Nos nossos dias, tudo se compra e tudo se vende; nada se dá. “Não há almoços grátis”, “ninguém dá nada a ninguém”, “tudo o que se faz é por dinheiro”, “o dinheiro é que manda”… São expressões que ouvimos frequentemente e que caracterizam os comportamentos de grande número de pessoas nesta sociedade mercantilista e economicista em que vivemos…

Curiosamente, um dos verbos que mais se repete no Evangelho que lemos hoje é dar: dar de beber… Este diálogo de Jesus com a samaritana, tão nosso conhecido, sublinha a importância do dar… E quem dá, verdadeiramente, é Jesus. Vamos olhar para o texto observando os personagens.

1.      A posição de Jesus    

– Jesus pede à samaritana para lhe dar de beber… A samaritana regateia porque há entre judeus e samaritanos divergências históricas que a impedem de estabelecer uma relação… A história influencia mais os nossos comportamentos do que às vezes imaginamos…

– Face à objecção da samaritana, Jesus inverte os papéis e propõe-se ser Ele a dar (“se conhecesses o dom de Deus e quem é aquele que te diz: dá-me, tu é que lhe pedirias e ele de daria água viva”)…

– A objecção da samaritana continua ainda por razões históricas: o poço é fundo,… serás tu maior do que o nosso pai, Jacob?!…

– Então Jesus diz-lhe que fala de outra água, que ele a beber e quem dela beber nunca mais terá sede… É a água do Messias com o qual Jesus se identifica abertamente: “Sou eu que estou a falar contigo”… É a água do amor e do serviço…

2.      O percurso da samaritana      

– A samaritana é uma mulher que nos representa a todos: nem tem nome; é, simplesmente, uma mulher da Samaria que se encontra, casualmente, com Jesus… Não fugiu e aceita dialogar com Jesus vencendo todos os preconceitos religiosos, culturais e históricos…

– Não entende imediatamente o que Jesus quererá dizer mas, aceita o diálogo e descobre que Jesus é diferente ao ponto de lhe pedir, ela, dessa água de que Jesus fala e de o chamar abertamente ‘profeta’…

– O diálogo avança sobre questões religiosas e as divergências entre judeus e samaritanos: o monte (Jerusalém ou Guerazim), a adoração em espírito e verdade, o papel do Messias…

– A samaritana ultrapassa os preconceitos e os complexos e vai ter com os outros da cidade… Fala-lhes do que viu e ouviu… Eles vêm e descobrem, eles próprios, que Jesus ainda era muito mais do que a mulher dizia…

Estamos em Quaresma e todos reconhecemos as ressonâncias baptismais dos textos proclamados (a água do Êxodo e da samaritana, o amor de Deus derramado em nossos corações pelo Espírito que nos foi dado…). A atitude da samaritana leva-nos a reconhecer como o coração se deve abrir à palavra… Aquele que procura e tem sede de verdade, de sair desta vida sem sentido, encontra-se com alguém que dá de graça, sem cobrar nada em troca… É Ele que enche estes “cântaros vazios” de fé e de esperança…