Ao longo de quarenta dias, depois da sua ressurreição, Jesus manifestou-se vivo aos apóstolos e, segundo S. Lucas (Actos e Evangelho), recomendou-lhes que não se afastassem de Jerusalém até receberem o Espírito Santo. Os quarenta dias evocam um tempo necessário e completo para compreender bem todos os acontecimentos e ser capaz de os testemunhar no futuro. Ao fim deste tempo situa-se a Ascensão do Senhor, a sua partida para o céu. Não é uma despedida ou o final de uma história, mas é o início de um tempo novo, o tempo dos discípulos de Jesus fazerem o que o Mestre fez: ele desceu a este mundo, aproximou-se dos doentes, dos pobres e dos marginalizados; depois é que subiu para o lugar de onde veio.
Aquilo que Jesus fez e realizou não se limita ao horizonte deste mundo. A partir da ressurreição a perspectiva ultrapassa este tempo e esta história porque aquele Deus que desceu à terra não ficou encerrado no túmulo. Ao ressuscitar, a sua vida ultrapassa este tempo e este espaço, voltou para junto do Pai do Céu, de onde Ele tinha vindo.
Sendo o cristianismo uma religião histórica, cuja mensagem é para ser vivida neste mundo, neste tempo e neste espaço, é também, e sobretudo, uma religião que aponta para o céu, que o propõe como destino de todos os que, na terra, procuram viver à maneira de Jesus. E quem quer viver como Ele na terra, vai também com Ele para o Céu, para onde Ele voltou depois de ressuscitar. Por isso se diz que hoje é o início do caminho que a Igreja deve percorrer: descer e caminhar com a humanidade para, com ela, subir também para o céu.

  1. Uma festa continuada

– Temos celebrado, ao longo de todas estas semanas, a grande festa da Páscoa. Apesar de ser um tempo de alegria, tem sido marcado também por muitas preocupações e incertezas: a pandemia teima em continuar e a perturbar o ritmo da nossa vida… A guerra também não parece ter um fim à vista e as consequências estão a sentir-se por todo o lado…
– Como podemos celebrar a exaltação e o triunfo no meio de tantas perturbações? É verdade que Jesus desceu e depois subiu mas, quando é que nós somos capazes de ultrapassar tantas limitações e constrangimentos?…
– Durante este tempo pascal a natureza vai-se renovando… A espiga da quinta-feira da Ascensão também nos indica uma vida nova… Contudo, os sinais que continuamente nos são apresentados são mais de morte do que de vida…
– Neste cenário, é importante recordar qual é o centro da nossa fé: “Creio em um só Senhor, Jesus Cristo… por nós foi crucificado sob Pôncio Pilatos; padeceu e foi sepultado. Ressuscitou ao terceiro dia conforme as Escrituras, e subiu aos Céus, onde está sentado à direita do Pai”… A fé na ressurreição de Jesus inclui glorificação. Nós acreditamos que outro mundo é possível…

  1. Conhecimento de Deus

– S. Paulo, na carta aos Efésios, implora de Deus para todos os cristãos “um espírito de sabedoria e de revelação, uma iluminação, para conhecermos bem a Jesus e compreendermos a esperança a que fomos chamados…” É este conhecimento profundo que todos nós precisamos: um conhecimento interior, vivencial, que faz parte do nosso ‘gene’ de cristãos…
– Este conhecimento leva-nos a perceber que o poder de Cristo já está presente em nós… Não se trata de uma sabedoria que anda à procura de mais argumentos, a acumular mais dados para completar os discursos, mas é a ciência do saber estar na vida, de quem conhece os próprios limites e descobre a força para os superar, tanto nos momentos mais favoráveis como nas adversidades…

  1. Ser testemunha

– A Igreja não vive animada pela contemplação da morte… A nossa fé é na exaltação, na glória, no poder do Céu sobre a Terra… Por isso, há dinamismos que lhe são muito próprios: “porque estais aí plantados a olhar para o Céu?”… Esta voz é a que ressoa por todos os lados na nossa vida: é a voz de todas as pessoas, de todas as classes e condições, dos crentes e não crentes, que nos interpelam e provocam: que fazemos nós da fé, d’Aquele em quem acreditamos?…
– É verdade que há tentações (“é agora que vais restaurar o reino de Israel?”) mas, vale sempre a pena recordar a resposta de Jesus: “não vos compete saber o tempo e as circunstâncias que o Pai determinou com a sua autoridade”… Quer dizer: não precisamos de saber tudo e controlar tudo… Só precisamos de estar disponíveis para receber a força do Espírito…
– “Ser testemunha até aos confins da terra…” O dicionário diz que Confim é o limite, o lugar mais remoto, para lá do que a nossa vista alcança,…
– Jesus não nos constitui senhores, eruditos, comentadores ou sábios… Mas, testemunhas simples: gente que oferece a sua vida como mensagem de Jesus onde quer que seja. Através de cada um de nós é que Jesus se torna actual…