Não resisti nem recuei um passo

O povo sai à rua. Talvez por tradição, levados pela onda do que sempre se fez, talvez envergonhados por não saber como o mundo acolhe tamanho atrevimento. Entre cânticos e palmas escondem-se e revelam-se rostos nunca imaginados, de luz e de sombra.
Adivinha-se o comentário do primeiro dia de trabalho entre os colegas que saíram à rua e os que ficaram na praça. “Também és um deles?“
De rosto erguido, sentado num jumento, orgulhoso das crianças, dos jovens, da multidão anónima que, hoje, percorre as ruas do mundo, vai Jesus. Até podem ser envergonhados os Hossanas, mas são sobretudo os lábios tímidos que os pronunciam que importa. Amanhã talvez haja coragem para dizer “verdadeiramente este homem era Filho de Deus”.

LEITURA I Is 50, 4-7

O Senhor deu-me a graça de falar como um discípulo, para que eu saiba dizer uma palavra de alento aos que andam abatidos. Todas as manhãs Ele desperta os meus ouvidos, para eu escutar, como escutam os discípulos. O Senhor Deus abriu-me os ouvidos, e eu não resisti nem recuei um passo. Apresentei as costas àqueles que me batiam e a face aos que me arrancavam a barba; não desviei o meu rosto dos que me insultavam e cuspiam. Mas o Senhor Deus veio em meu auxílio, e, por isso, não fiquei envergonhado; tornei o meu rosto duro como pedra, e sei que não ficarei desiludido.

Aplicada a Jesus, esta palavra de Isaías ganha contornos de Páscoa. Jesus é aquele que melhor escuta a Palavra e mais eficazmente se dispõe a transmiti-la como alento aos abatidos. A sua própria vida se torna palavra porque não cede diante do sofrimento nem diante da injustiça com que é julgado.

Salmo responsorial Salmo 21 (22), 8-9.17-18a.19-20.23-24 (R. 2a)
Experimentando o drama existencial, o salmista, como o servo de Javé, sente-se ameaçado por inimigos que não conhecemos, dos quais se quer livrar e suplica o auxílio de Deus. Ainda não está livre das ameaças com que o atacam e já vê o dia em que poderá dar graças a Deus pela sua libertação.

LEITURA II Flp 2, 6-11

Cristo Jesus, que era de condição divina, não Se valeu da sua igualdade com Deus, mas aniquilou-Se a Si próprio. Assumindo a condição de servo, tornou-Se semelhante aos homens. Aparecendo como homem, humilhou-Se ainda mais, obedecendo até à morte e morte de cruz. Por isso Deus O exaltou e Lhe deu um nome que está acima de todos os nomes, para que ao nome de Jesus todos se ajoelhem no céu, na terra e nos abismos, e toda a língua proclame que Jesus Cristo é o Senhor, para glória de Deus Pai.

Paulo desafio os batizados a adquirir os mesmos sentimentos que se encontram em Cristo. Para os que se consideram mais importantes e sábios que os outros e estabelecem termos de comparação a partir da ideia de superioridade, o exemplo de Cristo que se aniquilou, humilhou e obedeceu até a morte, é inspirador para uma vida cristã.

EVANGELHO – Forma longa Mt 26, 14 – 27, 66

N Evangelho de nosso Senhor Jesus Cristo
segundo são Mateus
Naquele tempo,
um dos Doze, chamado Judas Iscariotes,
foi ter com os príncipes dos sacerdotes e disse-lhes:
R «Que estais dispostos a dar-me para vos entregar Jesus?».
N Eles garantiram-lhe trinta moedas de prata.
E a partir de então,
Judas procurava uma oportunidade para O entregar.
No primeiro dia dos Ázimos,
os discípulos foram ter com Jesus e perguntaram-Lhe:
R «Onde queres que façamos os preparativos
para comer a Páscoa?».
N Ele respondeu:
J «Ide à cidade, a casa de tal pessoa, e dizei-lhe:
‘O Mestre manda dizer: O meu tempo está próximo.
É em tua casa que Eu quero celebrar a Páscoa
com os meus discípulos’».
N Os discípulos fizeram como Jesus lhes tinha mandado
e prepararam a Páscoa.
Ao cair da noite, sentou-Se à mesa com os Doze.
Enquanto comiam, declarou:
J «Em verdade vos digo:
Um de vós há de entregar-Me».
N Profundamente entristecidos,
começou cada um a perguntar-Lhe:
R «Serei eu, Senhor?».
N Jesus respondeu:
J «Aquele que meteu comigo a mão no prato
é que há de entregar-Me.
O Filho do homem vai partir,
como está escrito acerca d’Ele.
Mas ai daquele
por quem o Filho do homem vai ser entregue!
Melhor seria para esse homem não ter nascido».
N Judas, que O ia entregar,
tomou a palavra e perguntou:
R «Serei eu, Mestre?».
N Respondeu Jesus:
J «Tu o disseste».
N Enquanto comiam,
Jesus tomou o pão, recitou a bênção,
partiu-o e deu-o aos discípulos, dizendo:
J «Tomai e comei: Isto é o meu corpo».
N Tomou em seguida um cálice,
deu graças e entregou-lho, dizendo:
J «Bebei dele todos,
porque este é o meu sangue, o sangue da aliança,
derramado pela multidão,
para remissão dos pecados.
Eu vos digo que não beberei mais deste fruto da videira,
até ao dia em que beberei convosco
o vinho novo no reino de meu Pai».
N Cantaram os salmos
e seguiram para o monte das Oliveiras.
N Então, Jesus disse-lhes:
J «Todos vós, esta noite, vos escandalizareis por minha causa,
como está escrito:
‘Ferirei o pastor. e dispersar-se-ão as ovelhas do rebanho’.
Mas, depois de ressuscitar,
preceder-vos-ei a caminho da Galileia».
N Pedro interveio, dizendo:
R «Ainda que todos se escandalizem por tua causa,
eu não me escandalizarei».
N Jesus respondeu-lhe:
J «Em verdade te digo:
Esta mesma noite, antes de o galo cantar,
Me negarás três vezes».
N Pedro disse-lhe:
R «Ainda que tenha de morrer contigo, não Te negarei».
N E o mesmo disseram todos os discípulos.
Então, Jesus chegou com eles a uma propriedade,
chamada Getsémani,
e disse aos discípulos:
J «Ficai aqui, enquanto Eu vou além orar».
N E, tomando consigo Pedro e os dois filhos de Zebedeu,
começou a entristecer-Se e a angustiar-Se.
Disse-lhes então:
J «A minha alma está numa tristeza de morte.
Ficai aqui e vigiai comigo».
N E, adiantando-Se um pouco mais, caiu com o rosto por terra,
enquanto orava e dizia:
J «Meu Pai, se é possível, passe de Mim este cálice.
Todavia, não se faça como Eu quero,
mas como Tu queres».
N Depois, foi ter com os discípulos,
encontrou-os a dormir e disse a Pedro:
J «Nem sequer pudestes vigiar uma hora comigo!
Vigiai e orai, para não cairdes em tentação.
O espírito está pronto, mas a carne é fraca».
N De novo Se afastou, pela segunda vez, e orou, dizendo:
J «Meu Pai, se este cálice não pode passar sem que Eu o beba,
faça-se a tua vontade».
N Voltou novamente e encontrou-os a dormir,
pois os seus olhos estavam pesados de sono.
Deixou-os e foi de novo orar, pela terceira vez,
repetindo as mesmas palavras.
Veio então ao encontro dos discípulos e disse-lhes:
J «Dormi agora e descansai.
Chegou a hora em que o Filho do homem
vai ser entregue às mãos dos pecadores.
Levantai-vos, vamos.
Aproxima-se aquele que Me vai entregar».
N Ainda Jesus estava a falar,
quando chegou Judas, um dos Doze,
e com ele uma grande multidão, com espadas e varapaus,
enviada pelos príncipes dos sacerdotes
e pelos anciãos do povo.
O traidor tinha-lhes dado este sinal:
R «Aquele que eu beijar, é esse mesmo. Prendei-O».
N Aproximou-se imediatamente de Jesus e disse-Lhe:
R «Salve, Mestre!».
N E beijou-O.
Jesus respondeu- lhe:
J «Amigo, a que vieste?».
N Então avançaram, deitaram as mãos a Jesus
e prenderam-n’O.
Um dos que estavam com Jesus levou a mão à espada,
desembainhou-a e feriu um servo do sumo sacerdote,
cortando-lhe uma orelha.
Jesus disse-lhe:
J «Mete a tua espada na bainha,
pois todos os que puxarem da espada morrerão à espada.
Pensas que não posso rogar a meu Pai
que ponha já ao meu dispor mais de doze legiões de Anjos?
Mas como se cumpririam as Escrituras,
segundo as quais assim tem de acontecer?».
N Voltando-Se depois para a multidão, Jesus disse:
J «Viestes com espadas e varapaus para Me prender
como se fosse um salteador!
Eu estava todos os dias sentado no templo a ensinar
e não Me prendestes …
Mas, tudo isto aconteceu
para se cumprirem as Escrituras dos profetas».
N Então todos os discípulos O abandonaram e fugiram.
N Os que tinham prendido Jesus
levaram-n’O à presença do sumo sacerdote Caifás,
onde os escribas e os anciãos se tinham reunido.
Pedro foi-O seguindo de longe,
até ao palácio do sumo sacerdote.
Aproximando-se, entrou e sentou-se com os guardas,
para ver como acabaria tudo aquilo.
Entretanto, os príncipes dos sacerdotes e todo o Sinédrio
procuravam um testemunho falso contra Jesus
para O condenarem à morte,
mas não o encontravam,
embora se tivessem apresentado muitas testemunhas falsas.
Por fim, apresentaram-se duas que disseram:
R «Este homem afirmou:
‘Posso destruir o templo de Deus
e reconstruí-lo em três dias’».
N Então o sumo sacerdote levantou-se e disse a Jesus:
R «Não respondes nada?
Que dizes ao que depõem contra Ti?».
N Mas Jesus continuava calado.
Disse-Lhe o sumo sacerdote:
R «Eu Te conjuro pelo Deus vivo,
que nos declares se és Tu o Messias, o Filho de Deus».
N Jesus respondeu-lhe:
J «Tu o disseste.
E Eu digo-vos:
vereis o Filho do homem
sentado à direita do Todo-poderoso,
vindo sobre as nuvens do céu».
N Então o sumo sacerdote rasgou as vestes, dizendo:
R «Blasfemou.
Que necessidade temos de mais testemunhas?
Acabais de ouvir a blasfémia. Que vos parece?».
N Eles responderam:
R «É réu de morte».
N Cuspiram-Lhe então no rosto e deram-Lhe punhadas.
Outros esbofeteavam-n’O, dizendo:
R «Adivinha, Messias: quem foi que Te bateu?».
N Entretanto, Pedro estava sentado no pátio.
Uma criada aproximou-se dele e disse-lhe:
R «Tu também estavas com Jesus, o galileu».
N Mas ele negou diante de todos, dizendo:
R «Não sei o que dizes».
N Dirigindo-se para a porta,
foi visto por outra criada que disse aos circunstantes:
R «Este homem estava com Jesus de Nazaré».
N E, de novo, ele negou com juramento:
R «Não conheço tal homem».
N Pouco depois, aproximaram-se os que ali estavam
e disseram a Pedro:
R «Com certeza tu és deles, pois até a fala te denuncia».
N Começou então a dizer imprecações e a jurar:
R «Não conheço tal homem».
N E, imediatamente, um galo cantou.
Então, Pedro lembrou-se das palavras que Jesus dissera:
«Antes de o galo cantar, tu Me negarás três vezes».
E, saindo, chorou amargamente.
Ao romper da manhã,
todos os príncipes dos sacerdotes e os anciãos do povo
se reuniram em conselho contra Jesus,
para Lhe darem a morte.
Depois de Lhe atarem as mãos,
levaram-n’O e entregaram-n’O ao governador Pilatos.
Então Judas, que entregara Jesus,
vendo que Ele tinha sido condenado,
tocado pelo remorso, devolveu as trinta moedas de prata
aos príncipes dos sacerdotes e aos anciãos, dizendo:
R «Pequei, entregando sangue inocente».
N Mas eles replicaram:
R «Que nos importa? É lá contigo».
N Então arremessou as moedas para o santuário,
saiu dali e foi-se enforcar.
Mas os príncipes dos sacerdotes
apanharam as moedas e disseram:
R «Não se podem lançar no tesouro,
porque são preço de sangue».
N E, depois de terem deliberado,
compraram com elas o Campo do Oleiro,
que servia para a sepultura dos estrangeiros.
Por este motivo se tem chamado àquele campo,
até ao dia de hoje, «Campo de Sangue».
Cumpriu-se então o que fora dito pelo profeta:
«Tomaram trinta moedas de prata,
preço em que foi avaliado
Aquele que os filhos de Israel avaliaram,
e deram-nas pelo Campo do Oleiro,
como o Senhor me tinha ordenado».
N Entretanto, Jesus foi levado à presença do governador,
que Lhe perguntou:
R «Tu és o rei dos judeus?».
N Jesus respondeu:
J «É como dizes».
N Mas, ao ser acusado pelos príncipes dos sacerdotes
e pelos anciãos, nada respondeu.
Disse-Lhe então Pilatos:
R «Não ouves quantas acusações levantam contra Ti?».
N Mas Jesus não respondeu coisa alguma,
a ponto de o governador ficar muito admirado.
Ora, pela festa da Páscoa,
o governador costumava soltar um preso,
à escolha do povo.
Nessa altura, havia um preso famoso, chamado Barrabás.
E, quando eles se reuniram, disse-lhes Pilatos:
R «Qual quereis que vos solte?
Barrabás, ou Jesus, chamado Cristo?».
N Ele bem sabia que O tinham entregado por inveja.
Enquanto estava sentado no tribunal,
a mulher mandou-lhe dizer:
R «Não te prendas com a causa desse justo,
pois hoje sofri muito em sonhos por causa d’Ele».
N Entretanto, os príncipes dos sacerdotes e os anciãos
persuadiram a multidão a que pedisse Barrabás
e fizesse morrer Jesus.
O governador tomou a palavra e perguntou-lhes:
R «Qual dos dois quereis que vos solte?».
N Eles responderam:
R «Barrabás».
N Disse-lhes Pilatos:
R «E que hei de fazer de Jesus, chamado Cristo?».
N Responderam todos:
R «Seja crucificado».
N Pilatos insistiu:
R «Que mal fez Ele?».
N Mas eles gritavam cada vez mais:
R «Seja crucificado».
N Pilatos, vendo que não conseguia nada
e aumentava o tumulto,
mandou vir água
e lavou as mãos na presença da multidão, dizendo:
R «Estou inocente do sangue deste homem.
Isso é lá convosco».
N E todo o povo respondeu:
R «O seu sangue caia sobre nós e sobre os nossos filhos».
N Soltou-lhes então Barrabás.
E, depois de ter mandado açoitar Jesus,
entregou-lh’O para ser crucificado.
Então os soldados do governador
levaram Jesus para o pretório
e reuniram à volta d’Ele toda a coorte.
Tiraram-Lhe a roupa
e envolveram-n’O num manto vermelho.
Teceram uma coroa de espinhos e puseram-Lha na cabeça
e colocaram uma cana na sua mão direita.
Ajoelhando diante d’Ele, escarneciam-n’O, dizendo:
R «Salve, rei dos judeus!».
N Depois, cuspiam-Lhe no rosto
e, pegando na cana, batiam-Lhe com ela na cabeça.
Depois de O terem escarnecido,
tiraram-Lhe o manto, vestiram-Lhe as suas roupas
e levaram-n’O para ser crucificado.
N Ao saírem,
encontraram um homem de Cirene, chamado Simão,
e requisitaram-no para levar a cruz de Jesus.
Chegados a um lugar chamado Gólgota,
que quer dizer lugar do Calvário,
deram-Lhe a beber vinho misturado com fel.
Mas Jesus, depois de o provar, não quis beber.
Depois de O terem crucificado,
repartiram entre si as suas vestes, tirando-as à sorte,
e ficaram ali sentados a guardá-l’O.
Por cima da sua cabeça puseram um letreiro,
indicando a causa da sua condenação:
«Este é Jesus, o rei dos judeus».
Foram crucificados com Ele dois salteadores,
um à direita e outro à esquerda.
Os que passavam insultavam-n’O
e abanavam a cabeça, dizendo:
R «Tu, que destruías o templo e o reedificavas em três dias,
salva-Te a Ti mesmo;
se és Filho de Deus, desce da cruz».
N Os príncipes dos sacerdotes,
juntamente com os escribas e os anciãos,
também troçavam d’Ele, dizendo:
R «Salvou os outros e não pode salvar-Se a Si mesmo!
Se é o rei de Israel,
desça agora da cruz e acreditaremos n’Ele.
Confiou em Deus:
Ele que O livre agora, se O ama,
porque disse: ‘Eu sou Filho de Deus’».
N Até os salteadores crucificados com Ele O insultavam.
Desde o meio-dia até às três horas da tarde,
as trevas envolveram toda a terra.
E, pelas três horas da tarde, Jesus clamou com voz forte:
J «Eli, Eli, lemá sabactáni?»,
N que quer dizer:
«Meu Deus, meu Deus, porque Me abandonastes?».
Alguns dos presentes, ouvindo isto, disseram:
R «Está a chamar por Elias».
N Um deles correu a tomar uma esponja,
embebeu-a em vinagre,
pô-la na ponta duma cana e deu-Lhe a beber.
Mas os outros disseram:
R «Deixa lá. Vejamos se Elias vem salvá-l’O».
N E Jesus, clamando outra vez com voz forte, expirou.
N Então, o véu do templo rasgou-se em duas partes,
de alto a baixo;
a terra tremeu e as rochas fenderam-se.
Abriram-se os túmulos,
e muitos dos corpos de santos que tinham morrido
ressuscitaram;
e, saindo do sepulcro, depois da ressurreição de Jesus,
entraram na cidade santa e apareceram a muitos.
Entretanto, o centurião e os que com ele guardavam Jesus,
ao verem o tremor de terra e o que estava a acontecer,
ficaram aterrados e disseram:
R «Este era verdadeiramente Filho de Deus».
N Estavam ali, a observar de longe, muitas mulheres
que tinham seguido Jesus desde a Galileia, para O servirem.
Entre elas encontrava-se Maria Madalena,
Maria, mãe de Tiago e de José,
e a mãe dos filhos de Zebedeu.
Ao cair da tarde,
veio um homem rico de Arimateia, chamado José,
que também se tinha tornado discípulo de Jesus.
Foi ter com Pilatos e pediu-lhe o corpo de Jesus.
E Pilatos ordenou que lho entregassem.
José tomou o corpo, envolveu-o num lençol limpo
e depositou-o no seu sepulcro novo,
que tinha mandado escavar na rocha.
Depois rolou uma grande pedra para a entrada do sepulcro
e retirou-se.
Entretanto, estavam ali Maria Madalena e a outra Maria,
sentadas em frente do sepulcro.
No dia seguinte, isto é, depois da Preparação,
os príncipes dos sacerdotes e os fariseus
foram ter com Pilatos e disseram-lhe:
R «Senhor, lembrámo-nos do que aquele impostor disse
quando ainda era vivo:
‘Depois de três dias ressuscitarei’.
Por isso, manda que o sepulcro seja mantido em segurança
até ao terceiro dia,
para que não venham os discípulos roubá-lo
e dizer ao povo: ‘Ressuscitou dos mortos’.
E a última impostura seria pior do que a primeira».
N Pilatos respondeu:
R «Tendes à vossa disposição a guarda:
ide e guardai-o como entenderdes».
N Eles foram e guardaram o sepulcro,
selando a pedra e pondo a guarda.

A paixão revela o coração dos discípulos de Jesus, dos que estão com ele naquele momento dramático da sua vida e dos que hoje escutamos esta narração. Todos podemos ser Judas, qualquer um o pode negar. Permanecer até ao fim exige a disponibilidade para morrer com ele.

Reflexão da Palavra

O texto de Isaías é conhecido como o Terceiro Cântico do servo de Javé e revela o seu sofrimento e a sua confiança. Aqui não se fala de servo, como no Primeiro Cântico, capítulo 42 “Eis o meu servo, que Eu amparo…” e no Segundo Cântico capítulo 49 “Disse-me: “Israel, tu és o meu servo, em ti serei glorificado”, mas todas as referências apontam para ele. Trata-se de um personagem anónimo que, no entanto, se assemelha a um servo. Aparece com sinais de profeta, escuta e anuncia a palavra, experimenta o sofrimento por causa dessa palavra e mantém a confiança no Senhor, apesar de ser maltratado, como acontece com os profetas, embora o texto não diga que é profeta.
Moldado pela palavra, aprende a escutar e a falar como os profetas. Não se opõe nem à palavra nem aos sofrimentos por causa dela, pois encontra no Senhor a sua fortaleza, a sua defesa e confiança, de tal modo que não sente os ultrajes nem a injustiça das calúnias que recaem sobre ele.
Neste servo a tradição vê decalcado o mistério de Cristo na sua paixão.
O Salmo 21 é um salmo de súplica individual. Pode ver-se nas palavras do salmista a experiência amarga do sofrimento, causado por uma situação dramática que ele não refere. Não consta que o sofrimento seja causado pelo pecado pessoal pois não se manifesta culpado, mas também não manifesta desejos de vingança nem de justiça para com os inimigos.
O drama vivido exige urgência na salvação, daí a intensidade das palavras do salmista “Matilhas de cães me rodearam, cercou-me um bando de malfeitores. Trespassaram as minhas mãos e os meus pés”. Apesar do sofrimento o autor tem os olhos e o coração fixos no momento da ação de graças. A confiança no Senhor leva-o a manifestar a sua gratidão de forma exagerada. A salvação que espera é para ele, mas a sua ação de graças vai envolver “todos os filhos de Israel” numa confissão de fé pública “hei-de falar do vosso nome aos meus irmãos, hei de louvar-Vos no meio da assembleia”.
Os elementos com que descreve a situação de sofrimento, levam facilmente até à paixão de Cristo “trespassaram as minhas mãos”, “repartiram entre si as minhas vestes e deitaram sortes sobre a minha túnica”, mas particularmente o desabafo com que dá início ao salmo “Meu Deus, meu Deus, porque me abandonaste”, que os evangelistas colocam na boca de Jesus crucificado.
O texto da carta aos filipenses, tirado do capítulo segundo, é um hino anterior a Paulo, provavelmente presente nas catequeses de Pedro, e que o autor da carta insere aqui neste lugar. Paulo desafia os filipenses à humildade, ao despojamento, ao desprendimento e altruísmo e tem em Cristo o melhor exemplo a seguir.
Cristo faz o caminho contrário de Adão. Este, sendo homem, na tentativa de ser como Deus encontra a morte. Jesus sendo Deus, “aniquilou-Se a Si próprio” e, por isso “Deus O exaltou e Lhe deu um nome que está acima de todos os nomes”. Esta é a proposta de Paulo para todo o cristão, por isso diz no versículo cinco, “tende entre vós os mesmos sentimentos, que estão em Cristo Jesus”.
Mateus apresenta o mistério da Páscoa de Jesus em sete quadros. O primeiro deles é constituído por três cenas, a decisão de matar Jesus, a unção dos pés de Jesus com perfume e o plano de Judas para o entregar.
A narração da paixão, que se lê neste domingo, tem início com a última cena do primeiro quadro colocando Judas em negociações com os sacerdotes. Esta situação revela a distância de Judas em relação a Jesus, sobretudo depois da manifestação de amor daquela mulher anónima que unge os pés de Jesus com perfume.
No segundo quadro percebe-se que Jesus tem o seu destino nas mãos. Sabe o que lhe vai acontecer e é ele quem determina o quê, o como, o quando e o onde. Depois da preparação da Páscoa Jesus senta-se à mesa com os discípulos. Tudo começa “ao cair da noite” e “enquanto comiam”, Jesus denuncia que o vão entregar e dá um novo significado ao pão e ao vinho que repartem entre eles. Mateus não tem dúvidas de que o traidor é Judas, Jesus também não duvida, já os discípulos questionam-se porque, na verdade, qualquer um pode trair Jesus, mas nenhum pode impedir que se cumpra o plano de Deus.
O plano de Deus passa pela entrega de Jesus. O corpo entregue e o sangue derramado, aparece na sequência da traição, mostrando que, da parte de Deus, tudo será feito como previsto. Da parte dos homens tudo acontece de acordo com a sua liberdade de aceitar ou rejeitar Jesus. O corpo é entregue e o sangue derramado “por muitos” e “para remissão dos pecados”.
O terceiro quadro desenrola-se no jardim das oliveiras. Jesus anuncia uma vez mais a sua paixão e volta a deixar claro que não será o fim, pois ressuscitará. Ele domina a situação porque sabe o que vai acontecer. Os doze vão dormir na hora de maior angústia, todos o vão abandonar na hora das trevas, Pedro vai negá-lo, mas continuarão a ser discípulos.
A hora é de angústia e de confiança como revela a sua oração “Meu Pai, se é possível, passe de Mim este cálice. Todavia, não se faça como Eu quero, mas como Tu queres”, numa referência clara ao que ensinou aos discípulos “seja feita a vossa vontade”. Aos discípulos recorda-lhes a necessidade de rezar e vigiar “para não cairdes em tentação”.
No final do terceiro quadro chega Judas com os soldados. Para Judas, Jesus é Rabi, Mestre, mas para Jesus, Judas é amigo. A resistência de Jesus a toda a espécie de violência é a sua forma de estar e de permitir que os homens decidam melhor o que estão a tramar, porque, para se cumprir o plano de Deus não é necessária a morte, a decisão está nas mãos dos homens.
O quadro seguinte revela a ilegalidade do processo com que Jesus é julgado. A forma que reveste o julgamento manifesta a intenção clara de o condenar mesmo sem culpa. Mateus preocupa-se apenas com revelar quem é Jesus, por isso, apenas responde à pergunta mais importante “és o Messias, o Filho de Deus?”. Pelo meio aparece a negação de Pedro e o arrependimento de Judas.
No quinto quadro, Jesus está diante de Pilatos e o evangelista mantém a mesma preocupação e, por isso, Jesus responde apenas à pergunta sobre a sua identidade e o processo continua com a libertação de Barrabás, a flagelação e a coroação de espinhos.
No sexto quadro, o da crucifixão, Mateus não dá muitos pormenores. Indica que Simão de Sirene é chamado a levar a cruz e, no Gólgota, crucificaram Jesus e repartiram as suas vestes enquanto a multidão o injuriava.
A morte de Jesus, pelas três horas da tarde, acontece entre fenómenos como as trevas, o véu do templo rasgado, tremor de terra, a rocha fendida e os mortos a ressuscitar, sinais que se entendem como manifestação de Deus que reage à morte de seu filho, inaugurando uma nova etapa na história da salvação. Entretanto, Mateus fixa a profissão de fé do centurião.
Para a sepultura de Jesus, Mateus chama a tenção para um grupo de mulheres que observam de longe e faz referência às duas Marias que ficaram sentadas junto do sepulcro, eram as mulheres que serviam Jesus e os apóstolos. Tudo o resto é deixado a José de Arimateia que oferece o túmulo e o lençol. No final, o medo das autoridades religiosas impõe uma guarda para prevenir a ressurreição.
O último quadro do evangelho de Mateus narra a ressurreição de Jesus.

Meditação da Palavra

“Nos dias da sua vida terrena, apresentou orações e súplicas àquele que o podia salvar da morte, com grande clamor e lágrimas, e foi atendido por causa da sua piedade”. É com estas palavras que a carta aos hebreus apresenta Cristo, acrescentando ainda que “apesar de ser Filho de Deus, aprendeu a obediência por aquilo que sofreu”.
Quando na celebração do domingo de Ramos se escuta o Cântico do Servo de Javé, percebe-se como a experiência relatada pelo profeta se aplica inteiramente a Cristo e, de algum modo, também a todos os discípulos de Cristo, sempre que estes se decidem a fazer o caminho com ele. De facto, ele é o verdadeiro discípulo, atento a Palavra do Pai, que não se esquiva aos desafios que nela são propostos como plano de Deus para a salvação dos homens. Verdadeiro escutador, ele torna-se também capaz de comunicar, até pelo estilo de vida adquirido, palavras de alento, que significam confiança total em Deus, o único que pode livrar da morte.
Do mesmo modo não oferece resistência aos que, opondo-se à palavra, preferem fazer parte do reino das trevas e avançar de noite, como inimigos da luz, com projetos maquiavélicos que condenam inocentes, convencidos que, eliminando o justo, impedem a realização do plano de Deus para o homem.
Nos sentimentos de Cristo percebe-se que o fundamental da vida não é preservar a carne de toda a agressão nem o sangue de qualquer derramamento, não é guardar incólume o nome da família nem manter a boa fama aos olhos dos importantes, nem pactuar com servilismos que garantem o lugar de prestígio entre os doutores deste mundo. Os sentimentos de Jesus revelam um bem maior que é a dignidade interior de filho de Deus, filiação que se adquire tanto mais profundamente quanto mais se entrega a carne e se derrama o sangue no mistério incompreensível do amor.
O caminho do calvário, que tem início na entrada triunfal em Jerusalém, revela o rosto dos homens que, consciente ou inconscientemente, seguem Jesus e o rosto dos que assistem à sua passagem e, ainda, o rosto dos que espreitam nas janelas ou contemplam dos tronos do poder. Diante de Cristo sentado no jumento, coroado de espinhos, carregando a cruz ou pregado nela até à morte, cada um contempla-se a si mesmo ou na força do amor que faz o discípulo ou na angústia da traição que leva à perdição.
Na cruz não morre o condenado mas os que o condenam, por isso gritam desesperados “desce da cruz” para que o sangue inocente não recaia sobre nós nem sobre as nossas cabeças e podermos ir de consciência mais tranquila para nossas casas.
Apesar de tudo, porque Cristo lhe deu o sentido do amor, a cruz será sempre o lugar da confiança “o Senhor Deus veio em meu auxílio”, “Deus O exaltou e Lhe deu um nome que está acima de todos os nomes”.

Rezar a Palavra

Hossana! Hossana! Messias salvador da humanidade. Hossana! Tu que vens em nome do Senhor para carregar a cruz dos nossos pecados. Que a tua cruz seja a palavra que nos faz discípulos, decididos a entregar a nossa carne e a derramar o nosso sangue pelos que não têm quem se ajoelhe para lhes lavar os pés, nem se incline para lhes beijar o rosto de dor, dos calvários de cada dia. Faz-nos discípulos, escutadores dos teus passos para que também em nossos passos se oiçam palavras de alento e se respire o perfume da entrega.

Compromisso semanal

Há cruzes que se cruzam comigo e posso carrega-las ainda que seja por breves instantes.