Mistagogia da Palavra

A alegria que perpassa através do Advento e que os textos litúrgicos deste domingo põem em relevo nasce desta certeza consoladora: Deus, após o pecado, não abandonou o homem, mas encarnou e tornou-Se presente na história humana e na existência de cada homem, abrindo assim um novo caminho à humanidade.
Esta alegria, por sabermos que Deus está próximo do homem com o nascimento do Salvador e que traz a todos, particularmente aos mais pobres e deserdados, a esperança da felicidade plena, serve ser a atitude fundamental do cristão. A alegria cristã não está dependente dos nossos estados de alma ou da maneira como corre a nossa vida. O cristão, mesmo no meio das contrariedades e da dureza da existência, mantém-se alegre, porque a sua alegria se enraíza na fidelidade de Deus, manifestada em Jesus Cristo.
A 1ª leitura, do profeta Sofonias, é um convite à alegria, dirigido pelo profeta a Jerusalém e que está fundamentado nesta certeza consoladora: Deus, o Rei de Israel e Salvador, está presente no meio do seu Povo, apesar das desordenas e pecados passados. Esta presença amorosa de Deus traz consigo o perdão, afasta o medo e o desalento e dá origem a uma renovação maravilhosa.
A 2ª leitura, de S. Paulo aos Filipenses, diz-nos que a religião cristã é religião de alegria e tem o seu fundamento no facto de Cristo continuar a viver no meio de nós, pondo-nos em comunhão com Deus e com os irmãos.
A 3ª leitura, de S. Lucas, é a pregação de João Baptista, que indica aos homens das mais diversas classes sociais qual a penitência agradável a Deus: o cumprimento dos seus deveres, em função do amor do próximo. Mas, da conversão, com o abandono do pecado, ninguém é excluído, pois todas as situações humanas se podem viver no amor.

A Palavra do Evangelho

Diante da Palavra
Vinde, Espírito Santo, e derramai em nós o amor de Deus, a razão de ser da nossa alegria.

Evangelho    Lc 3, 10-18
Naquele tempo, as multidões perguntavam a João Baptista: «Que devemos fazer?». Ele respondia-lhes: «Quem tiver duas túnicas reparta com quem não tem nenhuma; e quem tiver mantimentos faça o mesmo». Vieram também alguns publicanos para serem baptizados e disseram: «Mestre, que devemos fazer?». João respondeu-lhes: «Não exijais nada além do que vos foi prescrito». Perguntavam-lhe também os soldados: «E nós, que devemos fazer?». Ele respondeu-lhes: «Não pratiqueis violência com ninguém nem denuncieis injustamente; e contentai-vos com o vosso soldo». Como o povo estava na expectativa e todos pensavam em seus corações se João não seria o Messias, ele tomou a palavra e disse a todos: «Eu baptizo-vos com água, mas está a chegar quem é mais forte do que eu, e eu não sou digno de desatar as correias das suas sandálias. Ele baptizar-vos-á com o Espírito Santo e com o fogo. Tem na mão a pá para limpar a sua eira e recolherá o trigo no seu celeiro; a palha, porém, queimá-la-á num fogo que não se apaga». Assim, com estas e muitas outras exortações, João anunciava ao povo a Boa Nova».


Caros amigos e amigas, para além deste 3º Domingo nos convidar à alegria e a tudo o que está relacionado com ela, a saber: a serenidade, a paz, a segurança e a confiança, ele também continua a mostrar como é que devemos preparar a vinda diária e definitiva de Jesus à nossa vida.  

Interpelações da Palavra

Que devemos fazer?
Uma pergunta que também cada um de nós fará ao querer preparar-se, convenientemente, para a vinda do Senhor à sua vida. E, de facto, nesta altura da nossa caminhada de advento, ainda pode haver muita coisa a “estorvar” essa vinda; até mesmo a “desconcentrar”, ao ponto de nem sequer a reconhecermos e estarmos aptos para a acolher. Que atitudes me poderão ajudar a encontrar o Senhor que já está a caminho? Aquelas que João Baptista, outrora, veio a apontar à multidão, aos publicanos e aos soldados, podem, ainda, manter-se válidas para todos nós. São tudo coisas concretas e radicais:

Pôr do nosso à disposição de quem não tem 
À multidão, João Baptista dizia: “Quem tiver duas túnicas reparta com quem não tem nenhuma; e quem tiver mantimentos faça o mesmo”. Abrimos uma porta para o Senhor vir à nossa vida quando vamos ao Seu encontro nas necessidades dos irmãos. Porém, sem nunca esquecermos a tal “ciência e discernimento” que falava Paulo no Domingo passado, já que não se trata só de dar, mas de oferecermos o que mais convém. É-nos pedido um conhecimento que nos leve a destrinçar e a decidir, a olhar e a ver o que, realmente, importa, o que mais é necessário, o que é prioritário, o que, verdadeiramente, pode ajudar a resolver, no imediato ou a seu tempo, a situação que se nos depara.

Prescindir da injustiça e da exploração
Aos publicanos ou cobradores de impostos, que exploravam os pobres e os fracos para lucro próprio, depois de já terem garantido os impostos para as autoridades romanas, “não exijais nada além do que vos foi prescrito”. Uma exortação dirigida a mim, a ti e a todos na figura do publicano. Ele que nos faz lembrar as “estratégias habilidosas” que, muitas vezes, se usam para se tirar proveito dos mais indefesos e incapazes. De maneira alguma, posicionando-se assim no dia-a-dia, a pessoa estará a deixar-se encontrar pelo Seu Senhor.
“Dizer não” a todo o tipo de violência
“Não pratiqueis violência com ninguém, nem denuncieis injustamente” – palavras que vão para os soldados. Os soldados são a imagem daqueles que estão em condições de abusar do próprio poder. Não seremos nós, por vezes, «esses soldados violentos» quando nos aproveitamos do lugar que ocupamos, da profissão que exercemos, para nos impor aos outros e oprimir os mais fracos?
Para além de todas estas atitudes, queremos salientar a do profeta, que, sabendo que todos punham a hipótese de ele ser o Messias, não quis se fazer passar por quem não era. Provavelmente, muitos homens de hoje, na situação dele, teriam aproveitado a ocasião para adquirir algum benefício, tal é o afã de pretender ser esta ou aquela figura pública, ou que o tenham como tal. Mas para o encontro com o Senhor importa a nossa verdadeira identidade.

Rezar a Palavra
Senhor, sei que alguma coisa tenho a fazer, para que venhas ao meu coração
e à minha vida, e aí permaneças para sempre.
Tu me ensinas e me levas a compreender o quê.
Com o teu Espírito, infundido sobre mim no dia do Baptismo,
determina-me e faz-me avançar. Ámen!

Viver a Palavra

Que outras atitudes devo fazer suscitar na minha vida?