Uma dieta para um caminho longo de conversão
Uma dieta de gafanhotos e mel silvestre é tudo o que basta para fazer o caminho de regresso a casa. A veste de festa é feita de pelos de camelo, porque a verdadeira veste é interior e chama-se paz.
O caminho de regresso é guiado pelo pastor de Israel, que tem no braço o poder da vitória e na mão o bastão do pastor.
A festa é o encontro com o Filho de Deus que no Espírito Santo e no fogo purifica de todo o pecado e de toda a censura.
LEITURA I Is 40, 1-5.9-11
Consolai, consolai o meu povo, diz o vosso Deus. Falai ao coração de Jerusalém e dizei-lhe em alta voz que terminaram os seus trabalhos e está perdoada a sua culpa, porque recebeu da mão do Senhor duplo castigo por todos os seus pecados. Uma voz clama: «Preparai no deserto o caminho do Senhor, abri na estepe uma estrada para o nosso Deus. Sejam alteados todos os vales e abatidos os montes e as colinas; endireitem-se os caminhos tortuosos e aplanem-se as veredas escarpadas. Então se manifestará a glória do Senhor e todo o homem verá a sua magnificência, porque a boca do Senhor falou». Sobe ao alto dum monte, arauto de Sião! Grita com voz forte, arauto de Jerusalém! Levanta sem temor a tua voz e diz às cidades de Judá: «Eis o vosso Deus. O Senhor Deus vem com poder, o seu braço dominará. Com Ele vem o seu prémio, precede-O a sua recompensa. Como um pastor apascentará o seu rebanho e reunirá os animais dispersos; tomará os cordeiros em seus braços, conduzirá as ovelhas ao seu descanso».
Pelo pecado o povo afastou-se de Deus e experimentou o sofrimento e a dor, mas o Senhor abre um caminho entre as montanhas, no meio do deserto e na estepe para o fazer regressar. Deus fala ao coração do seu povo para o trazer de volta. A voz do Senhor endireita os caminhos e o próprio Senhor protege o povo com o seu poder e caminha à sua frente como um pastor.
Salmo 84 (85), 9ab-10.11-12.13-14 (R. 8)
O salmo aponta para Jesus, apresentando-o como o príncipe da paz, ele é a verdade e é verdade o seu evangelho, da sua misericórdia vem a salvação e o seu reino é justiça. É ele quem vem, é a ele que aguardamos e é ele a salvação para o seu povo e para os todos os povos.
LEITURA II 2 Pedro 3, 8-14
Há uma coisa, caríssimos, que não deveis esquecer: um dia diante do Senhor é como mil anos e mil anos como um dia. O Senhor não tardará em cumprir a sua promessa, como pensam alguns. Mas usa de paciência para convosco e não quer que ninguém pereça, mas que todos possam arrepender-se. Entretanto, o dia do Senhor virá como um ladrão: nesse dia, os céus desaparecerão com fragor, os elementos dissolver-se-ão nas chamas e a terra será consumida com todas as obras que nela existem. Uma vez que todas as coisas serão assim dissolvidas, como deve ser santa a vossa vida e grande a vossa piedade, esperando e apressando a vinda do dia de Deus, em que os céus se dissolverão em chamas e os elementos se fundirão no ardor do fogo! Nós esperamos, segundo a promessa do Senhor, os novos céus e a nova terra, onde habitará a justiça. Portanto, caríssimos, enquanto esperais tudo isto, empenhai-vos, sem pecado nem motivo algum de censura, para que o Senhor vos encontre na paz.
Pedro adverte os cristãos para a necessidade de aproveitarem o tempo de espera como tempo da ação de Deus em seu favor. Devendo empenhar-se sem pecado nem qualquer motivo de censura, vivendo santamente e com grande piedade, para serem encontrados em paz no dia do Senhor.
EVANGELHO Mc 1, 1-8
Início do Evangelho de Jesus Cristo, Filho de Deus. Está escrito no profeta Isaías: «Vou enviar à tua frente o meu mensageiro, que preparará o teu caminho. Uma voz clama no deserto: ‘Preparai o caminho do Senhor, endireitai as suas veredas’». Apareceu João Baptista no deserto, a proclamar um batismo de penitência para remissão dos pecados. Acorria a ele toda a gente da região da Judeia e todos os habitantes de Jerusalém e eram batizados por ele no rio Jordão, confessando os seus pecados. João vestia-se de pelos de camelo, com um cinto de cabedal em volta dos rins, e alimentava-se de gafanhotos e mel silvestre. E, na sua pregação, dizia: «Vai chegar depois de mim quem é mais forte do que eu, diante do qual eu não sou digno de me inclinar para desatar as correias das suas sandálias. Eu batizo-vos na água, mas Ele batizar-vos-á no Espírito Santo».
O evangelho de Marcos revela Jesus como o ungido, o Filho de Deus, aquele que é mais forte e que batiza no Espírito Santo. Com palavras do profeta Isaías anuncia João, o arauto, que abre caminhos no deserto e prepara o povo, pela conversão, para o encontro com o Senhor que salva.
Reflexão da Palavra
O profeta é a boca do Senhor e o Senhor falou. A quem falou o Senhor? Ao seu povo. Falou “ao coração de Jerusalém” como o esposo fala ao coração da esposa. Como Siquém falou a Dina (Gn 34,3), como José falou aos seus irmãos (Gn 50,21), como o levita falou à esposa que o abandonara (Jz 19,3), como Boaz falou a Rute (Rut 2,13), e como Oseias falou à sua esposa, “ao deserto a conduzirei para lhe falar ao coração” (Os 2,16).
O Senhor fala através do profeta ao coração de Jerusalém para lhe elevar o ânimo, pois só assim poderá fazer o caminho de regresso. Israel pecou, mas o seu pecado já foi redimido, “está perdoada a culpa”, porque já sofreu mais do que era necessário.
Depois do castigo vem a recompensa. Há um caminho a fazer que não é necessariamente através do deserto. A primeira travessia é interior, é espiritual, é o caminho do Senhor. É necessário estar preparado para fazer este caminho de fé e de esperança.
No regresso o Senhor vem à frente, como um rei vitorioso da batalha, como um pastor guiando o seu rebanho. Anunciado pelo arauto que grita. “Eis o nosso Deus. O Senhor vem com poder”. Ele traz o “prémio, a recompensa”. O Senhor traz o seu povo através do deserto, como se trazem os despojos depois da batalha. Ganhou direito ao seu povo porque lhe falou ao coração. O povo ganhou um Senhor porque deixou a palavra penetrar no coração.
O salmo 85 é o anúncio da salvação que se aproxima. Depois de uma longa introdução vêm os versículos que se cantam neste domingo que anunciam um tempo de regresso da paz, da justiça e da verdade.
O Senhor que, em outros momentos da história, agiu em favor do seu povo tirando-o dos precipícios do pecado “restaurastes a prosperidade de Jacob. Perdoastes as culpas do vosso povo” (v. 2) pode vir de novo ao encontro do seu povo trazendo a paz, o amor e a fidelidade, “volta-te para nós” (V. 5).
E de facto, o Senhor vem “para os seus amigos e para todos os que voltam para ele o coração”. Porque o Senhor fala de paz, de amor e fidelidade ao seu povo, haverá encontro entre o céu e a terra “da terra brota a verdade e a justiça brotará do céu”. O salmo recorda, no meio do sofrimento do tempo presente, a esperança na salvação, porque o Senhor vem com toda a sua glória.
Os elementos de intervenção divina apontam para Cristo, de facto ele é a paz, a misericórdia, o amor, o caminho e a verdade, ele é a salvação. O seu evangelho é verdade e salvação para todos os povos.
Pedro, sentindo que os seus dias estão a chegar ao fim, escreve esta carta a uma comunidade a quem Paulo também já escrevera (3,16). Trata-se de uma exortação para que todos os cristãos se mantenham firmes no modo de viver que aprenderam, para que o Senhor os “encontre imaculados, irrepreensíveis e em paz”.
O dia do Senhor, que parece tardar, vai chegar. Este é o tempo, diz Pedro, em que se manifesta a paciência de Deus a nosso favor. O tempo de Deus não é como o nosso, de modo que ninguém pense que não se vai realizar a promessa, pois “um dia diante do Senhor é como mil anos e mil anos como um dia”.
Deus quer dar oportunidade a todos para se encontrarem com a salvação, porque o seu dia “virá como um ladrão”. Enquanto espera, o cristão deve empenhar-se “sem pecado nem motivo algum de censura, para que o Senhor vos encontre na paz”. Uma paz que significa amizade com Deus e desejo do encontro com ele.
A liturgia deste segundo domingo do Advento leva-nos ao início do evangelho de Marcos. O evangelista começa por especificar que este é o “evangelho de Jesus Cristo Filho de Deus”, ou seja, a boa nova libertadora. Estamos no início, no momento da chegada desta notícia ao mundo que é o mesmo que a chegada de Cristo pela encarnação. A proposta do evangelista é que avancemos com Este Filho de Deus para o conhecer melhor até o reconhecermos pela fé.
Depois de apresentar Jesus, o evangelista, apresenta João Batista como o mensageiro anunciado por Isaías para ser a voz e para preparar um caminho no deserto. Ele é quem anuncia a conversão e realiza o batismo de penitência para a mudança da vida. A sua figura carateriza-se por vestir “pelos de camelo, com um cinto de cabedal em volta dos rins, e alimentava-se de gafanhotos e mel silvestre”.
Eram muitos os que vinham ter com João, confessavam os seus pecados e recebiam o batismo daas suas mãos.
O conteúdo da pregação coloca João como o arauto, da primeira leitura, que vai à frente a anunciar: “Eis o vosso Deus. O Senhor Deus vem com poder, o seu braço dominará. Com Ele vem o seu prémio, precede-O a sua recompensa”. Ele não se anuncia a si, mas a outro que “é mais forte do que eu, diante do qual eu não sou digno de me inclinar para desatar as correias das suas sandálias”. E que tem um batismo no Espírito Santo.
Meditação da Palavra
Israel, povo de Deus, revela na sua história a experiência que podemos perceber nos homens de todos os tempos, também em nós. A autosuficiência, a confiança em si mesmo e nas próprias capacidades afasta frequentemente de Deus e leva o homem tão longe que acaba sozinho, com sentimentos de solidão e abandono. Perdido de Deus, longe da sua voz, não encontra forma de vencer as montanhas que se elevam diante dos seus olhos nem forças para enfrentar o deserto que o separa de Deus. Se não for o próprio Deus a vir, se não for ele a falar ao coração do homem, como o esposo abandonado que, levado pelo amor, faz tudo para atrair o coração da esposa, não regressa nunca.
É esta a experiência que Isaías conta no texto da primeira leitura. Estar longe de Deus representa um sofrimento demasiado pesado para o homem. Até Deus reconhece que se trata de um “duplo castigo”. As forças que conduzem o homem para longe de Deus são insuficientes para o fazerem regressar e parece impossível que Deus se compadeça do homem pecador. No entanto, Deus “não quer que ninguém pereça, mas que todos possam arrepender-se”. Por isso, o próprio Deus manda anunciar em alta voz ao seu povo que “terminaram os seus trabalhos e está perdoada a sua culpa”.
O mensageiro de Deus, anuncia a chegada do Senhor, “eis o vosso Deus. O Senhor Deus vem com poder” e abre um caminho no deserto “endireitem-se os caminhos tortuosos e aplanem-se as veredas escarpadas”.O Senhor vai manifestar a sua glória trazendo o seu povo do exílio, como fazem os reis vitoriosos depois da batalha e como o pastor que conduz as ovelhas ao descanso.
Esta é a promessa que se cumpre em muitos momentos da história deste povo que o Senhor escolheu para si. Deus não abandona o seu povo, nem no Egito nem em Babilónia nem em circunstância alguma. Não o fez ontem e não o fará hoje, como como é convicção do salmo 84, “a salvação está perto”, porque o Senhor não fica indignado para sempre nem prolonga pelos séculos o furor provocado pelo pecado do seu povo.
Pode demorar, como muito bem recorda Pedro na sua segunda carta. Mas a sua demora não é tempo inútil, não é estéril o seu silêncio. O tempo de espera é tempo de Deus, é tempo da sua ação em favor do homem, para que “todos possam arrepender-se”. Assim deve ser aproveitado por todos, como afirma Pedro ao dizer “enquanto esperais tudo isto, empenhai-vos, sem pecado nem motivo algum de censura”. Alguns pensam que a demora do Senhor significa o fim de todas as promessas, mas os que creem empenham-se porque têm consciência que “deve ser santa a vossa vida e grande a vossa piedade, esperando e apressando a vinda do dia de Deus”.
É este o desafio que é apresentado por Marcos no início do Evangelho. Para ele, Jesus é o Cristo, o Filho de Deus. O conteúdo do evangelho é a pessoa do Jesus. O crente é chamado a fazer do evangelho o caminho que leva à fé em Jesus, reconhecendo nele o Messias, o Filho de Deus anunciado por João no deserto do Jordão.
Para acolher Cristo na fé é necessário converter-se através da escuta da palavra, o reconhecimento do pecado, o arrependimento e o batismo. Trata-se de um caminho espiritual aberto no deserto interior de cada homem. Esta experiência espiritual trouxe a João multidões de homens e mulheres que procuravam uma nova vida nas águas do Jordão. Mas João é apenas o arauto, não se anuncia a si mesmo, mas aquele que é o centro do evangelho, Jesus, o Filho de Deus.
Diante de nós está, hoje, Jesus com a proposta do seu evangelho que levou muitos a dizer “este é verdadeiramente o Filho de Deus” e com o batismo no Espírito Santo para o verdadeiro perdão dos pecados. Muitos fizeram este caminho espiritual e encontraram em Jesus a resposta. Nós também podemos fazer a mesma descoberta, porque também nós esperamos o cumprimento da promessa do Senhor.
Pode ser difícil porque implica uma mudança de mentalidade, uma conversão total de nós mesmos, o início de uma vida nova, mas é possível porque nos guia o próprio Jesus, vencedor de todos os obstáculos que impedem o encontro do homem com Deus. Então, não por nós, mas porque o Senhor é fiel às suas promessas, fala ao nosso coração, quer a nossa salvação, faz germinar da terra a fidelidade, dá-nos tudo o que é bom, será possível.
Empenhemo-nos, portanto, enquanto vamos a caminho, “sem pecado nem motivo algum de censura, para que o Senhor vos encontre na paz”.
Rezar a Palavra
Vinde, Senhor, caminhai à nossa frente neste deserto de espera, neste tempo incerto em que aguardamos a renovação de todas as coisas no fogo do vosso Espírito. Fazei ouvir a voz do arauto para renovarmos a esperança nas vossas promessas e enchei-nos dos bens necessários para aguardarmos em santidade e justiça a vinda do salvador do mundo.
Compromisso semanal
Dedico-me a rever a minha vida, para realizar uma verdadeira conversão interior, para viver em santidade e justiça todos os dias da minha vida.