa confiança no que as pessoas mostram de si e não naquilo que têm.

O escândalo
Jesus recorda dois episódios em que Deus socorreu estrangeiros quando dentro do Seu povo havia necessidades iguais. Todos se escandalizaram ao ponto de o expulsarem. Mas o escândalo mostra uma realidade mais profunda: os Seus conterrâneos não entenderam Quem tinham diante deles. Não foram capazes de largar as aparências, de largar o que já sabiam de Jesus e acolher a Sua mensagem que tanto espanto fazia. Mas os conterrâneos de Jesus não são diferentes de nós. Também nós temos dificuldade em largar tudo quanto já sabemos e dar espaço para que Deus se manifeste como a novidade constante que é… Como Jesus, também vêm hoje ao nosso encontro homens e mulheres simples que nos mostram o verdadeiro rosto de Deus. Mesmo que isso vá contra aquilo que pensamos e temos por certo. A nós o Senhor só nos pede que os acolhamos. Nada mais.

Jesus seguiu
O Evangelho termina apontando um desencontro. Para os conterrâneos de Jesus nada mudou. Mas Jesus partiu dali e prosseguiu o seu caminho. Este pormenor deve despertar-nos a atenção: depois do encontro com Jesus, como fico? Na mesma ou há implicações? Ele não se impõe, propõem-se. Jesus, podendo, não fez qualquer milagre que poderia ganhar-lhe a admiração e o reconhecimento daquela gente. Limitou-se a apresentar a sua mensagem de vida e amor que, num primeiro momento, foi aclamada mas depois rejeitada. Por muito que gostássemos que Deus fosse menos simples connosco, Ele é assim: discreto. Ele vem e continua a vir na simplicidade e na fragilidade dos irmãos que se cruzam connosco mas que trazem a força da Sua poderosa mensagem. Só temos de nos preocupar mais com a mensagem e menos com o recipiente em que vem para podermos reconhecer Deus no meio de nós.

Rezar a Palavra

Senhor, tu vens ao meu encontro nos simples e humildes
que todos os dias cruzam o meu caminho.
Permite que olhe menos para a sua simplicidade e mais para a verdade, 
a beleza e a bondade da mensagem que trazem. Assim seja.
  
Viver a Palavra
Tomar mais atenção ao que me dizem e menos a quem mo diz.