Mistagogia da Palavra

O Advento é um tempo de conversão, isto é, mudança de mentalidade e de atitudes, quer em relação a Deus, quer em relação ao próximo. Há, na verdade, muitas coisas em nós que constituem obstáculo à vinda d’Aquele que nos salvará.
Impõe-se-nos, portanto, a tarefa de prepararmos os caminho do Senhor, de modo que o Salvador encontre aquela disposição de espírito, aquele acolhimento às suas iniciativas que lhe permitam transformar-nos em “homens novos” do reino que vem fundar.
Na 1ª leitura, do profeta Baruch, Deus promete a Israel dias de glória e de bênção, que porão fim ao cativeiro de Babilónia e reunirão o seu povo em volta de Jerusalém. Como Israel, Deus também nos libertou, por meio de Jesus Cristo, que veio à terra para nos reunir no seu Povo, a sua Igreja, a “Jerusalém do alto” e nossa mãe.
Na 2ª leitura, de S. Paulo aos Filipenses, o Apóstolo dá graças pelos resultados na difusão do Evangelho realizada por aqueles cristãos e exorta-os a continuar a trabalhar na construção da Igreja, pelo progresso da caridade e no conhecimento de Deus, e assim “tornarem firmes e irrepreensíveis para o dia de Cristo”.
No Evangelho, S. Lucas, situando com precisão a pregação de João Baptista na história, indica que a salvação é para todos os homens. A condição essencial da aceitação da salvação é a conversão a Deus. Para que a vinda de Cristo até nós hoje se cumpra é necessário “preparar os caminhos do Senhor”.

A Palavra do Evangelho

Diante da Palavra
Vem, Espírito Santo, habita este deserto com a Tua luz e refresca-o com a brisa da Tua sabedoria.

Evangelho    Lc 3, 1-6
No décimo quinto ano do reinado do imperador Tibério, quando Pôncio Pilatos era governador da Judeia, Herodes tetrarca da Galileia, seu irmão Filipe tetrarca da região da Itureia e Traconítide e Lisânias tetrarca de Abilene, no pontificado de Anás e Caifás, foi dirigida a palavra de Deus a João, filho de Zacarias, no deserto. E ele percorreu toda a zona do rio Jordão, pregando um baptismo de penitência para a remissão dos pecados, como está escrito no livro dos oráculos do profeta Isaías: «Uma voz clama no deserto: ‘Preparai o caminho do Senhor, endireitai as suas veredas. Sejam alteados todos os vales e abatidos os montes e as colinas; endireitem-se os caminhos tortuosos e aplanem-se as veredas escarpadas; e toda a criatura verá a salvação de Deus’».

Caros amigos e amigas, com João Batista, somos convidados a fazer a experiência do deserto. Engenheiros de caminhos do Evangelho, aprendemos neste Advento a alegria da esperança que nos habita e nos impulsiona a uma relação mais transparente e faminta com o Senhor que vem.

Interpelações da Palavra

No deserto
O evangelista Lucas apresenta-nos, muito detalhadamente, o contexto da pregação de João, filho de Zacarias. No tempo e no espaço concreto, Deus vem e revela-se na sua palavra. É também hoje e aqui que se (re)abre este caminho de relação com Deus. Por sua iniciativa de amor, vem ao nosso agora, ao nosso deserto, e falam-nos ao coração. Como João Batista, somos convidados a descobrir, no nada de cada deserto, o essencial das nossas necessidades, a vida de cada surgir, o encanto e a surpresa de cada (in)esperado. É no deserto que aprendemos o silêncio das palavras e as cores da transparência. É no deserto, mesmo no meio da cidade e dos ruídos do Natal antecipado, que experimentamos a sede, a fome, o desejo, o vazio para acolher, para desejar. Sim, falta-nos muito desejar, porque poucas vezes, talvez por medo, habitamos o deserto.

Preparai…endireitai…alteai…aplanai…
Deste deserto que respiramos, da intimidade com o Deus que nos abraça, brota o discernimento, a conversão, a missão. E João Batista é a voz que clama, o “lembrete” que soa bem alto, para prepararmos um caminho para o Caminho. Com o grito de Isaías “Preparai o caminho do Senhor, endireitai as suas veredas”, João Batista chega a ferir a nossa comodidade ou desleixe. O Advento é a hora de aprofundar a relação com Aquele que esperamos, sintonizar a mesma rede e deixar-nos contagiar pelo amor. Jesus quer penetrar nos nas tendas dos nossos medos, incertezas, escuridões… Mas precisa que lhe abramos caminhos de proximidade, precisa que endireitemos as curvas que nos afastam Dele e contornam a Verdade. Precisa que alteemos os dons escondidos e que receamos colocar a render. Precisa que aplanemos a altivez e orgulho que nos afastam do outro como irmão. Precisamos aprender a engenharia do Espírito que constrói pontes e não muros.

Sinal de esperança
Quando nos deixo construir por dentro, por Aquele que nos habita e deseja vir de novo, também gritamos. Sim, gritamos a esperança nos desertos que habitam as nossas cidades. Gritamos a esperança no vazio que povoa as famílias. Gritamos a esperança, como João Batista, nas vidas que precisam deixar-se tocar pela Luz para descobrir caminhos de encontro e de paz. E, lançados nesta missão como engenheiros da obra do Reino de Deus, “toda a criatura verá a salvação de Deus”.
O Advento é este grito de esperança que advém do encontro com Aquele que nos encontra. Deus veio semear-se na nossa carne e quer que nos abramos à Vida para que brote, nasça e mantenha acesa a esperança em nossos corações. Não podemos perder a esperança, não podemos deixar de a semear, de gritar a paz, o Evangelho!

Rezar a Palavra

Senhor Jesus, vem depressa, vem florir neste deserto insípido
Que teima repetir cada devir e não deseja a água viva e sempre nova que me renova.
Senhor Jesus, vem depressa, vem florir neste deserto incolor
Que se fecha em labirintos e não arrisca o assombro e a alegria de viver.
Senhor Jesus, vem depressa, vem florir neste deserto inodoro
Que esquece as marcas do Teu perfume e não sonha o grito da esperança.

Viver a Palavra

Vou descobrir um caminho concreto a “endireitar” na minha relação com Deus.