Desde o princípio que a Igreja enfrenta dificuldades provocadas quer pelo ambiente cultural exterior, que era hostil, quer por tensões internas porque a abertura aos gentios não se deu sem ultrapassar vários obstáculos, como verificamos nos textos do livro dos Actos dos Apóstolos, e também porque havia medo dos judeus (Evangelho) e de outras autoridades do tempo.
Onde encontrar, então, as forças para ultrapassar as adversidades e levar por diante a obra de Jesus? Hoje, a oposição, tanto externa como interna, pode não ser tão evidente quando era nas origens da Igreja. Mas, é preciso vencer o vazio, o cansaço e o desencanto que parece dominar a cultura actual. Dá a impressão que as pessoas não têm motivações nem estímulos para criar algo de novo ou contribuir para a mudança… Desiludidas, conformam-se com a situação e não acreditam facilmente que possa haver energia e vontade para superar este ambiente de desalento e resignação.
Ora, sempre a Igreja foi conduzida pela força do alto. Como esteve presente no início da vida pública de Jesus, o Espírito também está presente no início da actividade missionária da Igreja (1ª leitura). É este Espírito que é derramado sobre a Igreja na multiplicidade de dons (2ª leitura). Com os dons do Espírito a Igreja luta contra o mal e transforma-se em força viva e libertadora (Evangelho).
1. Todos temos o Espírito
– Todos nós recebemos o Espírito Santo, a força que anima, o alimento que dá vida, o que nos aconselha, que nos defende e nos fortalece, que nos dá sabedoria e inteligência,… E se recebemos tudo isto, é para levar esta luz a todos os que dela precisam…
– Este Espírito que recebemos no nosso Baptismo multiplica-se e expande-se, torna-nos membros de um corpo onde há muitos membros (2ª leitura) e cria unidade na diversidade…
– No princípio, os apóstolos encontravam-se entre o medo e a fidelidade, o temor e a esperança… E é o Espírito que os transforma e os faz sair para a rua, para dar testemunho, em público, de Cristo ressuscitado…
– É assim que nasce a Igreja: pela força do Espírito na pluralidade de dons e tarefas… Com o mesmo Espírito das origens, a Igreja há-de enfrentar os desafios que hoje lhe são apresentados…
2. Deixar-nos conduzir pelo Espírito
– Como descobrir este Espírito na Igreja do séc XXI?
– No princípio da Igreja, todos aqueles que estavam em Jerusalém ficaram admirados porque viram um grupo de pessoas a mudar por completo (1ª leitura) e quando lhe perguntavam o que se havia passado respondiam que tinham recebido “a vida nova de Jesus” e que se tinham deixado levar pelo “seu vento” (discursos dos Actos)…
– O que os Apóstolos fizeram foi começar a viver ao estilo de Jesus… E como é que se pode viver desta maneira no início do terceiro milénio?
Há muitas pessoas que preferem ficar adormecidas, no seu cantinho, com as portas fechadas, sem fazer mal a ninguém e com medo de sair e enfrentar os outros – isto também se passa muito na Igreja! Por isso o Papa Francisco diz que a Igreja “em saída” é uma Igreja com as portas abertas (EG 46). Ele diz que prefere “uma igreja acidentada, ferida e enlameada por ter saído pelas estradas, a uma igreja enferma pelo fechamento e comodidade de se agarrar às próprias seguranças… Mais do que o temor de falhar”, diz ele, “espero que nos mova o medo de nos encerrarmos nas estruturas que nos dão uma falsa protecção, nas normas que nos transformam em juízes implacáveis, nos hábitos em que nos sentimos tranquilos, enquanto lá fora há uma humanidade faminta e Jesus repete-nos sem cessar: ‘dai-lhes vós mesmos de comer’ (Mc 6,37)” (EG 49).
– O Espírito cria a unidade na diversidade (Partos, Medos, Elamitas…). Todos ouviram proclamar as maravilhas de Deus… Nos dias de hoje, a tentação maior continua a ser a de fechar-se em si mesmo, no nosso grupo, com medo,… Pensar que não há nada a fazer…
– O Pentecostes há-de levar-nos a reconhecer que os outros são sempre uma riqueza para a comunidade, tanto os que estão mais próximos como os que estão noutros grupos ou noutros movimentos… É o Espírito que cria a unidade quando os seus dons se manifestam em ordem ao bem comum…
– É o mesmo que desce sobre os apóstolos para que falem todas as línguas, a linguagem universal do amor, ultrapassando raças, ideologias e fronteiras… É o Espírito do diálogo, da partilha das dores, dos sofrimentos e das alegrias de toda a humanidade… – Ao professar hoje, mais uma vez, a nossa fé no Espírito que dá vida, não apaguemos o fogo nem o vento que transformam… Não fechemos as portas do individualismo, mas aceitemos abri-las para acolher a todos ultrapassando as barreiras e os muros da separação que ainda existem, e evitemos construir outros mesmo que pareça haver causas que os justifiquem…