Mistagogia da Palavra
Neste domingo começa o tempo do Advento, momento forte do ritmo cristão e do ano litúrgico. É a preparação imediata do Natal. Velando em oração, colocamo-nos, pela fé, entre a celebração litúrgica da primeira vinda do Senhor, já realizada, e a esperança da sua vinda definitiva; mas, em atitude dinâmica, trabalhando pelo Reino de Deus neste tempo de graça que é o presente, o agora. Na verdade, o “hoje” da salvação constitui também um perene advento ou vinda do Senhor nos acontecimentos pessoais, familiares, eclesiais e sociais de cada dia.
A 1ª leitura é do profeta Isaías. É uma queixa colectiva repassada de esperança. Nela se reconhece que a triste situação do povo é o justo castigo dos seus pecados. Reconhece-se que é impossível voltar para Deus, se o próprio Deus não tomar a iniciativa. Daí a comovente e confiante súplica a Deus para que volte, e volte como pai e redentor.
A 2ª leitura é da Primeira Epístola de S. Paulo aos Coríntios. Chamados por Deus a participar da vida de Cristo, Filho de Deus, incorporados n’Ele como seus membros, fomos enriquecidos de todos os dons. Mas a nossa fé, para se manter sólida e a nossa vida para se tornar irrepreensível exigem uma atitude de combate. A fidelidade de Deus está assegurada.
O Evangelho é segundo S. Marcos. Da parábola do porteiro, que pertence ao grupo das parábolas da última vinda de Jesus, conclui-se que a nossa vigilância tem de ser activa e constante, porque não conhecemos o momento da vinda do Senhor. É o único meio de vencer a sonolência e o cansaço que nos invadem durante o tempo de espera.
A Palavra do Evangelho
Diante da Palavra
Vem, Espírito Santo, afina os meus ouvidos para que escute de novo a Palavra do Senhor e me deixe surpreender!
Evangelho Mc 13, 33-37
Naquele tempo, disse Jesus aos seus discípulos: «Acautelai-vos e vigiai, porque não sabeis quando chegará o momento. Será como um homem que partiu de viagem: ao deixar a sua casa, deu plenos poderes aos seus servos, atribuindo a cada um a sua tarefa, e mandou ao porteiro que vigiasse. Vigiai, portanto, visto que não sabeis quando virá o dono da casa: se à tarde, se à meia-noite, se ao cantar do galo, se de manhãzinha; não se dê o caso que, vindo inesperadamente, vos encontre a dormir. O que vos digo a vós, digo-o a todos: Vigiai!».
Caros amigos e amigas, o breve Evangelho de hoje repete insistentemente o apelo à vigilância, para que ninguém perca o encontro com Aquele que vem para nos salvar.
Interpelações da Palavra
Não sabeis quando…
É verdade que nada ficou agendado para o seu regresso, mas tudo na casa fala ainda dele, cada esquina lembra um evento, respira-se ainda o eco das suas palavras e o perfume dos seus gestos, recordam-se com saudades os momentos de amor. Agora, espera-se com renovada esperança o seu regresso. O desejo de sentir novamente o seu bater à porta acompanha cada instante. O coração está vigilante mesmo quando os sonhos descansam. Para o amante cada momento, à tarde, à meia-noite, de manhãzinha, é sempre tempo de encontro com o Senhor.
Maravilhosa aventura de um Deus que vem ao nosso encontro e que inesperadamente nos surpreende, porque vem junto a nós não como o tínhamos pensado, planificado, acreditado, esperado. Ele é o Deus das surpresas que nos maravilha sempre com a criatividade do amor.
O amor nunca tem sono!
O perigo é o de uma vida adormecida e anestesiada, distraída e anónima, diluída e esquecida. Uma existência incapaz de encanto e de esperança. Adormece quem não espera nada, quem deixou de sonhar, de perscrutar o horizonte e de se maravilhar por um olhar. Adormece quem não caminha, não se empenha em entender o mundo e a história. Adormecem os discípulos no horto das oliveiras, incapazes de acompanhar o Amor até ao calvário.
Não nos perdoaremos por ter perdido justamente aquele momento de Céu para o qual nascemos, porque os passos de Deus são inesperados tal como é surpreendente o amor, a sua vinda é pontual como é preciso o amor, o seu regresso é certo como cuidadoso é o amor. Na verdade, o amor nunca dorme! E aos adormecidos repete: “Levanta-te, tu que dormes, ressuscita, tu que estás morto, e Cristo brilhará sobre ti” (Efésios 5, 14).
Vigiai! Vigiai! Vigiai!
O Mestre convida para esta apaixonada espera porque esperar é essencialmente amar! Vigiar é olhar em frente, perscrutar a noite, espiar a aurora, espreitar o que nasce, velar os segredos da vida, cuidar das sementes de luz e ressurreição, porque a noite não é a última palavra. Estar alerta, vigilante aos adventos desta terra, é antecipar as sementes de luz, aguardar com júbilo os encontros que nos esperam, é estar atento aos silêncios e aos gritos dos outros, aos sorrisos e às ofertas, às lágrimas e às profecias, às carícias e às primaveras, que constantemente fazem o Criador bater à nossa porta.
Somos convidados a estar alertas na grande noite do mundo como sentinelas do amor. Somos convidados a olhar o futuro que vem ao nosso encontro, a esperar o amigo e esposo que nos faz palpitar o coração, na certeza que um mundo novo está em germinação. Por isso, caro amigo e cara amiga, abre os olhos e vê, abre os ouvidos e escuta, abre o coração e ama, fica acordado e ressuscita! E espera o milagre, silencioso e constante, que diariamente te desperta. Assim, preparas o advento do Evangelho!
Rezar a Palavra e contemplar o Mistério
A Bondade é como uma gota de água no deserto dos afectos.
Ela rega a nossa capacidade de amar e leva ao coração dos outros as notícias da presença de Deus.
Senhor, abres-nos este tempo de graça em que nos pedes para subir ao teu “monte” para o encontro contigo.
Hoje convidas-nos a vigiar, a não deixar que a camada da rotina
esconda o fulgor da surpresa sempre nova e ardente da tua presença nas nossas vidas.
Senhor, que a tua Bondade encha de ternura e generosidade as nossas vidas!
Viver a Palavra
Vou criar um mealheiro para depois socorrer os mais pobres.