Que as minhas dúvidas me levem a Jesus
As dúvidas aparecem no caminho da vida para irmos mais longe, para lá das coisas que os nossos olhos conseguem ver e acima daquilo que o nosso entendimento é capaz de compreender. Para lá de todas as coisas está a razão da nossa alegria.
Podemos exultar de alegria com a expetativa da libertação e experimentar uma grande felicidade perante a possibilidade da realização dos nossos sonhos. É assim que acontece com a natureza. A primavera começa no inverno, quando no interior da terra as sementes percebem a força da vida no mistério da morte e no escuro, se espera a luz do sol que as há de levar aos frutos.
LEITURA I Is 35, 1-6a.10
Alegrem-se o deserto e o descampado, rejubile e floresça a terra árida, cubra-se de flores como o narciso, exulte com brados de alegria. Ser-lhe-á dada a glória do Líbano, o esplendor do Carmelo e do Sáron. Verão a glória do Senhor, o esplendor do nosso Deus. Fortalecei as mãos fatigadas e robustecei os joelhos vacilantes. Dizei aos corações perturbados: «Tende coragem, não temais: Aí está o vosso Deus, vem para fazer justiça e dar a recompensa. Ele próprio vem salvar-vos». Então se abrirão os olhos dos cegos, e se desimpedirão os ouvidos dos surdos. Então o coxo saltará como um veado, e a língua do mudo cantará de alegria. Voltarão os que o Senhor libertar, hão de chegar a Sião com brados de alegria, com eterna felicidade a iluminar-lhes o rosto. Reinarão o prazer e o contentamento, e acabarão a dor e os gemidos.
Como quem pede ao inverno para ser primavera, Isaías chama-nos a uma alegria antecipada. Que o deserto, o descampado e a terra árida exultem de alegria na expetativa de se virem a tornar num jardim ou numa floresta. Que os fracos, os vacilantes e os desconsolados acolham uma salvação que ainda não veem. Que o coxo e o mudo cantem de alegria. A alegria antecipada é possível se nos habita a confiança na promessa. Podemos sempre confiar ou duvidar, a decisão é de cada um.
Salmo responsorial 145 (146), 7.8-9a.9bc-10
O salmo dissipa as dúvidas afirmando, com absoluta certeza, que “o Senhor faz”, “o Senhor dá”, “o Senhor levanta”, “o Senhor protege”, “o Senhor ampara, “o Senhor ama”. Por isso gritamos “que nasça a justiça e a paz para sempre”.
LEITURA II Tg 5, 7-10
Irmãos: Esperai com paciência a vinda do Senhor. Vede como o agricultor espera pacientemente o precioso fruto da terra, aguardando a chuva temporã e a tardia. Sede pacientes, vós também, e fortalecei os vossos corações, porque a vinda do Senhor está próxima. Não vos queixeis uns dos outros, a fim de não serdes julgados. Eis que o juiz está à porta. Irmãos, tomai como modelos de sofrimento e de paciência os profetas, que falaram em nome do Senhor.
Tiago fala de paciência perante o silêncio do inverno, que tarda em revelar o mistério que se esconde nas entranhas da terra. O Senhor vem, mas a sua vinda eminente é precedida do tempo de espera, no qual parece não acontecer nada. Pode suceder que a impaciência pela demora nos volte uns contra os outros, mas o tempo de espera não tem essa finalidade. A espera pretende ser a oportunidade para fortalecer os corações como fizeram os profetas.
EVANGELHO Mt 11, 2-11
Naquele tempo, João Batista ouviu falar, na prisão, das obras de Cristo e mandou-Lhe dizer pelos discípulos: «És Tu Aquele que há de vir, ou devemos esperar outro?». Jesus respondeu-lhes: «Ide contar a João o que vedes e ouvis: os cegos veem, os coxos andam, os leprosos são curados, os surdos ouvem, os mortos ressuscitam e a boa nova é anunciada aos pobres. E bem-aventurado aquele que não encontrar em Mim motivo de escândalo». Quando os mensageiros partiram, Jesus começou a falar de João às multidões: «Que fostes ver ao deserto? Uma cana agitada pelo vento? Então que fostes ver? Um homem vestido com roupas delicadas? Mas aqueles que usam roupas delicadas encontram-se nos palácios dos reis. Que fostes ver então? Um profeta? Sim – Eu vo-lo digo – e mais que profeta. É dele que está escrito: ‘Vou enviar à tua frente o meu mensageiro, para te preparar o caminho’. Em verdade vos digo: Entre os filhos de mulher, não apareceu ninguém maior do que João Batista. Mas o menor no reino dos Céus é maior do que ele».
Prisioneiro de Herodes, João Batista experimenta a noite da dúvida. Será Jesus o Messias? Os sinais que chegam até ele, não coincidem com a ideia de Messias que João construiu no seu espírito. Os seus discípulos questionam-se e questionam-no, permitindo a incerteza e a dúvida. Só Jesus pode realmente dissipar as trevas e devolver a confiança.
Reflexão da Palavra
Vendo de longe a realização da promessa, Isaías desafia os que estão desalentados a fazerem como a natureza e a recuperarem a esperança, porque o tempo de espera está a chegar ao fim e já se vê a beleza de um tempo novo em que o Senhor vem salvar.
Esta alegria antecipada não é alienação, ela está alicerçada na mais genuína confiança porque é o próprio Deus quem vem. Ele não vai enviar ninguém, vem ele mesmo “fazer justiça e dar a recompensa”. A sorte dos que sentem a sua vida estéril como um deserto ou como um descampado vai mudar. Vão experimentar a alegria de florescer como um jardim porque já podem ver a glória do Senhor. Os que estão cansados, abatidos e de coração dilacerado recuperam a coragem. Não tarda vão abrir-se os olhos do cego e os ouvidos do surdo “o coxo saltará como um veado e a língua do mudo cantará de alegria”, reconhecendo que é Deus quem levanta do chão os abatidos, como proclama o salmo.
O tempo de Deus, porém, não é o nosso tempo e pode instalar-se a impaciência. Tiago alerta para essa possibilidade e convida a aprender dos profetas que não se cansaram de anunciar promessas que nunca iriam ver cumpridas, mas confiaram, como o agricultor confia que a semente lançada à terra vai germinar, crescer e dar fruto. O importante é esta confiança que supera toda e qualquer desilusão e fortalece o coração na espera pelo Senhor que, pode vir naqueles de quem muitas vezes nos queixamos.
Na cabeça de João, a figura do Messias, tinha outros contornos que não coincidem com a atuação de Jesus. Está em terreno perigoso porque pode encontrar em Jesus motivo de escândalo e não o Messias, como acontecerá com outros. Ele esperava um justiceiro e isso não condiz com a missão de Jesus. Apesar disso, não confia em si mesmo, nem nos outros, mas procura o próprio Jesus. Só ele poderá dissipar as trevas em que mergulhou o seu espírito, agora prisioneiro. Manda perguntar a Jesus: “És tu, ou temos que esperar outro?”
A sua dúvida é legítima e a resposta de Jesus é clara: “Ide contar a João o que vedes e ouvis: os cegos veem, os coxos andam, os leprosos são curados, os surdos ouvem, os mortos ressuscitam e a Boa Nova é anunciada aos pobres”. Jesus apresenta-se como aquele que vem cumprir o que tinha sido anunciado por Isaías.
Perante esta resposta, João vê-se obrigado a corrigir a imagem e a reconhecer em Jesus o Messias que ele mesmo tinha anunciado desassombradamente.
João, não é “uma cana agitada pelo vento”, nem um palaciano que veste roupas finas, ele é “um profeta” experimentado pela dureza do deserto, habituado a ler os sinais de Deus na pobreza do descampado. Na solidão da prisão, mergulhado nas trevas mais profundas, João recebe as palavras de Jesus como Boa Nova anunciada aos pobres e compreende que Jesus está a salvá-lo, não do cárcere, nem da morte, mas da dúvida. Ele é o cego, o coxo, o mudo, o surdo a quem foi dada a graça de exultar de alegria como acontecera na visitação. Reconhecendo Jesus como o Messias, ele experimenta a mesma alegria que experimentou no seio de sua mãe quando Maria a visitou, mas agora experimenta-a como libertação definitiva, porque será grande no reino dos céus.
Meditação da Palavra
A experiência do deserto, do descampado, do inverno prolongado, está presente na vida de todas as pessoas. Por vezes parece que a primavera já não vem e que se esgotaram as possibilidades de ver florescer o jardim da esperança. A palavra do Senhor, porém, vem alertar-nos para o labirinto em que se pode transformar a dúvida, se ela não é acompanhada pela confiança no Deus que salva.
A dúvida, a incerteza, a noite, a solidão, o vazio, a esterilidade, podem fazer cair no desalento, no desencanto e tornar pesado o coração, se não estiver presente a luz suave da palavra que renova a esperança. Isaías lança, como semente, esta palavra, anunciando que o Senhor vem salvar e, por isso, vale a pena subir ao monte para “ver a glória do Senhor” que está a chegar e dar asas à alegria por estar perto a libertação.
Não há primavera se não houver inverno, daí a importância de viver com paciência, como o agricultor, este tempo em que aguardamos ainda a vinda do Senhor. Colhendo o testemunho de tantos que aprenderam na dor o sentido da esperança – alguns deles vivem ainda e bem perto de nós -, saberemos acolher-nos uns aos outros reconhecendo que, em todo aquele que vem, é o Senhor quem vem dar-nos o alento necessário para não desistirmos. É nesta esperança que se fortalece e ganha coragem o nosso coração abatido e perturbado.
Que a dúvida nos leve a Jesus. O labirinto da dúvida pode fazer-nos perder o rumo, sobretudo se caminhamos de noite. A palavra de Jesus, Boa Nova da salvação, ressoa no silêncio da nossa noite, torna-se presença e levanta-nos do chão. Sabendo isto, não pode a noite dominar-nos, nem a dúvida obscurecer o nosso espírito, a ponto de encontrarmos em Jesus “motivo de escândalo” por não sabermos discernir dos sinais com que ele se apresenta diante de nós. Como João Batista purificamos a imagem que temos de Deus, para não nos deixarmos enganar pela visão de um Deus que não existe em vez de irmos diretamente a Jesus.
Oração
Fortalecei, Senhor, o meu coração dilacerado para que a alegria me preencha neste deserto da vida, neste caminho incerto, nesta noite de espera. Que possa aprender do silêncio da terra, da semente que morre, do agricultor que espera paciente. Que me assista a confiança nos sinais fragilizados da esperança, onde ressoa a voz da Boa Nova que revela o teu verdadeiro rosto. Que a dúvida me leve a ti, para ver a minha terra árida transformada em júbilo.
Desafio para a semana
Acolho a palavra e deixo que ela desperte em mim as razões da esperança, para que a dúvida não me afaste do rumo que Deus tem traçado em mim, pela fé em Jesus.