Mistagogia da Palavra
Cristo ressuscitou “no primeiro dia da semana”. Nesse mesmo dia e oito dias depois, apresentou-Se aos seus discípulos, reunidos, mostrou-lhes os sinais gloriosos da Paixão e transmitiu-lhes, com o seu Espírito, os dons pascais, compendiados na paz e na reconciliação. Por isso bem depressa esse dia foi considerado pelos discípulos o “Dia do Senhor”, o Domingo. É por isso que a comunidade dos crentes se reúne nesse dia em volta de Cristo Ressuscitado, misteriosamente presente nos sinais da assembleia, da palavra, do sacerdote, do pão e do vinho. Este encontro semanal com Cristo Ressuscitado realiza-se, se modo especial, na Eucaristia, “memorial da morte do Senhor”.
Na 1ª leitura, do Livro dos Actos dos Apóstolos, é-nos dito que uma das características da comunidade primitiva era o poder de realizar milagres, concedido aos Apóstolos. Por esse poder especial a presença de Jesus Ressuscitado impunha-se de uma forma sensível. Mais do que por estes prodígios, a Igreja crescia graças à acção do Espírito Santo.
A 2ª leitura é do Livro do Apocalipse. A fé dos cristãos da Ásia Menor estava exposta a sérios perigos. Ao golpe da perseguição vinha juntar-se a ameaça de erros doutrinais. A palavra de Deus, por intermédio do Apóstolo João, vem garantir-lhes que Cristo ressuscitado está presente nas comunidades cristãs, de tal sorte que as potências do mal serão vencidas e a Igreja triunfará com Cristo.
A 3ª leitura, do Evangelho, é de S. João. O Evangelista coloca Tomé como símbolo da dificuldade que cada discípulo encontra para chegar e acreditar na Ressurreição de Jesus. O que João quer ensinar aos cristãos das suas comunidades, e a nós, é isto: o Ressuscitado possui uma vida que escapa aos nossos sentidos, uma vida que não pode ser tocada com as mãos nem vista com os olhos. Só pode ser alcançada mediante a fé. Tomé, que nem sequer terá tocado nas chagas do Senhor, fez a mais bela profissão de fé de todos os tempos: “Meu Senhor e meu Deus”.
A Palavra do Evangelho
Diante da Palavra
Vem, Espírito Santo, Espírito de Jesus Ressuscitado! Espírito de paz, amor e alegria! Vem!
Evangelho segundo S. João 20, 19-31
“Na tarde daquele dia, o primeiro da semana, estando fechadas as portas da casa onde os discípulos se encontravam, com medo dos judeus, veio Jesus, apresentou-Se no meio deles e disse-lhes: «A paz esteja convosco». Dito isto, mostrou-lhes as mãos e o lado. Os discípulos ficaram cheios de alegria ao verem o Senhor. Jesus disse-lhes de novo: «A paz esteja convosco. Assim como o Pai Me enviou, também Eu vos envio a vós». Dito isto, soprou sobre eles e disse-lhes: «Recebei o Espírito Santo: àqueles a quem perdoardes os pecados ser-lhes-ão perdoados; e àqueles a quem os retiverdes ser-lhes-ão retidos».
Tomé, um dos Doze, chamado Dídimo, não estava com eles quando veio Jesus. Disseram-lhe os outros discípulos: «Vimos o Senhor». Mas ele respondeu-lhes: «Se não vir nas suas mãos o sinal dos cravos, se não meter o dedo no lugar dos cravos e a mão no seu lado, não acreditarei». Oito dias depois, estavam os discípulos outra vez em casa e Tomé com eles. Veio Jesus, estando as portas fechadas, apresentou-Se no meio deles e disse: «A paz esteja convosco». Depois disse a Tomé: «Põe aqui o teu dedo e vê as minhas mãos; aproxima a tua mão e mete-a no meu lado; e não sejas incrédulo, mas crente». Tomé respondeu-Lhe: «Meu Senhor e meu Deus!». Disse-lhe Jesus: «Porque Me viste acreditaste. Felizes os que acreditam sem terem visto».
Muitos outros milagres fez Jesus na presença dos seus discípulos, que não estão escritos neste livro. Estes porém foram escritos para acreditardes que Jesus é o Messias, o Filho de Deus, e para que, acreditando, tenhais a vida em seu nome.”
Caros amigos e amigas, eis ressuscitado Aquele que foi crucificado! Cristo está vivo e transborda a Vida do Amor sem fim! Esta é a verdade que nos torna livres e a alegria que ninguém nos pode tirar! E Ele manifesta-Se a quem O quer ver e O procura, mesmo sem o saber! Deixemo-nos surpreender… como Jesus quiser!… E a Fé converte o espanto em Esperança!
Interpelações da Palavra
“Jesus veio e apresentou-se no meio deles” … eis a fonte da misericórdia sempre a jorrar imensos dons!
Jesus ressuscitado, o mesmo que foi crucificado, veio, vem e continuará a vir até nós! Ele tem as suas delícias em estar no meio de nós, dentro de nós! Ele que nos amou e se entregou até ao extremo por nosso amor, ainda na Cruz, entregou-nos o melhor que tinha (e tem!): Sua Mãe e Seu Espírito! Agora, Jesus vem glorioso, como Amigo íntimo, Consolador, Esposo da Igreja, e sempre, como Senhor e Mestre! Vem dar-nos o que precisamos em cada momento; o que sabemos precisar e o que não sabemos! E muitas vezes nos surpreende! Ele irrompe, quando e como quer, na nossa vida, mesmo quando temos as portas fechadas! Naquela tarde, os discípulos precisavam da Sua paz para acolher o Seu Espírito! E Jesus queria precisar deles! Jesus, que já não tinha corpo físico, queria precisar do corpo humano dos seus discípulos para serem agora o Seu Corpo, misticamente unido pelo Seu sopro – “soprou sobre eles” -, o Espírito Santo, que os iluminará e conduzirá. Como é bela a verdade desta nova Criação!!! Eis homens e mulheres novos, que são enviados a continuar o anúncio para o qual o Pai enviara o Filho: a Vida vence a morte pelo Amor!
“Os discípulos ficaram cheios de alegria ao verem o Senhor”… eis a misericórdia a derramar a fé nos corações!
Porque “as Suas palavras são obras”, Jesus ressuscitado transformou com a Sua Presença gloriosa o coração dos discípulos que ali se encontravam reunidos. Antes, estavam perplexos, desanimados e cheios de medo! Agora ficaram cheios de alegria, porque viram o Senhor! Viram glorificado o mesmo que tinha sido morto crucificado! Ele mostrou-lhes as mãos e o lado! Sem saber como, sabiam e, por isso, acreditavam que Jesus estava vivo. Já não precisavam de Lhe fazer perguntas! Jesus estava vivo e cumpria o que prometera: “Eu voltarei a vós.”, “Deixo-vos a paz!”, “o Espírito da verdade, há-de guiar-vos para a verdade completa.”
“Meu Senhor e meu Deus!”… eis a misericórdia a ensinar a acolher a LUZ da Fé!
Tamanha era a dor e a angústia que a crucifixão cravara no pobre coração de Tomé, que para ele não lhe bastava o testemunho dos outros discípulos! Como a estes não lhes bastou o testemunho de Maria Madalena. Ele quis ver Jesus, com os seus próprios olhos! E viu e tocou, mas não como pensava ver e tocar. Ele viu-se ser visto pelo Ressuscitado, que lhe tocou o seu coração sincero com a Luz da Fé, e de imediato proclamou: “Meu Senhor e meu Deus!” Assim é connosco! Tomé foi feliz porque teve uma comunidade de discípulos que o fez desejar ver Jesus Glorioso! Felizes somos nós que temos uma Comunidade, o Discípulo amado, a Madadena, Pedro, Tomé e todos outros discípulos que nos despertam e estimulam o desejo de receber e acolher o dom da Fé pura que nos dá a posse das coisas que se esperam e a certeza daquelas que não se vêem com os olhos da carne.
Foi assim para os primeiros discípulos e, assim continua a ser connosco, seus discípulos também, porque aquele primeiro dia da semana, o Dia que o Senhor fez, é o dia que se chama “Hoje”! Jesus ressuscitou, está vivo, ontem, hoje e por toda a eternidade!
Rezar a Palavra e contemplar o Mistério
Jesus, sem eu Te procurar, já Tu me procuravas! E chamaste pelo meu nome, como a Maria Madalena! Agora, sou eu que Te procuro! Continuamente! Quando estou feliz, procuro-Te ressuscitado; quando estou triste, procuro-Te na tua Paixão, necessitado de companhia, como eu! Sim, qualquer estado em que me encontre é uma porta aberta para entrar no íntimo da minha intimidade, lá, naquele outro estado imenso e profundo, onde me recrias numa solidão sonora, numa música calada! Quando aí me permites ver sem olhar, possuir sem tocar, saber sem entender, volto à vida com a alegria da Páscoa florida e é tão simples ver-Te no pobre, na minha irmã doente, nos teus amigos e inimigos, em tudo e em todos! Jesus, eu estou à porta e clamo: vem cear comigo!
Viver a Palavra
Toda desperta na fé, quero ver-Te, Jesus, como, quando e em quem Tu te quiseres manifestar!