Depois da morte de Jesus, houve alguns discípulos que se afastaram da cidade, talvez para procurar refúgio no campo, depois do que tinha sucedido em Jerusalém. Dois deles iam para Emaús quando Jesus ressuscitado se pôs com eles a caminho. O afastamento dos outros que se mantiveram na cidade, se era para ter algum conforto no silêncio da aldeia, resultou numa agradável experiência quando reconheceram o Senhor ressuscitado que lhes tinha feito companhia. Imediatamente foram dar a notícia aos restantes membros do grupo e, uma vez reunidos, fizeram, todos juntos a mesma experiência de ter Jesus com eles.
Os sinais do reconhecimento de Jesus são importantes e o Evangelho de hoje sublinha esta identificação de Jesus ressuscitado com o crucificado. Mas, mais do que isso, a ressurreição de Jesus há-de manifestar-se, sobretudo, pelas consequências na vida dos discípulos. É pelas consequências que produz, pela experiência das testemunhas, que se reconhece Cristo ressuscitado. A ressurreição é um acontecimento que provoca, que convida a viver, a celebrar, a anunciar as coisas boas que a vida tem, o milagre da vida que não tem fim depois de ser superada a morte.

  1. Nova compreensão da realidade

– Vemos os “efeitos da ressurreição” em Pedro e nos apóstolos, como nos narra o livro dos Actos dos Apóstolos. Impressiona a franqueza, a liberdade e a segurança com que ele fala ao povo depois de ter sido curado o coxo que estava à entrada do templo…
– O seu discurso é firme e duro ao mesmo tempo… A sua palavra é provocadora, não com o intuito de quem pretende cobrar alguma coisa aos judeus e aos seus chefes, mas com a finalidade de influenciar – “sei que agistes por ignorância… Arrependei-vos e convertei-vos…”
– A conversão é um sinal da Páscoa. Cristo ressuscitado, ao aparecer aos seus discípulos, dá-lhes instruções mandando-os pregar a conversão e o perdão dos pecados no cumprimento do que as Escrituras diziam…
– A ressurreição liberta dos medos, faz sentir que Cristo está próximo e acompanha, dá a capacidade para enfrentar o presente e o futuro… É esta a experiência que os apóstolos nos transmitem…
– Quando os discípulos de Emaús regressam e começam a contar o que lhes tinha acontecido (“como tinham reconhecido Jesus ao partir do pão”), Jesus dá-se a conhecer sem violentar ninguém, e de uma forma muito serena, fornecendo-lhes elementos para eles reinterpretarem a realidade: deixa-se ver e tocar, come com eles, torna-se próximo…

  1. Uma comunidade em formação

– Como ouvimos nos Actos dos Apóstolos, Pedro e os outros apóstolos devem ter vivido intensamente aqueles primeiros dias de anúncio de Cristo ressuscitado… Alguns ainda deveriam estar confusos e abatidos; outros surpreendiam-se com o que Pedro dizia; e haveria também quem estava à espera de mais notícias para poder tomar uma posição… Mas reúnem-se e procuram actuar em conjunto…
– Falam de Jesus: sem dúvida que este é o assunto principal… E não recordam apenas os belos momentos da sua vida passada, as palavras que lhes tinha dirigido em muitas circunstâncias… Ao reunir-se, abrem-se também a coisas novas e olham para o futuro… É assim que dois daqueles discípulos partilham as suas experiências: contam o que lhes aconteceu no caminho e como reconheceram Jesus ao partir do pão…
– Apesar disso, há alguns medos que ainda persistem e assustam-se quando, estando reunidos, Jesus se apresenta; sabiam coisas de Jesus, já tinham escutado algumas testemunhas, mas ainda havia muitas inquietações, medos e duvidas… Havia coisas no passado que tinham deixado marcas e a experiência de Cristo vivo, com a missão que têm que desempenhar, leva algum tempo a amadurecer… Haveria sectores com uma imagem parcial e redutora de Jesus (e há muito disto também nas nossas comunidades!…)
– O relato do Evangelho deixa claro, por outro lado, que a ressurreição não foi uma invenção de gente crédula ou predisposta a crer, mas uma realidade que se impõe… Os medos, as dúvidas, os sobressaltos no meio do inesperado e a resistência em acreditar, mostram bem que a ressurreição não foi uma ideia fabricada mas um acontecimento que se impôs…

  1. No ritmo da vida

– É na situação de vida de cada um que Jesus se dá a conhecer: pode haver surpresa, espanto, dúvidas, como em qualquer encontro… Jesus compreende estas reacções e respeita os tempos da compreensão: “abriu-lhes o entendimento para compreenderem as Escrituras”…
– A ressurreição fornece-nos a chave para compreender, ilumina as situações da vida… Mesmo aquelas zonas mais obscuras e ambíguas da nossa existência recebem nova luz: foi a ressurreição que deu sentido a tudo o que Jesus fez e disse. É também a ressurreição que há-de levar-nos a comprometer-nos com a esperança de uma vida diferente…