Mistagogia da Palavra

A Páscoa não nos introduz numa fase estática de repouso, mas sim num dinamismo, que brota da vida do Ressuscitado. Baptizados na Morte e Ressurreição de Jesus, começámos a caminhar em novidade de vida. Este nosso caminhar tem a duração da nossa existência e exige de nós esforço, generosidade e sacrifício. Ressuscitados com Cristo temos de levar uma vida de ressuscitados. Por maiores que sejam as dificuldades não podemos desanimar. É que Cristo ressuscitado, vivo eternamente, vai connosco para nos ajudar a sermos fiéis ao Pai e aos homens, nossos irmãos.
A 1ª leitura é do Livro dos Actos dos Apóstolos. Diante dos pagãos, em casa do centurião Cornélio, Pedro anuncia a Cristo. Jesus de Nazaré, homem que viveu como eles, não é um simples homem. Ungido do Espírito Santo, tem a plenitude de Deus em Si. Pela Ressurreição, de que Pedro é testemunha, Jesus de Nazaré é o juiz dos vivos e dos mortos, é o Salvador dos homens, judeus e pagãos.
A 2ª leitura é de S. Paulo aos Coríntios. Com Cristo Ressuscitado começou para o povo de Deus uma vida nova. Por isso, o cristão, deitando fora o fermento antigo (o pecado e a mentira) deve ser “pão ázimo”, liberto de todo o mal, de tal modo que nele transpareça sempre a presença do Espírito.
A 3ª Leitura é do Evangelho de S. João. No seu amor intuitivo, João é o primeiro a compreender os sinais da Ressurreição. Mas bem depressa Pedro descobre a verdade, anunciada tão claramente pela Escritura e pelo mesmo Jesus. Depois, em contacto pessoal com o Ressuscitado, a sua fé torna-se firme como “rocha” inabalável.

A PALAVRA DO EVANGELHO

Diante da Palavra

Vem Espírito Santo, e ensina-me a descobrir que a vida é sempre mais forte do que a morte!

Evangelho segundo S. João 20, 1-9

No primeiro dia da semana, Maria Madalena foi de manhãzinha, ainda escuro, ao sepulcro e viu a pedra retirada do sepulcro. Correu então e foi ter com Simão Pedro e com o outro discípulo que Jesus amava e disse-lhes: «Levaram o Senhor do sepulcro e não sabemos onde O puseram». Pedro partiu com o outro discípulo e foram ambos ao sepulcro. Corriam os dois juntos, mas o outro discípulo antecipou-se, correndo mais depressa do que Pedro, e chegou primeiro ao sepulcro. Debruçando-se, viu as ligaduras no chão, mas não entrou. Entretanto, chegou também Simão Pedro, que o seguira. Entrou no sepulcro e viu as ligaduras no chão e o sudário que tinha estado sobre a cabeça de Jesus, não com as ligaduras, mas enrolado à parte. Entrou também o outro discípulo que chegara primeiro ao sepulcro: viu e acreditou. Na verdade, ainda não tinham entendido a Escritura, segundo a qual Jesus devia ressuscitar dos mortos.

Caros amigos e amigas, o evangelho narra o grande acontecimento da Ressurreição de Jesus. É a sua Páscoa, é a nossa Páscoa. Por isso, tal como o discípulo amado, vamos também nós «ver» para «acreditar».

Interpelações da Palavra

Apenas uma mulher e dois discípulos como testemunhas

O evangelho diz que o novo dia já tinha começado – era o primeiro da semana -, mas, na cabeça de Maria Madalena e dos outros discípulos e apóstolos, a experiência do fracasso pairava como escuridão intransponível – ainda era escuro. Só muito lentamente eles foram percebendo que as ligaduras estendidas no chão não estavam lá para cobrir um cadáver, mas para acolher as núpcias de uma nova aliança. Pelo contrário, o sudário sim, depois de cobrir a cabeça de Jesus, agora estava à parte e envolvia totalmente o templo, o lugar onde a morte fora estudada, planeada, deliberada. Precedido e encorajado por Maria Madalena, o discípulo amado entrou na sepultura escura e fria, “viu e acreditou”.

Todos ressuscitados com Cristo

Temos de entrar no túmulo vazio e escuro, temos de passar por ele. Temos de passar com Cristo pela morte. Somente dentro do túmulo se abrirão os nossos olhos: no escuro do túmulo vazio, na ausência do corpo de Cristo, veremos, qual luz ao fundo do túnel, o brilho da ressurreição. O que fora estava oculto aos nossos sentidos, dentro se evidencia aos olhos da fé. Deus o ressuscitou no terceiro dia! Crê somente! Aos olhos da fé é revelada a possibilidade e a realidade de uma vida renovada, de um mundo renovado integralmente. Como Pedro e o outro discípulo, nós vamos para casa crendo. Saímos do túmulo repletos de fé e de esperança. Saímos renovados. Fomos ao túmulo à procura do corpo de Jesus e saímos de lá como corpo de Cristo. Nós somos o corpo que desapareceu. Pela fé foi-nos revelado que a nossa única esperança está além do túmulo. Passamos por ele. Morremos com Cristo. Saímos dele. Fomos ressuscitados juntamente com Cristo e elevados acima da morte. O nosso corpo já não se dispõe para servir a morte, mas a libertação de todas as formas de morte e de sofrimento.

Porque Páscoa é nova criação

A Páscoa de Jesus de Nazaré inaugura a nova criação. Não se trata de uma simples correção do passado, ou apenas de perdão dos pecados, nem sequer de vitória sobre a morte física e individual. Jesus de Nazaré, o ressuscitado que traz no corpo as marcas dos pregos e da lança, que passou por este mundo fazendo o bem, é o Homem Novo, o Primogénito de todas as criaturas e o Irmão de todos os homens e mulheres. Em seu nome, os discípulos e discípulas, agora, reúnem-se e organizam comunidades que continuam empenhados na defesa da vida de todas as criaturas, desconhecendo todo e qualquer limite excludente.

Rezar a Palavra e contemplar o Mistério

Senhor, tu encontraste os teus discípulos com medo, a chorar a tua ausência.

Mas, com a tua presença, voltaram a ter coragem, novo vigor, nova vontade de viver.

Capacita-nos, envia-nos, para levar, com esta disposição, a tua Palavra da vida:

a todos os cansados e desanimados; a todos os que não crêem no teu poder,

a todos os que cruzam os braços, pensando que é tudo assim e que nada vai mudar;

a todos os que despertam para um envolvimento com a tua Palavra no seu dia-a-dia;

a todos os que se empenharam pela transformação das estruturas injustas …

Viver a Palavra

Através de nossa maneira de viver vamos explicar, tornar presença, corpo, palpável, vivenciável, a nova realidade da ressurreição.