Mistagogia da Palavra
O Quarto Domingo da Páscoa é chamado Domingo do Bom Pastor. Jesus Cristo é o único e verdadeiro Pastor. Conhece intimamente o Pai e transmite esse conhecimento aos seus. Conhece de perto a nossa condição humana e oferece a sua vida pela salvação de todos. E, porque veio para ser o “Bom Pastor” dos homens, de todos os homens, Ele quis que o seu ministério pastoral fosse prolongado no espaço e no tempo. Assim, na pessoa de Pedro e dos outros Apóstolos, Jesus põe à frente da sua Igreja o Papa e os Bispos, a fim de que, estando ao serviço dos irmãos, possam conduzi-los para o redil de Cristo. Com os bispos, e sob a sua autoridade, colaboram os presbíteros e os diáconos.
Quando falamos de pastor, pensamos especialmente na sua função de guia. Por isso, o Quarto Domingo da Páscoa passou a ser também o dia em que rezamos por aqueles que na Igreja são chamados “pastores” e para que eles nunca faltem à sua Igreja: dia mundial de oração pelas vocações.
A 1ª leitura é dos Actos dos Apóstolos. Pedro está, sob prisão, diante do Sinédrio, porque, após ter curado em nome de Jesus um paralítico de nascença, anuncia a Jesus como o Messias e Salvador. Pedro aproveita a ocasião para proclamar que aquele Jesus, rejeitado e condenado por eles, é o único Salvador de toda a humanidade.
A 2ª leitura é da Primeira Epístola de São João. A vida divina trazida por Cristo, fruto do amor de Deus, começa no Baptismo. A partir daí, somos filhos de Deus em Cristo, mas ainda se não manifestou totalmente o que havemos de ser. Só se manifestará em todo o seu esplendor no dia em que formos semelhantes a Deus, quando O virmos face a face.
O Evangelho é segundo São João. Jesus define-Se como o Bom Pastor em exclusivo. Ele é o Pastor verdadeiro, autêntico e único. Só Ele dá a vida pelas suas ovelhas no momento de perigo e conhece-as e é conhecido por elas. Este conhecimento cria comunhão de vida, relação pessoal, activa, amorosa e recíproca. Para Jesus esta comunhão é tão profunda que é comparada ao conhecimento mútuo de Pai e Filho.
A Palavra do Evangelho
Diante da Palavra
Vem Espírito Santo, Tu que fecundas os pastos da Palavra e enches as fontes da Igreja, faz-me dócil à voz do Mestre.
Evangelho Jo 10, 11-18
Naquele tempo, disse Jesus: «Eu sou o Bom Pastor. O bom pastor dá a vida pelas suas ovelhas. O mercenário, como não é pastor, nem são suas as ovelhas, logo que vê vir o lobo, deixa as ovelhas e foge, enquanto o lobo as arrebata e dispersa. O mercenário não se preocupa com as ovelhas. Eu sou o Bom Pastor: conheço as minhas ovelhas e as minhas ovelhas conhecem-Me, do mesmo modo que o Pai Me conhece e Eu conheço o Pai; Eu dou a vida pelas minhas ovelhas. Tenho ainda outras ovelhas que não são deste redil e preciso de as reunir; elas ouvirão a minha voz e haverá um só rebanho e um só Pastor. Por isso o Pai Me ama: porque dou a minha vida, para poder retomá-la. Ninguém Ma tira, sou Eu que a dou espontaneamente. Tenho o poder de a dar e de a retomar: foi este o mandamento que recebi de meu Pai».
Caros amigos e amigas, em Tempo Pascal, esta definição que Jesus dá de si mesmo combina tão bem com a promessa de ficar connosco e com o nosso conforto de O ter por perto. Mais do que estar: Ele conhece-nos!
Interpelações da Palavra
O Pastor…
Nas memórias da infância retenho a imagem dos pastores como as sentinelas da manhã. Partiam ainda de noite, desde o eclodir dos sonhos, orando com as litanias dos balidos, conduzindo o rebanho pela montanha. Na verdade, eles habitavam os céus e as estrelas da noite, aqueciam-se de fogo e refrescavam-se de brisa, acompanhavam cada passo das ovelhas e alertavam indícios de predadores para os afugentar. Os pastores são artífices de atenção, sabem de olhares e paisagens únicos, distinguem os perfumes da terra e estão impregnados do odor do rebanho, escutam os silêncios e reconhecem a voz ímpar de cada uma das suas ovelhas. Ver, sentir e escutar é a própria identidade do pastor que é inseparável do seu rebanho!
… conhece…
O bom pastor, artífice da atenção, conhece as alegrias e as canseiras, os sonhos e as fragilidades, os impulsos e as quedas. Porque conhece tão bem, acolhe e adequa os seus passos aos ritmos, sabendo também ser exigente quando o caminho ou a preguiça o exigem. Acompanha, cuida, protege. Na verdade nós não gostamos de ser controlados, mas temos um imenso desejo de sermos alvo de atenção Aliás quantos neste mundo investem as melhores energias por se afirmarem aos olhos alheios, chegando ao ponto de expor a sua intimidade para alcançarem notoriedade e se tornarem conhecidos. Mas eis que o Bom Pastor nos oferece o prémio da sua atenção de uma forma espontânea e total! E mais: o olhar do Pastor não se identifica com o do polícia, mas com o do enamorado, Ele conhece-nos sem julgar, porque o amor conhece só o amor.
Na verdade, o facto de sermos conhecidos por Aquele que tudo perscruta, apenas atesta o seu interesse pelo nosso pormenor. Quando achávamos que a nossa vida não tinha valor, somos afinal alvos de uma atenção solícita e misericordiosa que nos cura, nos alenta e salva. Quando nos tínhamos por anónimos damo-nos conta de que o nosso nome afinal não está inscrito num registo cheio de pó e esquecido nos arquivos celestes, mas foi gravado indelevelmente no coração de Deus!
…as suas ovelhas!
Há no pronome “suas” uma relação preciosa de mútua pertença. Os pequeninos sinais tornam-se então impulsos fortes que nos animam os passos e o fogo tão belo de uma presença aquece a vida! Quando se ouve a voz do Pastor, o coração arde dentro, quase rebenta correndo atrás do seu caminhar seguro…
Sim, sempre que reconheço a sua voz, em tantos sinais disseminados no ambiente, revivo e reconheço o seu amor! Diante dessa voz não preciso de esconder-me, mas sinto a força para me levantar; diante do seu olhar, não me envergonho da minha nudez, porque Ele me reveste da sua vida. A sua voz é a energia da minha dança: “À tua palavra, Senhor, lançarei as redes” (Lc 5, 5). A Sua Palavra faz-me superar: “Só tu tens palavras de vida eterna” (Jo 6, 68). Esta é, amigos e amigas, a voz de onde brota o vigor transformante do Evangelho.
Rezar a Palavra e contemplar o Mistério
Senhor, meu pastor, eu te dou graças por que me conduzes
aos prados vibrantes da tua Palavra e aos pastos da Eucaristia.
Como é confortante fazer parte do teu rebanho e confiar-te a vida!
Tu és a presença amorosa e tens poder para desmascarar os propagandistas de um mundo sem amor.
Bates à porta da minha liberdade. Entra, Senhor e revela-me o teu projecto sobre mim,
faz-me penetrar no teu mistério e conhecer o timbre da tua voz, para que nunca me separe de ti.
Viver a Palavra
Vou tomar na minha vida os gestos e atitudes do Bom Pastor, sendo sua imagem para os irmãos.21